Declínio

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Não sabes, criança? 'Stou louco de amores... — Castro Alves

Victor

Eu queria poder abraçá-la, mas meus movimentos estão muito contidos. Foi um sacrifício dar um espaço para ela e agora me vejo incapaz de puxá-la para o meu peito. No entanto, consigo sentir conforto só de tê-la a milímetros de distância.

Nem se o meu cérebro ferrado quisesse, eu poderia esquecê-la.

Ayleen ainda chora, suas mãos estão em seu rosto e os ombros tremem levemente. Me sinto culpado não só por fazê-la sofrer assim, mas por ela ter que passar esse tempo perto da minha família. Tenho certeza de que eles não foram gentis.

— Ayleen — minha voz sai baixa, no entanto, ela consegue me ouvir pois levanta a cabeça —, eu sinto muito... eu não queria que você precisasse passar por isso — de novo.

— Eu fiquei com medo — responde, tremulamente. — Você sumiu e quando apareceu, estava desacordado no hospital. Tive tantos pensamentos ruins...

Tento levantar uma mão para secar o seu rosto, mas mal consigo fazer metade do movimento. Que merda.

— Eu tô aqui agora. Eu tô aqui com você, não pretendo ir pra lugar nenhum — escaneio o seu rosto abatido e cansado.

Minha menina levanta as mãos e repousa-as com gentiliza sobre a minha face. Meus olhos se fecham pelo breve contato.

Ela acaricia minha bochecha, minha testa, os meus lábios. Sinto um pouco de dor no local, mas decido ignorar, o carinho é mais importante; passeia por meu pescoço e para sobre o meu coração.

— Eu só quero que você se recupere logo. Foram 3 dias muito difíceis — a mão continua sobre o meu coração e os olhos fitando os meus.

3 dias?

— Eu dormi por três dias? — dormir é um grande eufemismo.

Ela assente. — Os médicos disseram que você poderia acordar a qualquer momento, ou não... — a voz some no final da frase.

Sinto uma pontada muito forte na cabeça. Meu rosto deve ter deixado isto em evidência.

— Eu vou chamar o médico — Ayleen se levanta e pressiona o botão próximo à maca.

— Não precisa... — tento argumentar.

— Victor... — adverte.

— Já passou, eu só preciso ficar com você — pareço um bebê.

— Eu vou ficar com você quando tiver alta. Sua mãe gostando ou não — acho a teimosia dela muito fofa.

Então namorar é assim?

— Você ouviu o que falei pra minha mãe? — só falta ela dizer que não quer ser a minha namorada, mas acho que não faria isso com um moribundo.

Ela volta a ficar do meu lado e pega uma de minhas mãos fracas. Acariciando os nós dos meus dedos, me responde.

— Eu ouvi tudo, vocês não estavam conversando muito baixo — não diz mais nada.

Eu aqui querendo saber o que ela pensa, e nada...

— Você tá bem com isso? — eu digo que ela é minha namorada com toda propriedade e agora tô aqui vacilando. Enfim, o efeito Ayleen.

— Vamos conversar depois, tá bom? Namorado — se inclina e beija minha testa.

A máquina mostra a minha frequência cardíaca aumentando. Uma palavra, só isso e eu quase infarto.

Tomado por uma emoção indescritível e avassaladora, despejo o meu segredo de sete letras sobre ela.

— Eu te amo.

Ayleen

Seu rosto está machucado e sua cabeça enfaixada. Um corte nos lábios inferiores e a pele pálida, abatida. Ele tá bem, ele tá bem. Meu subconsciente pontua repetidamente. Fito os olhos e vejo sua boca se mover. Dela, saem palavras com muita intensidade.

Todo um clichê acontece comigo. Meu estômago liberta todas as borboletas que foram mantidas em cativeiro por 21 anos. Não sei como, no entanto, mais lágrimas caem. Meu peito se contrai e eu acho que minhas mãos ficam geladas.

— Você... o quê? — não é que eu não tenha escutado, é uma pergunta que sai em meio a uma mente atordoada.

— Não sabe, minha criança? Tô louco de amor — ele fala com mansidão.

— Desde quando? — sussurro.

Ele me ama... e eu? Eu amo?

Sério, Ayleen? Você ficou três dias seguidos em uma sala de espera; aguentou a família tóxica dele; obrigou o motorista a te ajudar e agora tá em dúvida se ama ou não?!

— Desde que te vi em pé naquele palco com um olhar assustado; quando te vi vomitar sobre a grama; quando fui cheio de marra falar que você deveria ser minha acompanhante e recebi um belo "não" como resposta. Quando te segurei nos meus braços pra que não caísse. Quando te vi na universidade. Quando te beijei, quando te toquei. Quando você adormeceu nos meu braços. Quando te vi dormindo em minha biblioteca. Quando acordei do seu lado...

Mal vejo o seu rosto, meus olhos estão embaçados com as lágrimas.

— Ayleen, eu te amo. Eu amo o seu cheiro, amo o seu jeito. Amo quando tá nervosa. Amo sua teimosia. Amo o seu gosto. Amo o seu cabelo. Amo sua generosidade. Amo o quanto você ama a sua mãe. Amo sua inocência. Eu te amo por inteiro. Você é tudo o que eu não quis ter por medo e agora já tem o meu coração em suas mãos. Você é o meu sonho secreto. Eu acordo pensando em você e vou dormi querendo te ver nos meus sonhos. Talvez eu esteja meio louco. Agora você já sabe o meu segredo.

O meu pranto não acaba. Não mesmo. Cada parte de mim chora e chora e chora. Minhas mãos tremem um pouco. Meu peito parece que vai explodir a qualquer momento de tanta emoção.

É como se um machucado tivesse recebido um bom tratamento e estivesse no processo de cicatrização.

Eu não sabia que precisava desse amor; de ter alguém me amando, de um amor não-maternal. Eu sei que deveria dizer alguma coisa, mas tem um nó na minha garganta que me impede. Eu não queria me apaixonar, eu não devia...

"No coração ninguém manda."

Mais uma vez, pareço escutar minha mãe sussurrando para mim.

— Eu... — tomo um tempo para respirar — ...também... — mais uma lufada de ar —... te amo.

Limpo os meus olhos com um pouco de grosseria e olho para ele. Algo acontece. Seus olhos estão marejados e mais azuis. Uma lágrima desliza em direção à sua orelha esquerda, pois ainda está deitado.

Seco sua lágrima e a minha outra mão continua na sua. Meus dedos entrelaçam aos seus. Nos encaramos. Trocamos palavras silenciosas banhadas por lágrimas de amor, ouso dizer.

O que uma pancada na cabeça não faz 🌚

Eu ainda aguardo uma declaração de amor... enfim.

Votem e comentem, pessoas maravilhosas que acompanham a minha história 🤧🤧