Parte 18

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Ruggero concordou com a cabeça e fez uma mesura com o braço.
Era tão surreal! Eu tinha a impressão que, a qualquer momento, o Senhor Darcy em pessoa sairia de alguma daquelas portas de madeira acompanhando Lizzy Bennet.
- Senhorita? Chamou ele, quando eu já estava alguns passos à sua frente.
- Que foi? Me virei para ver o que eu tinha feito de errado desta vez, pelo tom reprovador que ouvi em sua voz.
Ele me alcançou e me ofereceu o braço em forma de L. Continuei olhando para ele sem entender.
Ruggero suspirou exasperado, pegou gentilmente minha mão e a colocou na
parte interna de seu cotovelo.
- Ah! Disse sem graça. - Precisa mesmo?
Eu me sentia um pouco estranha quando ele ficava perto de mim daquele jeito. Meio sem equilíbrio e inquieta, até meu estômago se comportava de forma anormal.
- Devo acompanhá-la. Ele disse sorrindo. Desviei os olhos porque, novamente, seus olhos pareciam puxar os meus em sua direção.
Dei de ombros, fingindo indiferença. Estava começando a ficar irritada com as reações de meu corpo, principalmente quando Ruggero me tocava.
- Como tem passado, Senhor Pasquarelli? Não o vejo desde a semana passada!
Cumprimentou uma garota de vestido rosa bebê, com cabelos muito loiros, cheios de cachos que pareciam ter sido feitos no babyliss sob o chapéu branco, um laço em seu queixo, acompanhada de uma mulher mais velha, talvez sua empregada, pelas roupas mais modestas. Elas inclinaram ligeiramente.
Ruggero se curvou também.
- Estou muito bem, senhorita Valentina. Estive fora em uma viagem de negócios. Voltei apenas ontem. Como tem passado? Um sorriso educado se espalhou em seu rosto.
- Estou muito bem, Senhor Pasquarelli. Ela piscava repetidamente, irritantemente.
- Espero que tenha feito bons negócios. Fiquei alarmada por não vê-lo aqui no vilarejo. Pensei que talvez estivesse padecendo de algum mal!
E então me notou, avaliou-me de cima a baixo, seus olhos se fixaram na minha mão no braço de Ruggero.
Que ótimo, pensei, então medir as pessoas era um mal muito mais antigo
do que eu imaginava!
- Não me apresenta sua amiga, Senhor Pasquarelli? Ela continuou, piscando
muito.
- Mas é claro. Esta é a senhorita Karol... Ele parou incerto de como continuar.
- Sevilla. Como vai? Estiquei minha mão para cumprimentá-la.
Ela olhou para a mão estendida, depois para Ruggero e de volta para mim.
Ah! Deixa pra lá.
- Sevilla? Ruggero perguntou, suas sobrancelhas arqueadas.
- É. Meu bisavô era espanhol, família de sangue quente sabe como é, quando juntava todo mundo sempre acabava em briga. O Natal era um pesadelo! Brinquei.
Ele franziu a testa ainda mais.
- Err... Certo. Senhorita Karol, esta é a senhorita Valentina de Albuquerque. Uma antiga amiga da família, e sua criada, senhora Veiga.
- Prazer em conhecê-la, senhorita Karol. Ela se inclinou, me encarando de um jeito estranho.
- Está hospedada em sua casa, Senhor Pasquarelli?
- Sim. Ela está em uma... Viagem de descanso. Ele mentia muito mal.
Até eu, que o conhecia há apenas um dia, percebi que sua voz se alterou quando mentiu.
- Mas eu vou embora logo. Assegurei a ela, que pareceu não gostar da novidade. - Só preciso resolver umas coisinhas e aí me mando. Ela olhou para Ruggero sem compreender. Suspirei, cansada.
- Sabe que é bem-vinda em minha casa pelo tempo que desejar. Ruggero me
disse, gentilmente.
Sorri para ele, encantada por sua bondade.
Valentina, porém, não sorriu seus olhos faiscaram. Oh! Ela gostava dele!
Meu sorriso desapareceu.
- Eu sei, R... Senhor Pasquarelli.
E agradeço a sua hospitalidade. Murmurei sem jeito.
Um momento de silêncio constrangedor se seguiu, ninguém disse nada.
Eu comecei a ficar inquieta, estava perdendo tempo.
- Senhorita Valentina. Comecei com cautela.
- Por acaso, não teria visto alguém... Novo por aqui?
- Alguém novo? Aqui? Ela pareceu espantada.
- Não. Ninguém novo na vila, além de você, senhorita Karol.
Talvez ela não soubesse ainda, assim como não sabia da minha chegada até alguns minutos atrás.
Suspirei desanimada. Obviamente, não seria assim tão fácil encontrar a outra alma condenada àquele hospício cheio de regras de etiqueta!
- Bem, senhorita Valentina. Ruggero disse, parecendo entender que eu queria continuar procurando.
- Se nos der licença, eu e...
- Oh! Claro, Senhor Pasquarelli, não quero interromper seus afazeres, mas
posso perguntar se o baile de sábado está confirmado?
Ruggero olhou pra mim e depois para ela, parecendo indeciso.
- Eu havia me esquecido, mas acredito que Malena não tenha mudado de ideia. Até onde fui informado, o baile acontecerá no próximo sábado.
- Excelente! Ela disse, quicando e batendo palmas.
Estou muito ansiosa para o baile. Os bailes em sua residência são os melhores da região.
- Fico feliz que lhe agrade, senhorita. sorriu.
Pudera ela gostar dele! Cheio de sorrisos e bailes para agradá-la!
- Eu vou... perguntar por aí, Ruggero.
Eu quero resolver isso logo.
Notei que o sorriso de Valentina se fora quando sem pensar o chamei pelo nome.
- Te vejo depois. Foi um prazer conhecer vocês duas. Até logo!
Sai andando, sem saber bem para onde ir, estava irritada com aquela garota que se parecia com uma boneca de porcelana e que piscava sem parar.
Ouvi Ruggero se despedir apressadamente.
- Você podia ficar batendo papo com elas enquanto eu procuro. Não precisa ficar me seguindo pra todo lado. Avisei assim que ele me alcançou.
- Não estou seguindo!
Estou te acompanhando. Por que está irritada? Ele tentou pegar minha mão para colocar em seu braço e eu a puxei com força.
- Foi pelo que disse a senhorita Valentina, sobre não haver ninguém de fora da vila?
- Foi! Menti, mas eu não sabia dizer por que não havia gostado daquela fulana ou por que ela me irritou tanto. Talvez fosse TPM adiantada. Quem sabe os efeitos que uma viagem no tempo pode causar no
ciclo menstrual de uma garota!
- Não se preocupe, se mais alguém estiver aqui, vamos encontrá-lo.
Ele disse, confiante.
- Eu espero que sim, Ruggero. Eu ainda estava um pouco irritada.
- Espero que esteja certo.
Minha cabeça estava ficando cada vez mais confusa, tudo ali era confuso.
E, cada vez mais, eu não conseguia entender minhas reações exageradas.
Andamos quase a manhã toda, perguntando a todos os conhecidos de Ruggero.
Entretanto, não foram muitos, a maioria ainda estava na igreja, não tinha ninguém novo na vila, era a resposta de todos.
Paramos para conversar com algumas garotas sorridentes e enfeitadas, que
lançavam olhares meigos para Ruggero e de fúria para mim.
Ana não mentiu quando disse que Ruggero tinha muitas pretendentes.
Distraí-me diversas vezes com as fachadas rústicas do comércio e das casas e com as maneiras das pessoas. Tudo parecia parte de um cenário gigante de um filme.
Não conseguimos perguntar aos comerciantes, era domingo, tudo estava
fechado, apenas uma carroça vendia frutas e galinhas vivas.
- Talvez fosse melhor procurarmos amanhã. Ruggero sugeriu, depois de
algumas horas de andança.
- É. Concordei desanimada.
- Acho que dará mais tempo para notarem se alguém diferente apareceu por aqui.
- Podemos ir, então? Estou com um pouco de fome, não consegui terminar meu café. Ele disse brincalhão. Eu corei.
- Me desculpe, Ruggero. Não sei o que deu em mim naquela hora, é que eu
estou numa situação meio... Difícil. Desculpe, de verdade.
- Não se preocupe senhorita. Já me esqueci do incidente. Vamos?
- Vamos. Concordei, aceitando seu braço sem relutância. Andamos em direção à carruagem e, dessa vez, ele se adiantou para abrir a porta antes que eu pudesse fazê-lo.
- Valeu. Agradecia aceitando sua mão como apoio para entrar nela.
- Direto para casa, Isaac. Ordenou ao rapaz que conduzia a carruagem.
Ficamos em silêncio por um tempo.
- O que achou da vila, senhorita Karol?
- Pensei ter ouvido você prometer me chamar apenas de Karol. Lembrei
a ele.
- Eu sei, mas não me parece muito educado!
- É irritante esse negócio de senhorita, Senhor Pasquarelli. Brinquei com ele. Seus lábios se abriram num sorriso enorme. Então, me lembrei
- Você tem muitas fãs por aqui. Tentei fazer minha voz soar indiferente.
- Perdoe-me, senhorita, tenho o que?
- Muitas fãs. Muitas garotas atrás de você. Muitas pretendentes.
Foi impossível não notar seu constrangimento. Ele corou.
Pareceu não gostar que eu tivesse notado que era um ímã para garotas.
- São apenas amigas da família. Disse claramente desconfortável.
- Valentina parece gostar muito de você. Insisti.
- A senhorita Valentina e eu nos conhecemos desde a infância, nossos pais sempre foram amigos. Mas não há nenhum interesse romântico envolvido. Sua voz estava baixa, assim como sua cabeça.
- Talvez não de sua parte. Você viu como ela me olhou? Pensei que fosse me comer viva! Ruggero apoiou um braço no joelho e se virou para me encarar meio sorrindo.
- Isso é culpa sua, não minha! Creio que todos a olhavam. Não me lembro de alguma vez ter visto uma jovem sair de casa sem cobrir seus cabelos com um chapéu. Hã?
- Uma dama jamais mostra seus cabelos soltos, assim como estão os seus agora, em público. Ele explicou, quando viu a confusão estampada no meu rosto.
- E você não pensou em me avisar sobre isso antes? Lancei um olhar severo em sua direção.
- Depois de seu comportamento tempestuoso durante o café? Deu de ombros.
- Nem que eu fosse louco! E riu.
Fiquei observando seu rosto, completamente fascinada.
Ruggero era lindo demais, seus cabelos desgrenhado e encorpados caiam na testa fazendo um contraste perfeito com a pele. Seus olhos, castanhos como chocolate de alguma forma refletiam raios prateados, seu nariz reto lhe dava
personalidade, suas bochechas esticadas sobre os ossos do rosto e seu queixo reto o deixavam com um aspecto ainda mais másculo. Tudo isso sustentado por um corpo que faria qualquer garota perder o juízo. Poderia facilmente ganhar a vida como modelo.
Percebi que Ruggero também me observava e, depois de nos encararmos por alguns segundos, me virei para a janela. De algum modo, seu olhar me
perturbava e eu não conseguia encontrar uma explicação para isso.
Ficamos em silêncio o restante da viagem. Às vezes, sentia seus olhos em
mim, mas não me virei pra ter certeza não queria arrumar mais confusão e
tinha certeza que olhar muito para Ruggero me colocaria numa tremenda
confusão.
Ele me ajudou a sair da carruagem assim que chegamos a sua casa, ainda segurava a mão que ele me estendeu quando ouvi um barulho.
BSS. BSS. BSS. Ruggero também ouviu.
- Escutou isso? Ele perguntou, procurando em volta.
Eu sabia o que era. Sabia muito bem!
- Não, não ouvi nada. Respondi rapidamente.
- Eu... Eu... Preciso usar a casinha!
Te encontro lá dentro, está bem?
Tentei sair correndo, mas a barra do vestido idiota enroscou numa planta.
Praguejei alto, me abaixando para juntar toda a saia nas mãos, deixando meus joelhos e panturrilhas à mostra e disparei para a casinha.
Não olhei para ver qual foi a reação de Ruggero.
Entrei rapidamente tentando fechar o trinco da porta com as mãos trêmulas.
Peguei o celular, a tela estava acesa, você tem 1 nova mensagem escrito nela.
Toquei a tela com o dedo.
Ler agora? Apertei o SIM
Muito bem, Karol. Você iniciou sua jornada com sucesso.
Depois piscou e voltou a desligar.

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