Senti saudades dos vestidos bufantes quando tentei acelerar a corrida e o
tecido não permitiu.
Droga de vestido apertado!
Tirei os sapatos de salto agulha e levantei a saia o pouco que pude tentando ganhar mais velocidade.
Eu meio corria, meio andava.
Parecia um pato descontrolado correndo atrás de uma minhoca voadora mas, a cada segundo, eu me aproximava mais de Ruggero.
Meu coração saltou dentro do peito assim que avistei a casa grande, ainda
cor de creme, ainda sem nem uma ação de desgaste.
Tudo estava como deveria estar.
Meus pulmões ardiam pelo esforço, mas eu não parei até praticamente arrombar a porta da sala e entrar feito um furacão, assustando Malena, Ana e Gomes, que tinha uma bandeja nas mãos e com o susto acabou derrubando tudo mo chão.
- Malena! Exclamei sem ar.
- Karol? Ela perguntou, completamente desnorteada, enquanto me lancei contra ela.
- Karol!
- Malena, Malena! Eu a apertei, soltando meus sapatos, minha bolsinha e o buquê, que caíram na bagunça de xícaras e açúcar.
- Senti tanto sua falta! Muita mesmo!
Eu a deixei e abracei Ana.
Estava eufórica demais.
- E também senti saudades suas, Ana. Não é estranho?
Ela me abraçou meio sem jeito.
- Acho que sim... Mas estava sorrindo.
- Gomes! Como é bom ver essa sua careca outra vez! Eu disse, enquanto o esmagava com os braços. Ele ficou meio sem jeito, mas acabou retribuindo meu abraço.
- Desculpe pelo susto...
- Que bom que está de volta, senhorita. Disse um pouco acanhado.
- Onde ele está? Perguntei ainda ofegante.
- No quarto. Ele não sai de lá. Malena disse com os olhos arregalados, ainda surpresa com meu súbito aparecimento.
Comecei a correr em direção ao quarto dele quando Malena gritou:
- Não no quarto dele! Em seu antigo quarto.
- Ruggero! Resmunguei, mudando de direção.
Não me perdi dessa vez.
Não me perderia nunca mais!
Alcancei a porta e tentei abri-la, mas estava trancada com chave.
- Vá embora! Gritou lá dentro.
Meu corpo todo estremeceu ao ouvir sua voz, mesmo estando mais rude que de costume. Bati na porta com mais força.
- Já pedi para me deixar em paz. Ele vociferou.
Não desisti. Continuei batendo insistentemente até que ouvi sons de passos pesados e sua voz lamuriosa esbravejando outra vez.
- Eu já disse para ir embora! Berrou ao abriu a porta.
Seus olhos furiosos se arregalaram, depois ficaram confusos.
O rosto abatido me examinou por alguns segundos.
Meu coração batia ensandecido dentro do peito. Ele estava ali, bem na minha frente!
- Tem certeza? Eu vim de tão longe! Mas se quiser que eu vá emb...
Não pude terminar, seus braços urgentes me puxaram para si e seus lábios
esmagaram os meus com desespero. Ruggero me apertou muito, num abraço quase insuportável, mas não pude ficar
mais agradecida.
Queria que ele nunca mais me soltasse! Minhas mãos tocaram o máximo dele que conseguiram: seu cabelo, seu pescoço, seu rosto, seus ombros.
- Karol! Ele gemeu vez ou outra sem desgrudar os lábios dos meus.
Senti minha vida se encaixar novamente, exatamente como eu me encaixei em seus braços.
Tudo fazia sentindo outra vez.
Ruggero me beijou, ainda na porta do quarto, até que tudo ao meu redor se
tornou um borrão giratório e eu fiquei sem fôlego.
Sua boca deixou a minha, mas suas mãos não deixaram meu corpo, ainda me apertavam com urgência.
- Você está aqui! Ele sussurrou colando sua testa na minha.
- Estou! Fechei meus olhos inspirando, deixando seu cheiro invadir meus sentidos. Eu estava finalmente em casa. -Desculpe ter demorado tanto.
Mas acreditaria se eu te dissesse que levei dois séculos para conseguir voltar?
Ele levantou a cabeça e me encarou.
- Como? O sorriso não deixava seus lábios.
- É uma longa história. Sorri, incapaz de não corresponder a seu sorriso.
Ele alcançou a porta e a fechou, me puxando para dentro de meu quarto.
Vi com satisfação que tudo ainda estava como deveria estar.
Apenas meu retrato com o vestido rosa estava ali já terminado e uma garrafa quase vazia com um líquido âmbar fora colocada ao lado do vinho.
Suspirei de alívio.
Eu iria mudar o futuro.
Ele não se acabaria em tristeza, eu não deixaria isso acontecer. Iria amá-lo tanto que o sufocaria de felicidade, seríamos felizes para sempre.
Ficaríamos juntos para sempre.
- Não estou com pressa. Disse ele.
- Ela me procurou esta noite. Consertou as coisas. Falei apressada.
Eu estava com pressa! Queria começar de onde paramos de uma vez por todas.
Entretanto, ele fechou os olhos e suspirou.
- Quanto tempo desta vez?
A voz embargada. Toquei seu rosto.
- Não tem tempo. É definitivo desta vez.
Ele abriu os olhos e eu sorri, seu rosto aos poucos se transformou.
Um sorriso imenso apareceu ali enquanto ele entendia a nova situação.
- Ficará aqui? Perguntou, parecendo não acreditar no que tinha ouvido.
- Ficará comigo para sempre?
- Essa é a ideia! Ela me deixou escolher onde eu queria viver. E escolhi viver aqui. Não poderei voltar nunca mais. Nenhuma gota de arrependimento em minha voz. Sua testa vincou.
- Você abandonou toda sua vida por mim? Indagou, apavorado.
- Não! Eu abandonei todo o resto para ficar com a minha vida! Eu o corrigi.
- Você não entende? Não dá pra suportar viver longe de você.
Ele assentiu, provavelmente sentia o mesmo.
- Tem certeza do que fez? Que escolheu corretamente?
- Ruggero, eu não tenho vida se você não estiver por perto. Simplesmente não rola! Sacudi a cabeça.
- Sabia que isso deveria acontecer? Você e eu quero dizer?
Suas sobrancelhas arquearam.
- Deveria?
- Sim, ela me disse que estávamos predestinados. E que, por engano, fui
colocada na época errada. Eu ri.
Era a minha cara estragar tudo me
perdendo para variar.
- Então ela me mostrou como deveria ter sido, quando estive aqui da primeira vez. E hoje me deu a escolha de viver onde
eu quisesse. Então, Ruggero, vou precisar de sua ajuda outra vez.
Seus olhos se arregalaram e seu rosto ficou tenso.
- Ajuda? Ele repetiu com a voz instável.
- É. Olha só, eu tô sem emprego, sem casa pra morar e os únicos amigos que eu tenho aqui são Malena Gomes, Madalena e você. Talvez Ana também.
Estava pensando se poderia me emprestar este quarto e me dar um
pouco de comida até que eu arrume um jeito de ganhar dinheiro.
Seu rosto se iluminou, o brilho prateado que senti tanta falta nos últimos dois meses apareceu em seus olhos.
- Creio que posso lhe emprestar este quarto. Talvez possamos fazer um acordo quanto ao pagamento.
Ele deslizou os dedos por meu braço e eu
estremeci com o toque quente e suave.
- Que tipo de acordo? Perguntei, minha respiração acelerando.
- Humm... Talvez possa me pagar com beijos. O sorriso malicioso que eu amava deu as caras.
- De acordo! Eu disse, rapidamente me apressando em pagar adiantado.
Obviamente, Ruggero aceitou sem relutância alguma meu adiantamento. No entanto, depois de alguns minutos ele interrompeu o beijo.
- Então ficará para sempre? De verdade, senhorita? A felicidade estampada em seu rosto inflou meu coração até quase explodir. Era por isso que eu estava ali!
- Pra sempre! Acho que desta vez terei que me habituar aos vestidos longos de uma vez por todas. Franzi a testa.
Seus olhos voaram instantaneamente para o meu vestido.
Ele examinou cada linha de meu corpo, então seus olhos se estreitaram.
- Onde estava antes de voltar para casa? Adorei a forma como ele usou a palavra casa, tão natural, tão seguro de que ali era minha casa.
Exatamente como eu também sentia.
- No casamento da Nina e do Gaston.
Foi hoje à noite. Ele ainda examinavam o vestido.
- Este vestido é apropriado para ser exibido em público?
Os olhos acompanhando minha silhueta.
- Sim, Ruggero.
Eu ri de sua reação reprovadora.
- Eu sabia que você pensaria que este vestido é...
- Indecente! Ele completou sorrindo, enquanto tocava meu rosto.
- Perturbador! Seus dedos acompanharam minha clavícula. -Escandalosamente justo! Sua mão deslizou suave e quente até minha cintura enquanto a outra rodeava meu pescoço, me fazendo estremecer.
Tentei não perder o controle.
- Eu ia dizer inadequado.
Mas vou guardá-lo, não se preocupe.
Só preciso saber onde estão minhas coisas. Respondi, o sangue voando nas veias enquanto ele aproximava seus lábios para tocar meu pescoço.
- Posso ajudá-la a se livrar desta peça horrível, se desejar. A voz rouca contra minha pele mandou meu controle às favas.
- Seria um alívio! Murmurei, fechando os olhos e prendendo minhas mãos em seus cachos macios.
- Será um prazer lhe ser útil, senhorita.
E com muita delicadeza, me levou para cama, onde minha vida finalmente começou.
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Meu lugar
FanfictionA garota da cidade grande, independente que gosta de praticidade, tudo para ela tem que ser moderno e que não dê trabalho. Mas vê sua vida virar de ponta a cabeça e embarcar em uma grande batalha para alcançar sua liberdade o que ela não sabia é que...