Parte 27

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- Posso acompanhá-la até a sala? Perguntou educadamente, me estendendo o braço.
- Não precisa, Ruggero, o caminho para a sala eu já conheço, este é um dos únicos em que eu não me perco. Ri nervosa.
- Eu insisto. E muito deliberadamente suas mãos alcançaram a minha, colocando-a em seguida na parte interna de seu cotovelo.
- Uma dama tão encantadora deve ser conduzida por um cavalheiro, sei que lhe desagrada que seja eu o cavalheiro em questão, mas sou o único no momento. -Você não me desagrada! De onde tirou isso? Desde que me encontrou só tem me ajudado! Ruggero era a pessoa mais fantástica que conheci ali, talvez a mais fantástica que já tivesse conhecido em qualquer época. Tão gentil e altruísta!
- Notei que fica um pouco... Agitada...
Ele não pareceu encontrar palavra melhor.
- Quando está comigo.
- Agitada? Repeti como uma imbecil.
- Não. Não. Quer dizer, eu fico agitada, mas o tempo todo. É meu estado normal. Sabe como é, sempre tendo que fazer duzentas coisas diferentes ao mesmo tempo... O corpo se habitua e não volta ao estado normal em épocas mais calmas.
- Já percebi isso. Um pequeno sorriso brincou em seus lábios.
- Mas não pode negar que hoje à tarde você fugiu de mim.
- Não fugi, não! Sentir seu braço sob minha mão e o calor do seu corpo ao lado do meu estava me deixando inquieta.
- Eu realmente prometi me encontrar com Malena hoje à tarde. Não teve nada a ver com você. Não teve nada a ver mesmo! Tentei parecer firme enquanto falava.
- Não precisa se explicar.
Eu compreendo.
Voltou seus olhos negros para os meus. -Você não quer ficar sozinha comigo.
Senti meu rosto ficar todo quente.
Ruggero era muito perceptivo, notava coisas demais!
- Imagino que não queira que nos vejam juntos e tirem conclusões erradas. Entendo perfeitamente não se preocupe.
- Não é nada disso! Eu disse, incapaz de conter a língua.
- Sabe que não me importo com esse tipo de coisa.
- E então por quê? Sua testa enrugada.
Estávamos perto da sala, com minha mão ainda em seu braço e me encarando com intensidade, Ruggero se colocou na minha frente, me obrigando a parar.
- Por que... Eu fico meio... inquieta quando você me olha do jeito que está
olhando agora.
Praticamente sussurrei, completamente atordoada pela intensidade e as chamas prateadas em seus olhos.
- E isso não é bom, pra ninguém aqui!
Seus olhos arrastavam os meus para sua órbita inescapável, não consegui desviar, não pude deixar de encará-lo, e isso não ajudou muito a clarear minha cabeça.
- E por que não é bom? Perguntou com a voz intensa, fazendo os pelos de meu braço se arrepiarem.
- Por que eu vou embora logo, Ruggero. Não tem sentido me afeiçoar a ninguém aqui.
- Mas você está aqui agora! Ele sussurrou e, gentilmente, levantou a mão livre para colocá-la em meu ombro.
- Por ora, este é seu lugar.
Seu toque quente deixou minha pele formigando, minha respiração se acelerou, senti meus joelhos falharem. Olhando dentro de seus olhos profundos, não pude dizer que estava enganado. Não consegui dizer nada, na verdade. Por que, quando ele disse que meu lugar era ali, ao menos naquele momento, com a voz cheia de emoção, fiquei completamente perturbada.
Parte de mim acreditou nele.
Surpresa vi minha mão se erguer sem um comando consciente e se apoiar
em seu peito, seus olhos tão escuros, tão negros na luz fraca dos candelabros, me observavam intensamente, senti o calor que emanava de seu corpo sob a palma de minha mão. Dei um pequeno passo em sua direção, incapaz de resistir ao impulso de me aproximar mais dele. Notei que sua respiração também estava alterada, levantei meu rosto para poder
vê-lo melhor, seu rosto ficou apenas a alguns centímetros do meu.
Prendendo a respiração, totalmente hipnotizada pelo brilho prateado de
seus olhos, me aproximei um pouco mais, meus lábios ligeiramente separados, a mão em meu braço deslizou suavemente até minha cintura e
então....
Uma gargalhada histérica vindo da sala ecoou no corredor, me libertando do transe. Vi o que estava prestes a fazer e, com um movimento brusco, tirei minhas mãos dele e recuei. Ruggero pareceu confuso, assim como eu, olhando em direção à sala e depois de volta para mim, parecendo não saber o que dizer.
Foi a coisa mais estranha que eu senti em toda a vida! Pela primeira vez, eu não tive o controle sobre meu corpo.
Não sabia explicar porque minhas mãos agiram da forma que agiram, porque meus pés me levaram até ele, porque minha pele pinicava e eu desejava tanto tocá-lo outra vez.
Era como se meu cérebro tivesse se desconectado de meu corpo e agisse por conta própria, eu não queria ter feito aquilo.
Foi como se meu consciente fosse apenas a plateia impotente assistindo a exibição de um espetáculo encenado por meu corpo. E claramente meu corpo desejava se aproximar de Ruggero.
Eu já havia desejado um homem, sabia como era a sensação, já até tinha satisfeito esses mesmos desejos, mas sempre no controle, sempre consciente do que fazia. O que eu sentia agora era totalmente diferente!
Muito diferente. Era como se cada célula do meu ser quisesse se grudar em Ruggero, como se ele fosse um magneto superpotente usando sua força em carga
máxima e eu fosse revestida de metal. Impossível de escapar ou resistir.
E eu não soube o que fazer na presença de um homem pela primeira vez.
Meu rosto queimou de vergonha, de raiva, de medo e, sem dizer uma unica
palavra, marchei em direção à sala deixando Ruggero ainda paralisado ali no corredor, me encarando com olhos assustados.
Tão assustado quanto eu estava.

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