Santiago não reagiu aos golpes que recebia, talvez só gostasse de bater em
mulheres. E Ruggero parecia ainda mais transtornado com o fato de ele não
revidar.
Nunca tinha visto Ruggero tão furioso daquele jeito, cheguei a pensar que, se ninguém o impedisse, acabaria matando aquele homem asqueroso.
- Já chega, patrão. Podemos cuidar disso, pediu Gomes, com um sorriso estranho nos lábios.
Ruggero pareceu recuperar a sanidade e parou. Sua mão repleta de sangue do
miserável.
- Cuide dele, Gomes. Ele disse, soltando a gola da camisa de Santiago, que havia servido como apoio para seus golpes certeiros, depois se levantou do chão. -Cuidem para que ele jamais volte a dar as caras por estas bandas.
Os empregados assentiram, vendo a raiva homicida em seus olhos. Nenhum deles parecia estar aborrecido com a tarefa.
- Espere. Pedi. Ruggero me olhou confuso.
- Espere. Não vai matá-lo, vai?
Por mais que eu gostaria de estraçalhar a cara de Santiago se bem que não tinha sobrado muita cara para ser estraçalhada, Ruggero fez um ótimo
trabalho, não queria ser a culpada da morte de ninguém.
- Kaorl, é claro que não! Seus olhos se acalmavam gradualmente.
E pareceram sinceros quando me respondeu.
- Apenas aprenderá a se comportar perante uma dama!
Concordei com a cabeça, essa era uma lição que Santiago precisava aprender.
Os dois empregados grandalhões rapidamente levantaram o infeliz do chão pelo ombro, começaram a levá-lo meio arrastado.
- Espere. Me levantei do sofá.
Percebi que ainda tremia muito, meus
joelhos não estavam prontos para me sustentar, Ruggero me pegou antes que eu caísse. Endireitei-me e, depois de respirar fundo algumas vezes e arrumar o vestido com a dignidade que me sobrara, andei até ficar cara a cara com
Santiago.
- Me diga de onde você veio! Ordenei.
Ele não disse nada, nem mesmo me olhou. Talvez não conseguisse focalizar nada com os olhos tão inchados.
- Posso pedir ao Senhor Pasquarelli para ser mais persuasivo. Ameacei.
Precisava ter certeza que ele não era a outra pessoa presa no passado.
Santiago engoliu seco, depois falou.
- De um pequeno povoado na divisa do estado. Assenti lentamente
- E em que ano? Continuei. Senti todos os olhos na sala grudarem em mim.
Não me importei.
Santiago ficou confuso, não me respondeu
- Em que ano? Repeti trincando os dentes.
- Não sei se entendi sua pergunta.
Respirei fundo.
- Você saiu do povoado em que ano?
Eu disse, observando atentamente sua cara desfigurada.
- Neste mesmo ano, em meados de Janeiro. Ele se apressou em dizer assim que Ruggero se aproximou.
- Neste Ano. Você saiu desse povoado em Janeiro de 1830? Fui mais explícita.
Não podia haver enganos.
- Certamente. Em 1830. Respondeu, me olhando como seu eu fosse louca.
- Vi um objeto prateado em sua mão naquele dia na vila. Onde ele está?
Lentamente, Santiago alcançou o bolso do casaco e me estendeu o objeto
retangular.
Não era um celular, era uma caixinha prateada, eu a abri e vi meia dúzia de cigarros ali. Era apenas uma cigarreira.
Respirei fundo novamente e fechei os olhos,
- Então, você realmente foi assaltado quando chegou aqui, nada de estranho aconteceu? Eu estava confusa demais.
Se ele não era a pessoa que estava ali perdida no tempo como eu, então quem era?
- Sim. Fui assaltado por três homens que me levaram tudo, até mesmo meu cavalo. Precisei ficar na cidade por alguns dias a pedido da guarda, no
intuito de encontrar os mal feitores. Quando foram capturados, recuperei
parte...
Minha cabeça girava, não ouvi sua explicação. Não me interessava.
Então, talvez eu não soubesse como voltar. Seria tão ruim assim?
Ficar ali com Ruggero para sempre e poder amá-lo sem medo?
Mas e quanto às mensagens no celular? Esteja preparada, dizia a última.
Elas chegaram sem a interferência de Santiago...
Ruggero percebeu minha confusão e me levou de volta para o sofá.
- Levem-no daqui! Pela cozinha, Gomes, por favor! Não quero estragar a festa da minha irmã. Ele entregou a cigarreira para Gomes, a raiva ainda em sua voz me fez estremecer um pouco.
Os quatro homens saíram rapidamente. Gomes fechou a porta ao sair.
Ruggero tocou meu rosto em chamas.
- Desculpe-me por não chegar a tempo, senhorita. Seus olhos ficaram furiosos quando notaram o vermelho em minha bochecha.
- A procurei por toda parte e ninguém a viu sair, estava indo até seu quarto quando ouvi seu grito...
Seu rosto transtornado pela fúria.
- Você chegou a tempo. Coloquei minha mão sobre a dele, pressionando-a levemente em meu rosto latejante.
- Bem a tempo!
- Como se sente? Indagou com delicadeza.
Vi que se esforçava para manter-se calmo.
- Precisa de alguma coisa? Um vinho, talvez?
- Pode ser. Eu queria tirar o gosto podre dos meus lábios. Ruggero pegou a
garrafa perto do piano e a trouxe, me serviu uma taça cheia.
Virei tudo num único gole, senti o álcool queimar minhas entranhas e afugentar um pouco do tremor.
- Melhor? Perguntou.
Sacudi a cabeça, mais por hábito.
- E agora me explique o que aconteceu. Exigiu, sentando-se ao meu lado novamente.
- Por favor!
- Não é ele! Eu pensei que fosse Santiago, mas não é me enganei, não é ele a outra pessoa perdida aqui.
Ele é como você, Ruggero, um homem do
século dezenove.
- Não sou como ele! Contestou colérico e ofendido,
Ele não entendeu a palavra-chave. Precisaria ser mais explícita.
- Claro que não! Sacudi a cabeça.
- Não foi isso que eu quis dizer.
Ele é como você ou Gomes ou Malena, não como eu, a pessoa que procuro deve ser como eu.
Ele me observou por um longo tempo, tentando compreender o que eu dizia. Respirei fundo. Peguei a garrafa de sua mão e enchi minha taça.
Bebi um grande gole.
- Exatamente como eu. Murmurei.
- Solvi outro gole de vinho.
A coragem ainda não tinha dado as caras. Não tive outra alternativa se não seguir adiante sem ela.
Olhei profundamente em seus olhos e soltei a verdade.
- Alguém que nasceu no século vinte e um.
Sua testa vincou. Seu rosto ainda mais confuso.
- Alguém que também estava em fevereiro de 2010 e veio parar aqui no
século dezenove sem saber como voltar. Exatamente como eu!
Ele piscou várias vezes, tentando absorver minhas palavras.
- Perdoe-me, o que disse? Sua voz tremeu um pouco.
- Vou te contar toda história, Ruggero. Desde o início.
Meu nome é Karol Sevilla nasci nesta mesma região onde, daqui a muitos anos, se erguerá uma enorme metrópole.
Foi nela que eu nasci, em 29 de maio de 1985.

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Meu lugar
FanfictionA garota da cidade grande, independente que gosta de praticidade, tudo para ela tem que ser moderno e que não dê trabalho. Mas vê sua vida virar de ponta a cabeça e embarcar em uma grande batalha para alcançar sua liberdade o que ela não sabia é que...