Parte 29

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Voltamos à sala de visitas, onde Ana nos ofereceu licor fala sério, licor?
E a conversa ainda estava animada, mas não para mim, eles falavam sobre a beleza da região, o quanto ele iria apreciar as famílias que residiam ali, impedindo que Santiago me dissesse algo mais específico.
Tentei desesperadamente falar a sós com ele, mas não tive chance.
Ana!
Suspirei derrotada.
Já estavam sendo feitas as despedidas e eu não tinha encontrado outra forma de falar com ele, então interrompi alguém Ruggero, percebi tarde demais e perguntei sem rodeios.
- Ainda estará aqui no sábado? E lancei um olhar conspiratório.
Seu rosto surpreso pareceu satisfeito.
- Sim, estarei, senhorita. Sorriu de forma estranha.
- Tem certeza? Estava desesperada pra perguntar tudo, mas com tanta gente ali, eu não podia.
- Sim. Prometo que estarei aqui. Até sábado devo ter conseguido tudo o que preciso e, talvez, possa voltar para casa. E me olhou significativamente.
Bom, eu achei que fosse significativo.
- Ótimo. Então vou esperar por você. Talvez me conte mais sobre o lugar de onde vem. Levantei apenas uma sobrancelha.
- Será um imenso prazer. Se inclinou, sorrindo.
Logo depois da saída de Santiago, comecei a entender algumas coisas.
Fosse o que fosse, ele sabia o que devia fazer para poder voltar, e no sábado talvez já tivesse resolvido tudo.
Eu o pegaria no baile, nem que fosse à unha, e o obrigaria a me contar tudo o que sabia.
Malena e Ana conversavam animadamente sobre ele. Que educado! Que elegante! Uma lástima ter sofrido tamanha selvageria! Um cavalheiro tão
distinto...
- Acredita que ele possa ser a pessoa que procurava? Sussurrou Ruggero, bem ao meu lado.
- Arrá! Você não ouviu? Ele também não sabe como voltar. Parece que se adaptou ao modo de vida daqui mais rápido que eu, mas acho que é ele. Sussurrei também.
- Você viu como ele me olhou? Ele sabe que não sou daqui!
- Sim, eu vi como ele a olhou durante todo o jantar. O tom de sua voz trazia uma pitada de alguma coisa.
Tipo... Irritação.
- Você me leva até a vila amanhã bem cedo? Talvez sem a Ana por perto eu consiga falar com ele e descobrir se ele pode me ajudar com alguma informação.
- Eu já havia lhe prometido isso.
- Valeu, Ruggero!
- Fico feliz em lhe ser útil. Mas seu rosto não parecia feliz.
- Ruggero?
- Sim? Me olhou de um jeito que fez minha respiração voar.
- Obrigada, de verdade! Obrigada por tê-lo trazido aqui.
- Não me agradeça, senhorita. Sorriu um pouco.
- Não tem ideia de como isso é importante para mim! Estava tão feliz por sua ajuda! Ruggero parecia ser um presente dos céus no meio daquele
pesadelo!
- Eu sei que é importante. Por isso fui até a vila esta tarde. Depois que você me disse que talvez este cavalheiro pudesse ser o mesmo que procurava fui tentar descobrir alguma coisa e acabei o encontrando por acaso. Ele falava muito baixo, me aproximei um pouco para não perder nada.
- Achei que seria mais prudente que se encontrassem aqui em casa do que em um quarto de pensão, não quero que você, senhorita, se exponha dessa maneira.
Olhei dentro de seus olhos completamente maravilhada!
- Você não queria que eu me encontrasse com ele sozinha? Lutei para não sorrir.
- Acho extremamente inadequado que fique a sós com um total desconhecido. Seu rosto estava sério, os olhos opacos.
- Você é incrível, Ruggero!
A seu modo, tentava me proteger de um
estranho do qual não tinha nenhuma informação, fiquei um pouco emocionada.
- Você foi a melhor coisa que encontrei aqui, sabia?
Então seus lábios se abriram num sorriso de tirar o fôlego, seus olhos brilharam e achei que meu coração fosse parar de bater.
Oh-oh!
- E você foi a melhor coisa que encontrei em toda minha vida.
Seus olhos queimaram nos meus, sua voz baixa e rouca me provocou arrepios, minha cabeça girava e meu coração acelerou o passo de tal forma que temi
que pudesse saltar do peito.
Ah, não!Ah, não! Isso não pode estar acontecendo!
Não podia!
- Eu... Hã... Eu... Tentei dizer alguma coisa, qualquer coisa, mas não saiu nada.
Estava perplexa demais com a intensidade do que eu estava sentindo. Do que estava e que não deveria estar sentindo. Fiquei olhando dentro de seus
olhos castanhos, incapaz de desviar os meus, senti uma força irresistível me
puxar para ele.
- Eu... Preciso resolver algumas coisas. Ele disse, parecendo desnorteado também.
- Resolver alguns assuntos.
- Tá. Ainda chocada pelos sentimentos que me assaltaram, não consegui pensar em mais nada para responder.
Minha cabeça girava, meu estômago cheio de pedras de gelo era o que parecia, minhas mãos suavam e eu queria muito, muito mesmo tocá-lo.
Ai, não!
- Boa noite, senhorita Karol.
E, como na noite anterior, pegou minha
mão e a beijou delicadamente, fazendo meu coração bater tão forte que achei que minhas costelas pudessem se partir ao meio.
- Boa noite. Tentei dizer, mas acabou saindo apenas um murmúrio.
Só algum tempo depois de Ruggero ter deixado a sala, consegui me recompor o
suficiente para dizer que estava cansada e que queria dormir.
Estava presa numa espécie de transe, minha mente não conseguia se concentrar em nada.
Nada além do sorriso de Ruggero.
Como permiti que isso acontecesse?
Por que não fui embora naquela manhã em que discutimos? Por quê?
Eu não podia me apaixonar por ele, por razões que eu conhecia bem.
Como eu poderia me apaixonar se logo iria embora e nunca mais o veria?
E eu iria embora, de uma forma ou de outra. Como permiti que a enrascada na qual me meti aumentasse ainda mais?
Ruggero era diferente dos caras que eu conhecia, sempre tão educado e atencioso, mas assim eram todos os homens daquele século.
Alguma coisa naqueles olhos castanhos me fizeram confiar nele, aceitar sua ajuda, querer falar com ele e... querer tocá-lo de forma nada educada!
Um tremendo erro!
Um erro que depois me machucaria muito. Precisaria ser cuidadosa e evitar
ficar sozinha com Ruggero.
E precisaria, acima de tudo, manter minhas mãos bem longe dele!
Nesse momento, meu celular vibrou, só então me dei conta de que já estava em meu quarto.
Por um breve segundo, me perguntei como aquilo funcionava.
Como ainda tinha bateria, como captava o sinal, como funcionava apenas para receber mensagens ou ligação e nunca para o meu uso?
Apertei a tela e lá estava outra mensagem.
Dessa vez, não me assustei tanto.
Fase um: completa.
Fiquei confusa. Imaginei que a mensagem seria enviada quando eu tivesse acertado o alvo, me guiando para o caminho certo.
Tipo tá frio, agora tá quente, quente, quente, pelando... Mas eu estive na vila pela manhã e a mensagem só chegou no final da noite.
Eu não sabia o que pensar.
Só sabia que tinha dado um passo na direção de casa, havia feito alguma coisa certa e que logo voltaria.
Uma sensação muito desagradável na boca do estômago me atingiu.
Não pensei mais nisso.
Fui para a cama, ainda atordoada, e tentei muito não pensar em Ruggero.

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