Parte 28

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- Senhorita Karol! Malena se levantou do sofá.
- Está muito elegante!
Eu ainda estava chocada demais para poder falar, apenas olhei para Malena e
tentei sorrir.
- Mas ainda reluta em usar todos os itens do vestuário, pelo que vejo, seu vestido ficaria mais exuberante se usasse, ao menos, a crinoline. Ana acrescentou secamente.
Usar o vestido dessa forma a deixa com o
aspecto de uma simples criada!
- Não concordo com isso, Ana. Acho que Karol está muito bonita, de uma forma muito original! Então Ruggero entrou na sala, ainda atordoado.
- Não concorda, Ruggero? Não acha que Karol está muito bonita com o vestido
que escolhi para ela?
Assim como eu, Ruggero ainda não havia se recuperado totalmente.
Pudera! Duvidei que alguma garota naquele fim de mundo alguma vez tivesse tido a audácia de quase beijá-lo! O que eu estava pensando? E por que disse a verdade a ele? O que havia de errado comigo? Eu não podia estar interessada nele, por razões óbvias que não precisavam de maiores explicações. Dois séculos nos separavam.
Dois Séculos!
Então o que tinha de errado comigo?
Não consegui encontrar a resposta. Concentrei-me em parecer normal, o meu normal pelo menos.
- Está sim, Malena, ouso dizer que ela está muito bonita, realmente. Disse ele, desviando rapidamente os olhos quando encontrou, os meus.
- E agora, meu caro. Ana se aproximou de Ruggero e colocou as duas mãos em seu braço, exatamente onde estava as minhas estava minutos atrás.
- Será que pode nos dizer quem é o convidado misterioso?
- Não é misterioso, senhorita Ana.
Eu apenas estava muito atarefado
para poder dar-lhes mais detalhes. Retrucou ainda perturbado.
- É um novo habitante da vila, conheci-o esta tarde, seu nome é Raul Santiago, está hospedado na pensão da viúva Herbert e não tem conhecidos aqui.
Pensei que seria educado oferecer-lhe um jantar.
- Oh! Já ouvimos falar dele hoje pela manhã na Maison de madame Georgette. Ana se apressou, fiquei alerta.
- Parece que o pobre foi assaltado! Assaltado, Senhor Pasquarelli. Veja a que ponto chegamos. Ela exclamou, horrorizada.
Eu, entretanto, não me choquei, apesar de desconfiar que ele não fosse um pobre homem do século dezenove, mas sim um cara do século vinte e um, mesmo que tivesse sido assaltado, ainda assim, não me surpreenderia.
Assaltos eram tão comuns quanto respirar.
Suspirei, desanimada, como eu queria me chocar também! Queria que assaltos e violência não fizessem parte do meu cotidiano.
- É mesmo? Perguntou Ruggero, fingindo inocência, ele sabia bem a história toda. Eu já tinha contado a ele naquela tarde no estábulo.
- Que feliz coincidência! De toda forma, encontrei o cavalheiro esta tarde quando
fui à vila... Resolver alguns problemas. Pelo que entendi, ele havia acabado de chegar de algum lugar. Então o convidei para conhecer minha família.
Notei que ele me fitou rapidamente quando disse isso.
Então, ele foi procurar o estranho sem mim. Mas por quê? De toda forma, estava agradecida por ter ido, eu precisava falar com esse Santiago, não me importava onde ou como.
- Com sua licença, Senhor Pasquarelli, o Senhor Santiago acaba de chegar.
- Mande-o entrar, Gomes. Não o deixe esperando.
O mordomo saiu apressado e, em seguida, um homem moreno e de estatura mediana entrou na sala.
- Como tem passado, Senhor Pasquarelli? O homem, que era mais velho do que eu havia imaginado, se inclinou para cumprimentar Ruggero.
Ele aparentava ter trinta e cinco ou quarenta anos, pele morena, barba curta e rala, cabelos castanhos lisos e compridos. Se não fosse pelas roupas antigas, poderia se passar por um
roqueiro quarentão, era até bonito, na verdade.
- Estou muito bem, Senhor Santiago. Deixe-me apresentá-lo à minha irmã Malena. Que se inclinou ligeiramente,
- Estas são a senhorita Ana Martínez e a senhorita Karol Sevilla, Santiago se inclinou dizendo:
- É um prazer conhecer tão belas damas.
Analisei o quadro com desconfiança.
Ele não se comportava como eu esperava, na verdade, se comportava como se fosse dali, daquele século.
Talvez tenha entrado no clima mais facilmente que eu, pensei, já que não tinha que usar aqueles vestidos quentes e agir como se fosse uma boneca.
Aposto que nem se importou com a casinha! Ou talvez já estivesse perdido
ali há vários dias.
- Está apreciando a região, Senhor Santiago? Ana perguntou, como
se fosse a anfitriã.
- Para ser honesto, senhorita, ainda não pude admirar a beleza do local.
Seu rosto ficou sério por um instante.
- Não tive tempo para me familiarizar com a região.
- Soubemos de seu infortúnio, senhor, foi lastimável! Malena disse, com a delicadeza de sempre.
- Sim, senhorita Malena. Foi terrível. Ainda estou muito surpreso, tudo
aconteceu tão depressa!
Minhas sobrancelhas arquearam, aquilo estava ficando bom!
- Pretende ficar aqui por muito tempo? Perguntei, ansiosa.
Seus olhos encontraram os meus, pensei ter visto alguma coisa neles, mas não pude dizer o que foi.
- Na verdade, pretendo voltar para casa assim que puder! Seu rosto moreno me analisava atentamente, pensei que procurasse por alguma coisa em especial. Então fui me sentar no sofá, cruzando as pernas e deixando um de meus tornozelos a mostra.
Vi quando seus olhos se fixaram em meus tênis, pois se arregalaram um pouco e a cor de seu rosto mudou.
Tinha que ser ele!
- Espero que consiga voltar para casa o mais breve possível. Disse eu, enfática. -Sim. Ele ainda contemplava meu tênis. -Também espero. Este lugar é um pouco díspar do que eu estou habituado.
- Nem me fale! Falei revirando os olhos.
As garotas me observaram com espanto.
Fomos alertados pelo mordomo que o jantar seria servido, seguimos até a
sala de jantar e eu ainda estava desconfiada das maneiras de Santiago. Ele tinha se adaptado muito bem aos costumes daquele século!
Ruggero se sentou no lugar de sempre, com sua irmã de um lado e Santiago do
outro com Ana a reboque, querendo mostrar a Ruggero que sabia entreter
um convidado, supus.
Sentei- me ao lado de Malena e observei os modos de Santiago à mesa, ele era muito educado, se comportava como Ruggero, só que com menos elegância.
- De onde disse que veio, Senhor Santiago? Perguntou Ruggero, me ajudando com o interrogatório.
A testa de Santiago se franziu um pouco.
- De um lugar muito longe. Não acredito que já tenham ouvido falar dele.
A-Rá!
- Amanhã à tarde precisarei partir em uma pequena viagem para resolver tudo. Tenho coisas importantes me esperando em casa, preciso voltar logo.
Era ele. Tinha que ser ele. Mas onde ele estava indo? Resolver o que?
- E volta quando? Perguntei inquieta.
Ana e Malena me observavam espantadas.
Ruggero não se surpreendeu, tive a
sensação de que, depois do que aconteceu entre nós dois no corredor, nada mais que eu fizesse o surpreenderia.
- Na sexta-feira, creio eu. Ele me encarava fixamente
- Extraordinário! Assim poderá vir ao baile. É claro que já foi convidado,
não foi? Ana não esperou que ele respondesse.
- Será um baile maravilhoso, Senhor Santiago. Todas as pessoas importantes da região estarão aqui.
Só na sexta? Mas eu tinha tanta coisa para perguntar a ele!
- Então, eu estarei aqui, senhorita.
Ele respondeu e depois voltou a me
encarar.
Como de costume, Ana se apoderou da conversa, prestei atenção para ver se Santiago me daria alguma dica, no entanto, ele não disse mais nada que fosse relevante, repetiu a história do assalto e ficou me fitando durante o resto do jantar.
Talvez porque eu o encarasse também.

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