7

76 20 3
                                    

Eu falei com o Imperador mais três outras vezes. Em todas elas, pedi que me auxiliasse na fuga.

Eu não sabia se estava fazendo isso da forma correta, entretanto, eu estava pelo menos tentando.

Aos poucos, o medo diminuiu sua chama, sendo tomado por uma leve brisa do fim da tarde. Ainda tinha medo. Mas estava começando a compreender Yüksek e, devido ao meu aprendizado, entendi também o quanto ele sempre esteve ali.

Nunca havia reparado no mínimo cuidado. Todas as vezes que eu podia sofrer um grande dano, nada que fosse de fato me prejudicar, acontecia. O lugar onde eu estava, claro, acabava comigo. Mas, ao invés de perder a visão, eu fiquei cega por apenas dezesseis horas. Ao invés de ser açoitada, apenas fiquei presa no escuro. Ou, enquanto eu poderia estar sempre sozinha, sem motivo algum, fui parar ao lado de Tinny.

Apesar da péssima circunstância, Yüksek parecia estar ao meu lado. Zelando para que eu não sofresse danos maiores, para que, de fato, tudo o que eu passasse fosse temporário.

Foi quando comecei a reparar que comecei a entendê-lo. Ainda tinha muitas dúvidas.

O que quer que fosse aquela coisa no Jardim de Sulman, mentiu para mim. Eu acho que podia sim ter esperança sobre o Imperador.

* * *

Liana era esguia e possuía pintinhas em sua pálpebra direita, como uma leve sombra. Ela também tinha uma voz rouca e fina, como de uma criança e as costas curvadas como quem tem cifose. Mas não era cifose. Era medo.

Quando ela chegou, sentou-se encolhida do outro lado da sala. Tinny tentou falar com ela, mas a garota apenas abaixou a cabeça. O cabelo estava sujo e oleoso, mas parecia ser de um tom médio de loiro, como tâmaras desidratadas. Ou talvez a vaga luz me confundia e seu cabelo era um castanho de fundo avermelhado.

Ela estava sendo preparada para ser uma espectro. Soube disso quando em seu braço direito, havia uma pulseira amarela com a frase "espectro 1502" escrito em letras pretas.

A fase de preparação era sempre um caos.

Liana ficou em silêncio durante muito tempo. Chorou de noite e, pela manhã, respirava de forma tão fraca que parecia quebrada.

Eu e Tinny dividimos um pão para deixar o outro para ela. Mas aparentemente, ela não quis.

Assim que mais um dia passou, Liana, por fim, levantou os olhos. Puxou a respiração falha com profundidade e, então, cruzou as pernas em uma postura reta, como era instruída a fazer sempre.

Tinny lhe deu água. Eu lhe dei um olhar de compaixão, da melhor forma que podia já que, infelizmente, ainda estava acorrentada.

Ela me ignorou. Ou talvez tenha sido coisa da minha cabeça, porque fiz uma careta de dor.

Minha perna estava um pouco mal cicatrizada. Tinny enfaixara com o pano que cobrira meus olhos aquele dia, mas ela pulsava. Estava com medo de infeccionar. Mesmo assim, fiz com que minha amiga ignorasse meu estado e cuidasse de Liana.

Horas se passaram.

Quando o badalar anunciou a meia-noite, Tinny sentou-se ao meu lado, logo depois de jogar um cobertor sobre Liana, que dormia com uma expressão um pouco perturbada.

— Você já tem um plano? — questionou-me, baixo, como se desejasse que as paredes não tivessem ouvidos.

— Tenho. Só preciso saber quando vou colocar em prática.

Ela anuiu, desnorteada.

— Vamos descobrir como também.

Abri um sorriso para tentar confortá-la, mas surgiu como uma careta. Talvez nem conseguiríamos.

Arthora | A Ascensão dos Sete ReisOnde histórias criam vida. Descubra agora