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Eu gritei.

Tinny curvou-se pela dor, caindo no chão. Encolheu-se, como uma concha, e o sangue começou a escorrer e espalhar-se pelo chão, como um tapete vermelho. Mas era pequeno.

Tapete pequeno.

— Eu odeio você! — gritei ao meu pai.

Ele fungou, como se dissesse que sentia o mesmo.

Corri até Tinny, mas Markus me impediu, segurando-me pelos braços. Eu gritei o nome dela, desesperada para ajudá-la.

— Eu sabia que você ia tentar fazer isso — disse, indiferente. — Sabia que estava planejando, não sou tonto de cair duas vezes na mesma cilada.

Era sim. Ele não fazia ideia do que eu estava planejando.

Me debati.

— Deixe-me ajudá-la, seu infeliz!

— É bom lembrar-se de que sei exatamente onde seus amigos estão. Faço o que eu quiser com eles.

As mãos de Tinny estavam sujas de sangue.

Com as lágrimas nos olhos, e um movimento rápido, recusando-me a perder minha amiga, infinquei o galho da árvore de Uxtan na perna de Markus. Enquanto ele urrava de dor e cambaleava, gritando para que guardas corressem para acudi-lo, corri até Tinny, ajudando-a a ficar de pé.

— Gaëlle, eu vou te atrasar...

— Não vou te deixar para trás.

Com certa pressa, arranquei o pano que Tinny amarrara em minha perna e fiz uma tala rápida em seus abdômen, por cima da roupa surrada.

Dor pulsava pelo meu corpo inteiro. Tinny começava a ficar pálida.

Guardas apareceram atrás de nós, apontando as armas.

Antes que nos cercassem, agarrei a mão de Tinny e a puxei para fora, onde a porta da frente da mansão nos levaria direto para o relógio.

Corremos, dependendo de nossa liberdade.

As balas pegavam muito próximas de nós. Senti como se, de raspão, uma delas pegasse meu tornozelo, mas isso ainda não tinha me impedido de correr.

Depois que ultrapassamos a porta, a vista foi tenebrosa.

Tique-taque.

O ponteiro de minutos estava alguns passos para a direita. O de segundos parecia um trem-bala; tão rápido quanto flechas nas aljavas de um arqueiro, poderia cortar-nos ao meio.

Não vi o ponteiro das horas.

Puxei Tinny para o ponteiro de minutos, vendo-o mudar segundos antes de pisarmos nele. Conseguimos raciocinar.

Abaixo de nós, a imensidão do abismo me fez tremer as pernas. Não era possível ver seu fundo. Algumas histórias da prisão diziam que, lá em baixo, ficava uma criatura que comia carne humana. Vivo ou morto, sua pele seria rasgada pelos dentes da criatura. Apesar de não saber se isso era verdade, não queria mesmo fazer o teste.

Eu e Tinny corremos como pudemos sobre aquela fina ponte. Ela balançava com nossos passos apressados. Descalças, o metal quente e liso quase machucava nossos pés.

Mais tiros foram ouvidos.

Por um momento, olhei para trás. Nenhum dos guardas arriscou-se pisar no ponteiro, mas atiravam, sem parar.

Eles tinham medo. O que quer que tivesse no abismo, lhes dava medo, mas eles não parariam o relógio apenas para nos pegar. Era mais fácil chamar outros guardas ou acelerar o tempo.

— Gaëlle, abaixe-se!

Foi por pouco que o ponteiro de segundos não pegou meu pescoço. Levantamos, rápidas, e continuamos a correr. O tintilar da corrente chegava a ser irritante.

Ouvi Tinny gritar.

Ela caiu sobre mim, empurrando-me para frente.

Então, minha amiga deslizou.

Estiquei a mão, agarrando o braço dela e suas unhas rasgaram minha pele ao se segurar em mim, desesperada.

Com o coração acelerado, agarrei um dos lados do ponteiro com um braço e uma perna, prendendo-me a ele enquanto segurava-a. A garota observou o abismo abaixo de nós.

Com um grito de dor, puxei-a para cima, mas estava fraca demais para isso. Meu corpo estava dolorido e aquela maldita corrente que amarrava meus pulsos apenas dificultava a situação. Quando tentei novamente, ouvi a voz de Tinny.

— Pare!

A observei.

Lágrimas desceram. Seus olhos marrons avermelhados me observaram. Por um segundo, vi esperança.

Com o nariz vermelho, ela soluçou e abriu um sorriso.

— Me deixe ir.

Neguei.

— Não! Não vou deixar você para trás.

— Está tudo bem! Eu vou ficar bem.

Solucei. Ela tremia.

— Tinny...

— Salve-os por mim. Salve meu povo. Salve o seu. Eu confio em você.

— Não...

— Está tudo bem, minha irmã! Vai dar certo. — Mais lágrimas escorreram dos olhos dela. Já não a enxergava direito; estava chorando também.

Não protestei. Não tive tempo.

Com um movimento, Tinny desvencilhou-se de minhas mãos fracas e jogou-se no abismo.

Eu gritei. Gritei por seu nome. Por ser injusto. Por não levá-la comigo.

Gritei porque não queria que uma criatura sumisse com o corpo dela.

Implorei que voltasse. Tinny não voltou. Senti as lágrimas pingarem e perderem-se no abismo. O ponteiro moveu-se.

Eu tinha agora, apenas quatro minutos para fugir.

Arthora | A Ascensão dos Sete ReisOnde histórias criam vida. Descubra agora