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Eu me abaixei quando ele pulou na minha direção.

A primeira coisa que percebi foi que era cego. Precisou-se um tempo para localizar-se enquanto fungava e virava na minha direção.

Seus olhos então, de nada serviam. Eram esbranquiçados, como duas fortes camadas de teias de aranha.

Desviei mais uma vez, alternando os pés. Quando o monstro avançou, eu inclinei o tronco e virei para o lado, tentando manter os passos o mais leve possível.

Agarrei uma adaga do cinto. Céus, como sentia falta disso.

Arremessei, acertando a testa dele, bem ao centro.

O monstro caiu como uma tábua dura ou uma geleia. Seu sangue, verde, espirrou para todo lado e pegou um pouco no meu traje.

Olyns. Na Estrada de Jônix.

Mas até onde sabia, Olyns falavam.

Dei um passo para trás, ainda sentindo a respiração entrecortada.

Mas quando pensei em voltar para a trilha, outros Olyns caíram ao meu redor e me cercaram. Estes, entretanto, não eram cegos. Tinham olhos graúdos e pesados, em um tom forte de verde. E fediam, como o último.

Nunca havia lutado contra um. Nunca tinha visto um. Eram lendas também. Histórias para fazer as crianças manterem-se comportadas enquanto os pais quase se divorciavam no quarto ao lado.

Todos eles fungaram.

Senti meu peito apertar-se, angustiado.

Não sentir medo não adiantaria nada. Era o cheiro de carne humana que sentiam.

Engoli em seco.

— Ora, ora — disse um deles. Mais alto, porém mais grotesco. Tinha três fitas de musgo enroladas nos ralos fios de cabelo de sua careca manchada. — Comida logo cedo!

Se eu atacasse um deles, outro me atacaria por trás. Comecei a me perguntar se uma mordida deles seria fatal como diziam as lendas.

Mesmo assim, mantive-me parada.

— O que uma garotinha tão indefesa faz longe de casa? Certamente há outros de você por aqui...

— Não há outros de mim. Apenas eu.

— Sozinha? Que estranho.

Falso estranhamento. Sua boca enorme abriu um sorriso torto, de lábios cortados e quase roxos.

Instintivamente, segurei o cabo de outra adaga por baixo da camiseta branca.

— Oh. Não precisa ter medo. — Seu sorriso era grotesco. — Só vai doer um pouquinho.

O Olyn deu um passo, mas eu virei, atingindo outro que se aproximava por trás para me pegar de surpresa.

Enfiei uma adaga em um, retirando-a e girando, para arremessar em outro à minha direita. Com mais um movimento, e retirei mais duas do cinto, acertando outros dois ao lado do Olyn maior.

Ele avançou.

Levei a mão para pegar outra adaga, mas fui obrigada a desviar rapidamente de uma mordida.

E então, Vanella reluziu ao pousar ao meu lado.

A agarrei, levando a lâmina em direção a outro Olyn, cortando suas pernas antes de enfiar a espada em seu coração. Ao arrancá-la de seu peito, cortei a mão e o pescoço de outro.

Mais um aproximou-se, mas eu o empurrei com o pé, enfiando Vanella bem fundo em seu cérebro. Ainda com a lâmina no corpo daquela coisa, arrastei o Olyn e joguei por cima de outro, derrubando-o. Então, rapidamente, o decapitei.

Até que restou apenas o Olyn com a trança de musgos. Ao meu redor, o cheiro pútrido dos corpos podres me embrulhava o estômago.

Em seus olhos, havia um certo espanto. Me encarava, com a respiração falha. Sua boca curvou-se em desgosto e os olhos piscaram, remelentos.

Mas antes que ele me atacasse, tiros ressoaram pela floresta. Um, dois, três, sete tiros.

O Olyn caiu e afogou-se no próprio sangue.

Logo em seguida, havia um par de olhos verdes esmeraldas em cima de mim.

Renoward se aproximou, mas antes que ele me agarrasse, dei alguns passos para trás. O soldado, entretanto, foi mais rápido e me agarrou pelo braço, jogando-me em seu ombro.

Bati em suas costas.

— Me larga, seu panaca!

O príncipe me ignorou.

Me empurrei, tentando me soltar. Como nenhum de meus movimentos surtia efeito, infinquei Vanella no barranco de terra, fazendo com que eu fosse puxada dos braços de Renoward.

Ele virou-se, como um relâmpago.

Apontei a espada para ele.

— Se aproxima e eu corto você ao meio.

— Como se você tivesse coragem.

— Você não ousaria...

Antes que me desse conta, suas mãos agarraram as minhas, mantendo-as ao lado do corpo. Fiz força para puxar, mas Renoward segurou firme.

— Vai morrer se ficar mais um segundo aqui. E como sei que é teimosa, pretendo te levar por conta própria.

Me rebati. Não surtiu efeito.

— Pare de fingir que se importa! Eu pedi isso e você continua ignorando.

— Eu me importo.

— Claro que sim. Por que não passo de um instrumento para você. Vai fazer o que quando a guerra acabar? Me despachar como meu pai?

Ele ficou quieto. Olhou alguma coisa atrás de mim, desviando o olhar tão rápido quanto viu. Pareceu levemente tenso. O mesmo medo demonstrou-se intenso, porém num vislumbre em seus olhos. Ele engoliu em seco. Então aproximou-se e disse:

— Exatamente.

Renoward me jogou de novo nos ombros. Eu bati em suas costas. Talvez quisesse chorar, mas não sabia se era válido.

Até que vi. Atrás de nós, com a mão nos bolsos, havia um homem. O cabelo preto balançava pelo vento. Usava um gibão de um tom vermelho escuro, como meu cabelo. Tinha um sorriso, que mais parecia malvado e satisfeito.

E tinha olhos amarelos.

Arthora | A Ascensão dos Sete ReisOnde histórias criam vida. Descubra agora