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Meus pés ardiam em chamas, o pulmão implorava por uma trégua e meus machucados rasgavam-me a pele, querendo me puxar ao chão como mãos de areia quente.

O telhado de cor terra vermelha, estava quente como uma chapa de fazer carnes, mas o frio do lado de fora foi o que me impactou de verdade. Não havia possibilidades de neve em Uxtan, apesar das épocas de inverno durarem quase o ano todo. Não era assim nos reinos vizinhos – mas não importava, ali estava, de fato, muito gelado.

Não tremia porque em meu corpo, uma sensação esmagadora me fazia querer ir cada vez mais rápido. Fechava as mãos em um punho, enterrando as unhas grandes na palma, como se a dor ali aliviasse outras.

O caos de guardas havia passado. Sabia que estavam atrás de mim, mas eu tinha apenas um minuto e trinta e sete segundos para ultrapassar aquele portão antes que ele fechasse.

Quando o alarme de fugitivos era soado, os portões fechavam em cinco minutos. Todos eles. Ninguém entrava, ninguém saía. Se eu ultrapassasse o portão a tempo, me livraria de Ayllier por, ao menos, trinta e uma horas.

Mas esse era o problema. Não dava tempo. Não daria...

Apertei o passo. O som dos meus pés contra as telhas eram altos.

O som do alarme, ainda maior.

Uma cotovelada me atingiu na barriga. Eu me retorci, chorosa. Com meu desequilíbrio, um dos guardas quase conseguiu me alcançar. Outro tentou agarrar meu braço, sabendo do possível dano que poderia causar pela velocidade em que estávamos; ainda assim, esticou o braço para segurar-me.

Com um movimento, empurrei-o, mas isso apenas causou desequilíbrio. O guarda me segurou firme quando fomos os dois para o chão, as telhas cortando meus braços e pernas.

Tentei me soltar para levantar. Ele segurou firme, com tanta força que levei a outra mão para arrancar a dele enquanto fazia uma careta.

O general, atrás de mim, abriu um sorriso. Ele esperou até que sua respiração parasse de ser tão ofegante.

Um minuto.

— Você precisa parar com isso. Seu pai vai matar você.

— Literalmente — falei.

Ele riu. Quem o ouvisse, poderia dizer que ele estava tentando ter compaixão, entretanto, o sorriso e o olhar do general eram um tanto cruéis para que estivesse mesmo com pena de mim.

Ele jamais me ajudaria.

— Depois disso, vou fazer questão de que sua sala seja vigiada a todo tempo.

— Não se eu puder evitar.

Torci o meu braço, fazendo com que o braço do guarda que me segurava se retorcesse também. Ele soltou um grito e eu chutei o joelho dele, fazendo-o cair.

O general me atacou, mas antes que ele fizesse qualquer movimento brusco a mais, eu enfiei o galho no olho dele. O sangue respingou em mim e seu grito foi doloroso. Tão doloroso que senti vontade de me encolher.

Antes que eu pudesse dar muitas chances para que ele me agarrasse, segurei o galho com força, puxando-o.

E então corri em direção ao campo.

Eu sabia, sabia que as balas podiam matar. Vinte e cinco balas por segundo não eram tão fáceis de desviar. Mesmo assim, tive esperança.

Por favor. Por favor, que tenha dado certo.

Quando pisei no campo, debruçando-me sobre meus braços cansados, esperei a dor.

Mas ela não veio.

As torres estavam desativadas.

Abri um sorriso em meio ao caos. O alívio dançou dentro de mim como uma valsa poética.

Levantando-me de forma desajeitada, disparei na direção do portão.

Vinte segundos.

O coração batia apertado, as mãos tremiam, os pés imploravam por um descanso. Minha mente, já enevoada, repetia apenas uma palavra, incessante.

Vai, vai, vai, vai, vai, vai, vai...

Estiquei o pescoço, como se isso fosse me fazer chegar mais rápido. Tentei apressar os passos, mas as pedrinhas no meio da grama massacravam meus pés. Com força, segurei o galho, torcendo para que ele não quebrasse.

Lágrimas escorreram pelos meus olhos.

Dez segundos.

Eu não ia conseguir. Estava na metade ainda. O desespero tomou conta de mim. Quis gritar para que não fechasse, mas isso levaria muito tempo.

Meus braços imploravam por descanso, meus cortes abertos sangravam pela camisola, os dedos, gelados pelo frio e encrustados de sangue, que já não era apenas meu. Era de Tinny e dos guardas. Era do meu pai e de pessoas talvez não tão inocentes.

O frio batia em minhas pernas como uma estaca de madeira dura e teimosa.

Uma sensação de conforto, de repente, me atingiu.

Havia algo, no fundo do meu coração. Estou com você. Aguente firme.

Dois segundos.

Não alcancei a tempo.

Mas não parei de correr. Quando os portões começaram a fechar, tentei ir ainda mais rápido do que as pernas. Inclinei-me para frente, tentando ganhar mais velocidade.

E, antes que meu último fio de cabelo passasse pelo portão, ele fechou-se completamente.

Arthora | A Ascensão dos Sete ReisOnde histórias criam vida. Descubra agora