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Existiam muitas lendas em relação aos povos do Continente. Os Sete Reinos surgiram muito antes de qualquer menção de guerra. Essas terras eram tão velhas quanto rasuras gravadas nas cavernas com sangue e carvão.

O reino mais novo era Tuorc. Com mais ou menos, sete mil anos. Pouco, comparado ao tempo que levou para os outros povos reerguerem-se.

Em uma das lendas, havia a história de uma garota que chorava pelo coração partido. Em uma névoa de sentimentos, foi condenada a chorar até morrer e, suas lágrimas, formaram uma espécie de metal frio, único e raro.

Ao ser descoberto, foi recolhido e derretido para formar uma fina camada de uma espécie de cúpula esquisita, que afasta qualquer toque, mas também expande e murcha, atingindo o que quer que for ao seu redor, para matar.

A lenda dizia que, quando o efeito de reversão fosse encontrado, a garota pararia de chorar. Mas o coração não poderia deixar de ser partido: nenhum pedido de desculpas parecia acalentar a dor que sentia.

É claro, não se pode confiar em lendas. Lendas contam histórias distorcidas pelos povos, de tanto falarem.

Neste caso, a única verdade que as lendas, de fato, traziam, era que não se pode confiar nelas. Estavam cheias de distorções: só existiam para distrair a cabeça e enganar quem acreditava em tudo.

Mas aquilo me fez pensar durante a noite toda. É claro que a cúpula não era feita de lágrimas. Se fosse, a sua estrutura reluzente seria diferente. Entretanto, uma parte da lenda era verdade. Metal frio. A parte de esquentar o que é frio, em específico.

Se eu construísse uma cúpula para matar quem passasse, faria algo que não suportasse o mínimo de calor. Algo que expandisse diante do quente, empurrando a pessoa para longe do Jardim. Um sistema de segurança, a forma como seria minimamente para expulsar qualquer tipo de calor, para longe.

Naquela noite, levantei com um soluço.

Nunca foi sangue, nem pele. Era o calor humano.

* * *

No dia seis do mês de Pontunie, calendário arthoriano, uma festa era dada no último andar da mansão. Encerramento de pesquisas e início de novas era, aparentemente, um motivo para comerem em um banquete. Isso foi desde sempre, todos os anos.

Tive algumas oportunidades de participar, mas era terrível. Muito desperdício e muita comida quando nos faltava alimento.

Mas esse era o dia perfeito para fugirmos.

Antes de tudo, repassei o plano para Liana e Tinny.

E eu discuti com elas.

Quando contei que o que retirava a cúpula era, na verdade, o calor, tivemos muitas ideias. Jogar fogo, uma tábua quente, carvão retirado da lareira.

Entretanto, o que mais funcionaria era, claro, o calor do corpo humano. Dada as circunstâncias da lenda da garota das lágrimas, o que acalentaria um coração partido poderia ser o calor humano.

Mesmo que a lenda fosse uma distorção da verdade, não deixava de dizer, implicitamente, como abrir a cúpula sem uma chave.

Lembro-me que, um pouco mais afastado da árvore e da cúpula, um painel estava exposto e, bem pequeno, do lado, tinha o formato de uma fechadura. Era provável que meu pai carregasse a chave com ele, mas pegá-la estava longe de uma possibilidade. Sabia que ele perceberia.

Ora, se minha filha viesse com algum assunto e, por algum acaso, encostasse em mim em algum momento, eu desconfiaria dessa possibilidade. E a situação tornava-se levemente mais complicada quando eu sabia que ele era esperto como eu. Entretanto, parte do seu desprezo entregava que ele não acreditava que eu poderia pensar como ele quase todo o tempo.

Arthora | A Ascensão dos Sete ReisOnde histórias criam vida. Descubra agora