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Havia um vale em Parvin. Ele era repleto de água, luz do sol e grama verdinha. Havia flores roxas, azuis e brancas e poucas árvores espalhadas. Havia também algumas ovelhas e talvez peixes para que pudéssemos comer.

Um lugar perfeito para fazer uma fogueira durante a noite. Ou pararmos na sombra da árvore para descansar.

Entretanto, aquela imagem desintegrou-se em pedaços cortantes de vidro fino, amarrados nas minhas pernas, que pulsavam mais devagar que um coração partido, e arranhavam os ossos.

Quando abri os olhos, eu estremeci. Sentia tanta dor no corpo que minha cabeça pulsou junto.

Ao menos ainda estava viva.

E todos os outros também, aparentemente.

Eu agarrei a blusa de Renoward bem forte quando a dor pulsou de novo. Era como se estivesse esfarelando. Se os tornozelos estavam quebrados, eu não fazia ideia do que faria daqui para frente. Não tínhamos tanto tempo assim.

— Estamos chegando — sussurrou ele.

Quase não quis dar ouvidos.

Não contei os minutos. Apenas me lembro de Renoward ter sussurrado mais alguma coisa.

E então, ele parou. Pela movimentação, percebi que abaixou-se.

— Não se assuste — disse. — É apenas água.

Minha cabeça estava enevoada.

Quando um líquido gelado tocou meus pés, abracei forte o pescoço de Renoward. Meus tornozelos balançaram e eu choraminguei de dor.

A água chegou até minha panturrilha. Renoward não me soltou em nenhum momento. O pulsar diminuiu, quase como tomado por um bálsamo.

Então abri os olhos. A grama estava seca e as árvores com poucas folhas. Havia pequenos pontinhos brancos descendo do céu e caindo sobre nós. Um floco pousou no meu dedo. Eu o amassei, vendo-o desintegrar e virar água.

Renoward estava com a água até a metade do corpo. Minhas mãos estavam geladas.

— Estamos em Parvin? — questionei.

— Sim.

— Mas isso é... é neve.

Um suspiro. Uma leve pontada de dor.

— Parece que o mundo está esfriando. A cada minuto fica mais congelante.

— E o que é que fazemos na água?

— A água gelada alivia a dor e, apesar de não ser o melhor momento, você estava sentindo dor demais para não abrir uma exceção.

— Como sabe que...

Soube que ele abriu um sorriso sem graça.

— Você tremeu o tempo todo. Tentei amenizar com algum outro remédio, mas não adiantou, você quase parecia ter febre.

— Não lembro de ter tomado outro remédio.

— É, mas você acordou e tomou ele todo. Voltou a dormir em instantes.

— Você vai congelar aqui.

— Eu vou ficar bem — disse.

Permaneci abraçada a ele. A dor amenizou, tornando-se apenas um quase latejar pulsante.

Depois do primeiro pesadelo, eu não sonhei. Apenas me encolhi, tentando relaxar o corpo e não pensar no que faria. Agora era um péssimo momento para ficar de cama, principalmente quando Zylia ainda estava desacordada.

Arthora | A Ascensão dos Sete ReisOnde histórias criam vida. Descubra agora