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Alyssa estava fria. Seus olhos verdes deslizavam, desacreditados ao ver Levent.

Ela voltou-se para mim. Pareceu querer dizer alguma coisa, desesperada para achar as palavras corretas.

Então, voltou-se para ele.

— Eu pensei que você estava morto.

Ele deu de ombros.

— E você não tinha sido presa?

Houve silêncio. As pessoas observavam, atentas ao diálogo. Analisavam-nos.

Levent deixou a bengala de lado, em pé, no meio da sala, e caminhou até a mesa de comidas, agarrando alguns salgadinhos.

— E quem é a garota? — perguntou.

— Ah. Esta é Gaëlle.

Levent aproximou-se. Conseguia ser mais bonito que Harvey. Sua pele era escura, mas o rosto era formoso. Passava um ar de leveza e elegância. Tinha cheiro de nozes e café.

— Uma garota tão bonita, tanto de nome quanto de rosto — disse. Então, estalou os dedos, encaixando uma mão na outra. Quando abriu, havia uma flor. Ele me ofereceu. — Aceitaria um presente?

Eu peguei a flor, dando um sorriso tímido e hesitante.

— Obrigada.

— Acredite em mim, moça — disse ele, percebendo minha hesitação. — Não vou enganar você. Só estou aqui porque Harvey me odeia, e eu gosto de todas as pessoas que ele não gosta.

Então, Levent virou-se para Alyssa. A princesa de Sulman parecia feliz, mas, ao mesmo tempo, surpresa demais.

— Como está seu irmão? Nunca mais o vi depois do festival.

— Talvez porque você tenha desaparecido.

— Não me culpe por isso. A culpa foi toda de Harvey.

— Imagino. Meu irmão está bem. Ainda se lembra de você.

— É um garoto esperto. Imagino que ainda seja.

Nós ficamos em silêncio.

Eu não fazia ideia do que estava acontecendo. Cutuquei a garota.

— Alyssa, acho melhor irmos...

Ela assentiu.

— Está bem.

— Ah, antes que eu me esqueça!

Levent agarrou a bengala, fazendo um bico com a boca.

— O que estão fazendo aqui mesmo? É um lugar distinto demais e imagino que não tenham sido presas.

— Não fomos. Viemos atrás do Jardim, mas Harvey veio com uma proposta. Inclusive, acho que está na hora de subirmos de volta.

Ele cambaleou para trás, precisando colocar mais peso na bengala. O rosto alegre foi substituído por uma expressão de surpresa e estranhamento. Eu apostaria que o brilho naqueles olhos castanhos também possuísse medo.

— Harvey não... ele não está fazendo a cabeça de vocês, está?

Ficamos em silêncio. Alyssa pareceu prender a respiração. Eu fechei a mão em um punho, tentada a sair correndo.

— Ah, droga — disse ele ao reparar no nosso silêncio. — Que droga. É claro que ele está, ele faz isso com todo mundo.

Levent aproximou-se. Ele estava atordoado. Os nós dos dedos ficaram brancos ao apertarem com força a bengala. Seu rosto possuía uma expressão alarmante e, pior que isso, amedrontada.

— Preste atenção, moça. Aconteça o que acontecer, não aceite essa proposta de casamento.

Minha garganta fechou-se pelo nervosismo. Senti as mãos frias.

— Como é que você sabe?

— Porque ele faz isso há anos. É uma forma de te prender, seja no Devaneio ou aqui nesta sala.

— Levent...

— Alyssa, eu sei que não confia em mim — ele virou-se para ela. — Eu sei que, de todas as formas, o que eu fazia era bizarramente cruel também. Mas eu me arrependo profundamente de tudo.

Lágrimas juntaram-se nos olhos de Levent. Mesmo assim, sua voz não se abalou.

— Você estava certa. Sempre esteve, esse tempo todo.

Alyssa esfregou as mãos nos braços.

— O que aconteceu com você?

— O Imperador me encontrou — disse. — E foi a melhor coisa que me aconteceu.

Ela o encarou, séria. Por alguns momentos, imaginei-a ignorando-o completamente, mas Alyssa abriu um sorriso. Então, ela cobriu a boca e abriu um sorriso.

— Fico muito feliz de saber disso, Levent.

Ele assentiu.

— Eu sei. Obrigado. Por alertar-me.

A garota abriu um sorriso.

O homem virou-se para mim.

— Escute, volte lá para cima, junte suas coisas e dê o fora daqui o mais rápido possível. Se Harvey decidir prendê-los, só poderão sair quando alguém de fora conseguir combatê-lo. — Ele indicou as pessoas na sala. — Ninguém aqui foi capaz disso. Ele manda para este lugar todas as pessoas que não pode controlar.

Eu neguei.

— Mas a única forma de conseguir entrar no Jardim é com o casamento.

Levent balançou a cabeça veemente.

— Ele mentiu para você, menina. Ele só estava tentando convencê-la de casar-se. Esse é o ponto da questão toda. Se Harvey fizer sua cabeça e convencê-la a aceitar o casamento, você nunca mais terá consciência dos próprios atos e não poderá nos ajudar. E se não aceitar, ele vai prender você e todos os seus amigos nesta sala. A única forma de nos tirar daqui é entrando no Jardim.

Levent aproximou-se, colocando as mãos nos meus ombros.

— Eu prometo explicar melhor depois. É que agora você precisa correr. Junte suas coisas, entre no Jardim, pegue o que precisa. Antes que seja tarde demais.

Arthora | A Ascensão dos Sete ReisOnde histórias criam vida. Descubra agora