Quando chegamos em casa, o silêncio que havia entre nós parecia quase palpável. O som das chaves na fechadura, o estalo da porta se abrindo, e o cheiro familiar da minha casa foram as primeiras coisas que atingiram meus sentidos. Eu olhei para Victória, que ainda estava apreensiva, e o simples fato de vê-la ali me fez sentir uma mistura de alívio e nervosismo.
— Bem-vinda à minha casa! — eu disse, tentando soar mais confiante do que me sentia.
Ela entrou, olhando ao redor com um leve sorriso. — A casa é a sua cara, Nathalia! — ela comentou, a voz um pouco hesitante. — O bom gosto não mudou, pelo que vejo.
Eu dei uma risadinha nervosa, tentando disfarçar a tensão.
— É, eu sempre fui um pouco obsessiva com a decoração. Vou preparar um drink. Quer alguma coisa para comer?Ela balançou a cabeça, parecendo relaxar um pouco. — Não, obrigado. Só... estou bem.
Sem esperar uma resposta mais entusiasta, fui para a sala, onde peguei a garrafa de whiskey do bar. Despejei uma dose generosa em um copo e tomei um gole, sentindo o calor do álcool me acalmar um pouco. Era uma tentativa de me relaxar antes de enfrentar a conversa que, sabia, viria a seguir.
Decidi quebrar o gelo, e, ainda com o copo na mão, gritei para a cozinha. — Vou preparar algo para comer. Não sei se você se lembra, mas seu prato favorito era risoto de trufas e cogumelos selvagens. Vou fazer isso.
Ouvi os passos de Victória atrás de mim e a vi entrar na cozinha, observando enquanto eu começava a preparar o prato. O clima ainda estava um pouco tenso, mas sua presença ao meu lado parecia estar começando a fazer diferença.
— Eu não esperava que você ainda soubesse fazer isso. — Victória comentou, a voz um pouco mais leve. — O tempo fez bem para você, Reis.
Senti um sorriso se formar no meu rosto. — Eu nunca deixei de cozinhar. É uma das poucas coisas que sempre me acalma.
— Eu posso ver isso. — ela respondeu, se aproximando da bancada. — E é bom ver que você ainda é a mesma.
A cozinha estava envolta em um aroma delicioso enquanto eu mexia o risoto, e o silêncio que antes parecia tão pesado começou a se dissipar. Victória parecia mais relaxada, talvez até um pouco impressionada com o que via. Seus olhos estavam fixos em mim, e, pela primeira vez desde que ela havia chegado, pude ver um brilho mais suave em seu olhar.
— Eu sempre amei o jeito como você cozinhava! — ela disse, quase como se estivesse falando para si mesma. — Era uma das coisas que eu mais sentia falta.
Aquelas palavras, simples e sinceras, mexeram comigo.
— Eu também senti falta de você, Victória. Às vezes, quando estava sozinha, eu me pegava pensando em como seria bom ter você aqui, mesmo que fosse só para uma refeição.
Ela se aproximou mais, olhando para a comida que estava sendo preparada. — O tempo faz com que a gente perceba o que realmente importa. Eu... eu nunca pensei que voltar a ver você fosse ser assim, tão... intenso.
Eu sorri, tentando manter a conversa leve. — Intenso é um bom jeito de descrever. É engraçado como, depois de tanto tempo, ainda conseguimos ter essa conexão, mesmo que seja só através de um prato de risoto.
Enquanto eu terminava de preparar o prato, o ambiente entre nós foi se tornando mais confortável. A tensão inicial foi substituída por uma sensação de familiaridade e compreensão, e o clima pesado foi sendo suavizado pelas conversas e pela atividade de cozinhar juntas.
Finalmente, coloquei o risoto na mesa, e nós nos sentamos para comer. Embora ainda houvesse muito a dizer, e um mar de emoções para explorar, aquele momento parecia um pequeno passo em direção a alguma forma de reconciliação. E, por um breve instante, parecia que o tempo havia parado, e eu podia desfrutar simplesmente de estar com Victória novamente, sem pressões, apenas dois corações que, apesar de tudo, ainda se importavam profundamente um com o outro.
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Perdido ao sonho
Historical FictionQuando nos apegamos ao passado, o futuro promissor se obscurece sob o véu das lembranças, aprisionado entre os escombros do que já foi. É como se nossos sonhos, outrora radiantes e audaciosos, se perdessem na penumbra da nostalgia, enquanto nos enco...