Hoje era pra ser um dia comum, só que "comum" e "minha vida" nunca andaram na mesma frase. Tudo começou quando Ana Clara decidiu que a gente precisava de uma "tarde de autocuidado". Ela entrou no escritório da minha casa praticamente marchando, com Hayley a reboque e uma expressão de determinação que geralmente só se vê em guerra.
— Nathalia, vamos cuidar desse seu cabelo agora! — ela anunciou como se tivesse a maior das urgências. Você tem um show amanha e precisa de muito glamour.
— Ah, não! Já sei o que isso significa — tentei me desviar, mas ela me segurou pela jaqueta. — Vocês não vão tentar fazer aquelas máscaras faciais com ingredientes estranhos de novo, né?
— Você nem vai acreditar na receita de hoje — Hayley riu, exibindo um potinho cheio de uma pasta esquisita e, provavelmente, altamente explosiva.
A última vez que aceitei uma dessas máscaras, fiquei três dias com a pele grudenta, sentindo cheiro de pepino e manjericão.
— Isso é um atentado à minha integridade! — protestei.
— Não reclama, é tudo orgânico! — Ana Clara rebateu. — Essa mistura é de abacate, mel e um pouco de gengibre. Vai deixar sua pele brilhando!
Suspirei, mas não tinha saída. O olhar dela era o de quem não aceitaria um "não" como resposta. Em questão de minutos, me vi sentada no sofá com aquela pasta no rosto, enquanto as duas riam e espalhavam mais da mistura em si mesmas.
— Ei, tá coçando — falei, tentando limpar um pouco.
— Se coça, é porque tá funcionando! — Hayley deu de ombros.
— Ah, então deve estar funcionando bem demais! — Respondi, tentando não rir com o rosto travado de abacate.
A sessão de beleza acabou quando o abacate de Ana Clara decidiu derreter pelo sofá. Ela deu um pulo e quase derrubou o potinho inteiro, o que transformou nosso momento de relaxamento em um cenário de desastre. De alguma forma, na tentativa de limpar, Ana Clara caiu e ainda puxou Hayley junto, que soltou uma gargalhada tão alta que acho que até a cidade vizinho ouviu.
Depois que limpamos a bagunça, achamos uma ideia brilhante ir jantar fora.
— O restaurante da esquina está com promoção de rodízio de pizza. Se der uma pizza por real gasto na maquiagem orgânica de hoje, a gente merece um desconto — brinquei, ainda me recuperando da sessão caseira de beleza.
Chegando lá, já estávamos meio desajeitadas, afinal, era difícil esquecer a lambança de abacate. E, como de praxe, não fomos discretas na entrada. Ana Clara, cheia de graça, deixou a bolsa escorregar e acertou um cliente distraído. Para compensar, ela soltou um "desculpa" que soou mais como "ups" e seguimos em frente, rindo como se nada tivesse acontecido.
Sentadas, a conversa não melhorou muito:
— Vocês lembram da vez que o namorado da Ana Clara tentou me convencer de que era chef de cozinha? — Hayley começou, rindo já antes de terminar a história.
— Ele falava como se soubesse todas as técnicas de gastronomia! — Ana Clara revirou os olhos.
— Verdade, e acabou misturando arroz com molho de pimenta e chamando de "risoto apimentado". — Ri, lembrando do desastre.
Quando a pizza chegou, Ana Clara resolveu que queria provar todas as combinações possíveis. E foi nessa de "um pedaço de cada" que Hayley decidiu bancar a cientista culinária, colocando ketchup na pizza de frango com catupiry.
— Vocês têm noção do que estão fazendo? — perguntei, quase chorando de rir com o caos em volta.
— É ciência, Nathalia. Ciência! — Hayley respondeu, com uma falsa pose de sabedoria.
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Perdido ao sonho
Historical FictionQuando nos apegamos ao passado, o futuro promissor se obscurece sob o véu das lembranças, aprisionado entre os escombros do que já foi. É como se nossos sonhos, outrora radiantes e audaciosos, se perdessem na penumbra da nostalgia, enquanto nos enco...