O sol mal começava a esquentar as ruas de Los Angeles quando decidi que aquele seria meu dia de folga — ou melhor, meu dia de treinamento intensivo. Precisava dar um tempo nos jogos mentais, nas manipulações, e focar em algo mais físico, mais visceral. A decisão de contratar Travis, um ex-fuzileiro com uma longa carreira nas Forças Especiais, havia sido a melhor que tomei nas últimas semanas. Haylley também estava treinando com ele, porem em dias diferentes de mim.
Cada treino me deixava mais forte, mais ágil e, acima de tudo, mais preparada para o que estava por vir. Fiz questão de esconder tudo de Victória e de Ana Clara — não era algo que elas entenderiam, e, na verdade, não queria que entendessem. Esse era um fardo que eu precisava carregar sozinha.
Mas havia algo mais. Aquelas horas de treino, cada soco, cada chute, cada tiro certeiro, estavam me moldando. O espelho me devolvia um físico renovado, fortalecido, e isso me trazia uma segurança que fazia tempo que não sentia. Era como se cada golpe que desferia nas aulas com Travis estivesse afastando um pouco do medo que ainda insistia em se esconder em algum canto da minha mente.
O que eu estava fazendo era por uma boa causa, mesmo que ninguém soubesse disso. Estava me expondo ao perigo para proteger aqueles que amava, mas preferia que Ana Clara e Victória seguissem suas rotinas em paz, sem saber da profundidade de tudo isso.
Cheguei ao QG improvisado, um galpão pouco movimentado nos arredores da cidade, e avistei Travis aguardando. Ele estava sério, como sempre, mas o brilho em seus olhos deixava claro que esperava um treino pesado. Passei a mão nas faixas nas mãos, ajustando-as antes de me posicionar.
— Pronta para mais um dia? — ele perguntou, com uma voz rouca de quem já gritou ordens e suportou mais batalhas do que eu poderia imaginar.
— Pronta pra mandar alguém para o chão. — Sorri de canto, porque, apesar da minha brincadeira, a verdade era que cada golpe que eu daria tinha um propósito real agora. Esse não era só um treino; era sobrevivência.
Ele assentiu e partimos direto para o sparring. Travis lançou o primeiro soco, um teste, e me desviei com rapidez. Lembro de pensar que talvez eu estivesse até mais ágil do que nas minhas primeiras aulas. Quando ele avançou de novo, dessa vez com um chute baixo, entrei na defesa e o surpreendi com um contra-ataque rápido, acertando-o de leve no abdômen.
— Nada mal — ele disse, dando um passo para trás. — Não é qualquer um que consegue rebater assim. Você tem um talento natural pra luta. Se tivesse escolhido outra vida, dava até pra ser agente.
Ri, mas, no fundo, a ideia nem parecia tão absurda. Sempre fui competitiva, e, naquele momento, essa habilidade parecia quase como um propósito.
— Talvez eu tenha nascido pra brigar — brinquei, enquanto ele se ajustava para a próxima rodada. — Além do mais, quando você luta com raiva, até a mira parece mais afiada.
Treinamos até o cansaço bater, mas, mesmo assim, mantive cada movimento preciso, cada soco carregado de força. Depois de um tempo, partimos para o treinamento com armas. Peguei a pistola, ajustei a postura e mirei no alvo distante, disparando com precisão. As balas se cravavam no centro do alvo uma a uma, cada disparo limpando um pouco da tensão acumulada.
Travis cruzou os braços, observando.
— Essa raiva que você fala, Nathalia... é o que te dá foco. Pode ser uma arma poderosa, mas perigosa também.
— Sei disso — respondi, soltando o cartucho da arma. — Mas é a única coisa que me deixa com a cabeça no lugar agora.
Ele apenas acenou em compreensão. Era a melhor resposta que ele poderia me dar. Sabia que Travis entendia o peso das minhas palavras, mesmo sem saber a verdade.
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Perdido ao sonho
Historical FictionQuando nos apegamos ao passado, o futuro promissor se obscurece sob o véu das lembranças, aprisionado entre os escombros do que já foi. É como se nossos sonhos, outrora radiantes e audaciosos, se perdessem na penumbra da nostalgia, enquanto nos enco...