Seguras até quando?

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Assim que terminei a última fatia de pizza, percebi o olhar delas – todas com aquela expressão assustada, quase de quem já tinha desistido de mim. Meu rosto doía, o corpo inteiro ardia como se eu tivesse carregado o peso do mundo nas costas, e dava para ver que elas estavam preocupadas. Especialmente Victória. Sua expressão era um misto de angústia e curiosidade, como se estivesse tentando juntar as peças de um quebra-cabeça complicado demais.

-- Eu sei que parece loucura, mas... deixa eu explicar -- comecei, respirando fundo para tentar organizar o caos que estava na minha cabeça. -- Depois que Erick foi preso, o delegado veio atrás de mim. Ele queria informações, saber de tudo o que eu sabia. Mas aí... bom, foi quando o passado daquele idiota apareceu de novo e invadiram o apartamento da Victória. -- Olhei para Victória, tentando não deixar que o peso da culpa transparecesse.

-- Por conta da morte do Erick? -- Ana Clara perguntou, com o cenho franzido.

Assenti. -- Exato. E depois disso, as ameaças começaram. O cartel achava que Victória estava envolvida, que ela sabia demais... E foi aí que eu tive que entrar no jogo. Eu precisava tirar o foco dela, proteger todos nós.

Victória apertou os lábios, quase tremendo. -- Mas por que você não me contou nada, Nathalia? Eu poderia ter te ajudado...

-- Porque era arriscado demais. Se eles descobrissem que você sabia algo, seria pior -- falei, sentindo a tensão se espalhar pelo corpo. -- Eu e Haylley decidimos começar com a lavagem de dinheiro para chamar a atenção deles. Sabíamos que se fizéssemos algo grandioso o suficiente, eles iriam morder a isca. E eles morderam. Logo depois disso, fiz uma aliança com o antigo advogado de Erick. -- Suspirei, lembrando da sensação amarga de firmar aquele pacto. -- O plano era ganhar a confiança do chefe, Juarez, para ter acesso a tudo. Depois, eu entregaria as informações para a inteligência internacional, para acabar com isso de uma vez por todas.

Hayley colocou a mão no meu ombro, interrompendo. -- A ideia nunca foi fácil, mas sabíamos dos riscos. Ela estava fazendo isso pra proteger vocês, pra proteger a família.

-- Mas... E se algo desse errado? -- Ana Clara perguntou, com a voz trêmula.

Engoli seco, sentindo o peso das palavras dela como um golpe. -- Eu sabia dos riscos, Ana Clara. Mas não conseguiria ficar de fora sabendo que vocês estariam em perigo. Que a minha família, que todos vocês estariam expostos. Não dava pra ficar parada. Até ontem, finalmente... consegui um encontro com Juarez. Ele mencionou uma possível aliança. Algo que, se tudo correr bem, vai nos dar o que precisamos pra acabar com essa história de uma vez.

Victória me encarou, seus olhos brilhando com uma mistura de choque e compreensão. -- Nathalia, você... você realmente fez tudo isso pra nos proteger?

Assenti, sem conseguir desviar o olhar. -- Eu faria de novo, se fosse necessário.

Respirei fundo, olhando cada uma delas. Sentia o peso das palavras que estava prestes a dizer, e elas pareciam entender que o que viria não seria fácil de ouvir.

-- Olha, agora vocês estão seguras -- comecei, tentando trazer alguma calma para o ambiente. -- O cartel não vai mais incomodar. Eles acreditam que eu estou do lado deles agora, e Juarez... Bom, eu fui bem clara com ele ontem. Fiz ele acreditar em mim. Tudo está em movimento.

Victória me observava com aquele olhar firme e profundo que só ela tinha, e isso quase fez meu coração vacilar.

-- Então... acabou? -- Ana Clara perguntou, ainda com um toque de desconfiança. -- Quer dizer, acabou mesmo?

Eu assenti devagar. -- Acabou para vocês, sim. Mas para mim, ainda não. Preciso que entendam uma coisa... -- Olhei para cada uma delas, esperando que pudessem aceitar o que estava por vir. -- Para esse plano dar certo, eu tive que criar uma outra... versão de mim mesma. Uma outra personalidade, uma Nathalia que... não é nada parecida com quem eu sou de verdade.

Perdido ao sonhoOnde histórias criam vida. Descubra agora