Destino

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14 de Julho de um Ano Qualquer

Oi, Vi. Como você está? Na nossa última ligação, você me disse que estava bem. Espero, do fundo do coração, que esteja mesmo. E que esteja feliz, muito feliz. Eu ainda estou morando na nossa antiga casa, caso você queira saber. Hoje é um dia especial, sabia? Era para a gente estar comemorando dez anos juntas. E também é meu aniversário de 32 anos. Confesso que é estranho celebrar sozinha, mas estou tentando. Amanhã vou para o Canadá. Será o último show da banda.

Estão todos aqui, mas falta você. Sempre vai faltar. Eu gostaria tanto que você me visitasse ainda esse ano. Quero saber como estão as coisas, como vai sua vida de atriz... Tenho escutado alguns rumores sobre você, e isso me fez querer escrever.

Lembro perfeitamente do dia em que você partiu. Antes de ir, você me beijou e, acariciando meus cabelos, pediu com tanta doçura: "Por favor, não deixe de ser quem você é por causa disso." Eu segurei essas palavras com força, tentando fazer delas meu escudo. Vi você ajeitar os cachos em um coque e dobrar a esquina. Naquele instante, soube que nunca mais poderia te tocar. Tentei sentir raiva, juro que tentei, mas era impossível. Eu não conseguia aceitar que você realmente havia ido. Mas, no fundo, eu sabia que precisava te deixar ir. Nós duas precisávamos.

Sua luz era tão intensa que você soube exatamente quando partir. Sabia que, se ficasse, meu coração, como areia movediça, acabaria te afundando. Hoje, entendo a sua escolha, entendo as nossas escolhas. Sei que seu lugar nunca foi aqui, mas, às vezes, fecho os olhos e me perco nos seus olhos claros, imaginando um mundo com mais pessoas como você. Pessoas que têm a coragem de partir, mesmo quando isso significa deixar para trás tudo o que construímos juntas.

Desculpa por tocar nesse assunto, eu sei que prometi não fazê-lo, mas não consegui evitar. Acabei lembrando quando ouvi falarem de nós. Ah, por falar nisso, conheci alguém. Não que você vá se importar, mas, enfim, ela tem uma pinta na perna, como aquela que você não deixava eu olhar, tocar, nada disso. Eu nunca entendi por que você não deixava. Achava aquela marca linda.

E você? Conheceu alguém? Aposto que sim. Já se passou tanto tempo desde... bem, desde que nos separamos. Como ela é? Não que eu me importe, claro, mas... Ela tem algum sinal como o meu? Ou será que ela tem a mesma voz suave? Cabelos parecidos, talvez? Não? Ah, tudo bem, normal... É difícil encontrar alguém parecido, eu sei. Mas, vai dizer, ela sabe contar piadas como eu? Não? Jura? Ah, quem precisa de alguém que conte piadas, afinal? Eu nunca fui boa nisso, mesmo.

Soube que você cortou o cabelo. Lembro como você odiava cabelos curtos. O que te fez mudar de ideia? Uma vez, pedi para você cortar e você disse que jamais faria isso, que odiava a ideia. Esse detalhe ficou gravado em mim, talvez porque eu tentasse me agarrar a qualquer coisa que fosse "nossa". A verdade é que, por mais que eu diga que não lembro, a sua presença está em cada canto da minha memória.

Eu sei que parece que estou exagerando, mas também lembro de como você escutava música francesa, mesmo sem entender uma palavra. Lembro do seu vício por chocolate branco e de como você não comia tomates porque os achava azedos demais. Por Deus, quem acha tomates azedos? Mas essas pequenas coisas... Elas ficaram comigo. Não consigo evitar, Vi. E não é que eu me importe com quem você está ou com o que faz, mas... Você conheceu alguém mesmo?

Vi, não importa o que aconteça, saiba que sempre vou carregar um pedaço de você comigo. Mesmo que eu tente esquecer, mesmo que eu me convença de que estou bem, ainda me pego olhando para o espaço vazio ao meu lado, imaginando como seria se você estivesse aqui, rindo das minhas piadas ruins e se irritando com minhas distrações.

Espero que a vida tenha sido gentil com você. E, quem sabe, um dia, você possa me visitar de novo, nem que seja só para rir das coisas que ainda nos fazem iguais. Eu ainda me importo, sabe? Sempre vou me importar.

Com carinho, 
Nath.

Perdido ao sonhoOnde histórias criam vida. Descubra agora