[𝐈]. 𝑸𝑼𝑨𝑵𝑫𝑶 𝑨 𝑫𝑶𝑹 𝑬 𝑨 𝑪𝑼𝑹𝑨 𝑷𝑨𝑹𝑬𝑪𝑬𝑴 𝑶 𝑴𝑬𝑺𝑴𝑶

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ISABELLE DEVERIA ESPERAR QUE ALGO como isso fosse acontecer no momento em que se permitisse tocar de verdade em seu luto, em sua dor. Nas primeiras horas de sua chegada em Marselha após um meticuloso planejamento, conseguiu se sustentar muito bem – apesar de estar apenas na companhia de Nico e não a de Noir –, fez uma reserva para dois em um hotel muito bem localizado e com uma vista lindíssima para o mar mediterrâneo.

Entretanto, em algum momento, tudo tinha ficado simplesmente demais para suportar – mais que o normal –, então, enquanto Nico tinha saído para explorar as barraquinhas dos vendedores em uma espécie de feira à céu aberto, contra sua própria vontade, Isabelle simplesmente desmoronou.

De repente, o conhecimento de que sua mãe e irmão foram brutalmente assassinados por um monstro marinho mandado por Poseidon bem diante de seus olhos pesou sobre ela, forçando para baixo seus joelhos, sua espinha, sua vontade de viver. Como se tivesse sido reduzida a uma marionete que perdera a utilidade para os shows seguintes e, portanto, sendo punida com suas cordas cortadas.

Isabelle ficou ali, jogada, com o corpo flácido e completamente imóvel. Estranhamente, nada doía. Nem dentro e nem fora. Só... nada. Era como se tivesse sido esvaziada de quem era, ou ao menos quem achava que era. Sabia que estava jogada contra o chão acarpetado, mas por mais que tentasse, não conseguia senti-lo.

Mais uma vez, estava suspensa no vazio. Só que dessa vez, não sabia se tinha como voltar disso, considerando que sentia como se sua alma estivesse sendo consumida naquele momento. Na verdade, quanto mais o tempo passava, mais tinha certeza de que não gostaria de voltar, quer dizer, como deveria lidar com toda essa tristeza? Com todo esse peso que parecia esmagá-la lentamente? Seria ao menos possível? Será se estava fadada a viver com isso por... dez? Quinze? Vinte anos? Não, não pode. Não conseguiria.

Querer continuar respirando ficava cada vez mais difícil.

Ainda jogada no chão, foi a mente de Isabelle que começou a flutuar, como se estivesse cheia de hélio, apenas segurada no lugar por uma fina cordinha.

"O luto é como um bombardeiro dando voltas e lançando suas bombas para atingir um raio de ação; o sofrimento físico é como a barragem fixa numa trincheira na Primeira Guerra Mundial, horas nela, sem uma pausa em momento algum. O pensamento nunca é estático; a dor muitas vezes é", aquela havia sido um trecho que lera no livro que ganhou do Shawn logo após a morte de Noah. Na época, achou um livro muito útil, uma leitura realmente proveitosa, mas agora, dadas às circunstâncias, talvez houvesse mais para se absorver do que inicialmente achou.

Nesse instante, era assim mesmo que Isabelle se sentia, constantemente bombardeada, presa em um sofrimento sem fim aparente, onde tudo o que se havia para sentir era uma dor cáustica, que machucava mais do que tudo, que envenenava o espírito.

E teria que viver assim o resto de sua vida? Não, de jeito nenhum.

De repente, o som de chaves sendo empurrada na fechadura foi audível e em segundos a porta foi aberta e a voz clara e animada de Nico ecoou.

Isabelle ainda permaneceu imóvel onde estava.

— Elle? Onde você está? Não ficou muito preocupada não, não é? Desculpa a demora, é que aquela feirinha estava muito interessante e- — o silêncio se fez presente por um momento, Isabelle brevemente desejou que Nico tivesse ido embora e a deixasse ali. — Elle, cadê você? Por que está tudo escuro?

Escuro? Com um piscar de olhos, Isabelle enfim se deu conta de que a luz do sol há muito já havia sumido, sendo substituída pela tênue luz da lua, que quase não entrava pelas janelas do recinto. Quanto tempo esteve deitada ali? Sem fazer nada?

𝐏𝐀𝐑𝐀 𝐎 𝐐𝐔𝐄 𝐄𝐑𝐀𝐌𝐎𝐒 𝐀𝐍𝐓𝐄𝐒 (𝐞 𝐭𝐮𝐝𝐨 𝐝𝐞𝐩𝐨𝐢𝐬)Onde histórias criam vida. Descubra agora