Capítulo 30

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Leah

* Flashback on *

Sangue. Sangue é tudo aquilo que consigo sentir. Os fios vermelhos escuros escorrem como uma cascata de água pela minha pele pálida, dando um contraste interessante.
Gotas de suor estão presentes na minha testa enquanto a sensação me consome todas as células do corpo, levando-me à constante loucura.

O que outrora era dor tornou-se em puro divertimento e um sorriso está presente na minha cara, recusando qualquer vestígio de lágrimas e de dor sobressair no meu olhar.
O mesmo não posso dizer da minha figura refletida no espelho. Neste encontram-se todas as marcas de agressões físicas, que se tornaram tão normais, tão reais, tão dolorosas, tão sujas, tão minhas que agora não encontram forma de querer sair e desaparecer da minha vida.

Voltei a espetar a lâmina, rasgando e perfurando cada centímetro da minha impura e suja pele, enquanto a água quente do chuveiro batia no meu corpo, levando cada angústia, cada sensação, cada lágrima que secou, cada medo, cada violação... ou assim esperava eu que fosse.

Desta vez seria a sério. Desta vez iria cortar tanto o meu corpo que ele acabaria por ceder, dando espaço ao espesso líquido vermelho de fluir livremente, esgotando cada gota e secando-me de uma vez.
Era isso que eu queria. Era isso que eu desejava. Desejava libertar-me e voar como uma borboleta pelo céu negro, tocando na Lua sempre que desejasse e tornar-me numa estrela, permanecendo brilhante e afastada de todo o mundo, descobrindo algo que, eventualmente, não me foi dado antes: amor, mesmo que este fosse apenas amor-próprio.

Era tudo o que eu queria... foi tudo o que eu não tive.

* Flashback off *

Sinto o meu corpo sobressaltar quando o toque da campainha soa e gotas de suor estão presentes na minha testa devido às lembranças de um passado que eu achava enterrado e esquecido no fundo do meu ser.

Inconscientemente olhei para a cama da Soph, vazia e desfeita desde a noite anterior. Pelo que percebi, a sua prima do Brasil fazia anos este fim-de-semana e ela viajou até à América do sul para a poder estar com a família que não via há bastantes anos. Isto é o mesmo que dizer que a casa é toda só para mim nestes dias, uma vez que ela não está cá e que o meu namorado trabalha, não tendo tempo para passar os dias comigo.

Pisco os olhos várias vezes para me habituar à luz que provém do lado de fora da janela, onde a Lua cheia ilumina toda a cidade, e a dor de cabeça começa a instalar-se devido ao incessante tocar da campainha. Decido então empurrar os cobertores para trás e iniciar a minha caminhada até à porta, que nunca antes me parecera tão grande e perturbadora.
Assim que coloco um pé descalço no chão frio da cozinha/sala os meus olhos direcionam-se para o gigantesco relógio de madeira que temos na parede, onde o ponteiro afixa as 4 da manhã certas e um certo desconforto apodera-se do meu corpo por alguém vir aqui tão tarde.

Tenho a plena noção de que o meu cabelo loiro está todo bagunçado, que os meus olhos estão inchados devidos às poucas horas de sono e que tenho um pijama ridículo do Rei Leão, mas mesmo assim abro a porta, enquanto esfrego os meus olhos com vestígios da minha sonolência.

A primeira coisa que vejo é um braço completamente desconhecido por mim encostado à parede, pronto para clicar de novo no estúpido botão. Levantei a minha cabeça e um rapaz por volta da minha idade, com cara de cansaço, olha para mim, deixando um leve sorriso. Os seus cabelos são ruivos e os seus olhos têm uma tonalidade interessante de azul.

Por momentos pensei que fosse um dos adolescentes dos pisos de cima, que costumam chegar tarde das festas, ficando muitas das vezes á entrada das portas dos apartamentos das outras pessoas por não conseguirem subir as escadas para chegar aos seus devidos quartos. Mas então os seus lábios vermelhos afirmam uma simples palavras, fazendo-me perceber que estou completamente errada.

Scream! - H.S [Em Pausa] Onde histórias criam vida. Descubra agora