- Pois fique sabendo que eu já estou enfrentando o mundo há muito tempo. Percebi o quão grande ele é, principalmente depois que nos separamos. A questão é que o tipo de mundo que enfrento é diferente do seu.
それから, E depois
Na aurora suave de uma sexta-feira radiante, despertei sob o insistente chamado do despertador, ecoando como um lembrete implacável da jornada que me aguardava na faculdade. Nessa cidade que eu considerava como meu lar, há quatro anos mergulhava nos estudos de psicologia na venerável Universidade Federal, situada nos domínios de Minas Gerais, Brasil.
Com passos ainda sonolentos, me entreguei ao ritual matinal, cuidando das minhas higienes com atenção. Diante do espelho, testemunhei a metamorfose do meu cabelo, do castanho ao quase loiro, sob a suave carícia de um raio de luz que se infiltrava pela cortina, como se a própria alvorada tecesse seus mistérios em meus fios.
Parti de casa rumo ao ponto de ônibus, onde quase deixei escapar a oportunidade de embarcar. Minha morada se erguia em uma cidade vizinha, apenas alguns minutos de viagem separam-me da majestosa capital. Nas manhãs como essa, permitia-me um instante de reflexão sobre a minha trajetória, questionando-me sobre a veracidade dos meus caminhos, sobre a essência dos meus anseios. Ao longo desses anos de escolhas, oscilava entre a incerteza e a confusão, mas sempre vislumbrava, no âmago, a chama de um desejo profundo, ainda que relutasse em aceitar sua natureza desafiadora. Não era simples admitir que o meu sonho se erguia diante de desafios imponentes, mas mesmo assim, em cada manhã, decidia-me a enfrentar a jornada com coragem e resiliência, pois sabia que ali, na busca incessante pelo que almejava, residia a verdadeira essência da minha alma.
Após imergir nas salas de aula da faculdade, enfrentando o tempo que parecia arrastar-se lentamente, decidi-me a partir. Mas, justo quando me preparava para deixar o recinto, meu telefone irrompeu em uma sinfonia de toques. Do outro lado da linha, encontrava-se minha confidente de longa data, a adorável Maria Eduarda. Nossa conexão transcendia o tempo, uma amizade forjada em laços tão profundos que nos tornávamos mais que amigas, éramos como irmãs de alma. Duda era a serenidade em meio aos tropeços da vida, um oásis de alegria em meio aos desertos de problemas. Em sua presença, a felicidade fluía em mim como um rio caudaloso, inundando cada canto do meu ser. Agradecia diariamente por tê-la ao meu lado, por ser a luz que guiava meus passos nos momentos sombrios e a chama que aquecia meu coração nos dias frios. E assim, entre risos e confidências, nossas conversas eram como danças frenéticas sob a luz da lua, cheias de nuances e brilho. Era como se o universo conspirasse a nosso favor, entrelaçando nossos destinos em uma teia de cumplicidade e afeto. Com Maria Eduarda, a vida se tornava uma jornada repleta de cores vibrantes e melodias encantadoras, onde cada momento era uma oportunidade de celebrar a magia da amizade verdadeira.
-- Se me ligou pra falar sobre a festa que vai ter hoje a noite, sinto muito mas vai ser em vão! - Atendi a ligação já desanimada.
-- Oi Nathalia, eu estou muito bem, e você? -- Duda disse de forma sarcástica e logo dei uma risada singela ao escutar sua voz. -- Infelizmente, hoje vou transformar a minha personalidade naquelas amizades toxicas e te informar que você é obrigada a ir!
-- Isso é insuportável, cadê o meu livre arbítrio? -- Questionei em um tom irônico.
-- Eu roubei! Agora me fala, que horas você vai passar pra me buscar? -- A mulher diz com a certeza de que eu de fato iria a festa.
-- As nove! E por favor esteja pronta. -- Disse com pouco animo e em seguida encerrando a ligação.
Eu era daquelas pessoas que viviam intensamente cada momento ao lado dos amigos, mergulhando de cabeça na energia vibrante dessa pequena cidade que, embora acolhedora, não era o meu verdadeiro lar, o meu porto seguro para um futuro promissor. Aqui, neste enclave de memórias, me sentia confortável, como se cada rua e cada esquina fossem laços que me prendiam ao passado, uma teia de lembranças entrelaçadas que me envolviam com ternura e nostalgia. Cada rua, cada esquina, cada pracinha... Cada pedacinho desse lugar guardava uma história, um capítulo do livro da minha vida que, por mais que eu tentasse, não podia simplesmente fechar e deixar para trás. Era uma ligação profunda, uma dança entre amor e saudade, entre os riscos assumidos e as memórias que ecoavam nos cantos mais íntimos do meu ser.
Contudo, mesmo imersa nessa atmosfera de familiaridade e afeto, pairava sobre mim a incerteza do porvir. Era como se cada suspiro fosse um dilema, cada pensamento uma encruzilhada a ser enfrentada. O que fazer? Que rumo tomar?
Quando falam sobre lar, algo dentro de mim ecoa. Aqui, nesta cidade onde cresci e me desenvolvi, experimentei todas as nuances da vida, desde a euforia das festas até a tristeza das despedidas. Aqui, entre essas ruas familiares, encontrava refúgio para expressar-me sem medo de julgamentos, sabendo que sempre haveria alguém para estender-me a mão nos momentos de solidão. Aprendi a desapegar-me do que já não me servia mais, a deixar para trás lembranças dolorosas e abraçar o novo com coragem. Mas agora, confrontada com a possibilidade de deixar para trás tudo o que construí, questionava-me se estava verdadeiramente pronta para isso. Aqui, onde a paz que semeava era retribuída em dobro, onde cada fardo carregado era também uma lição de vida, perguntava-me se tinha coragem de desatar os laços que me prendiam e partir em busca de novos horizontes.
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Perdido ao sonho
Historical FictionQuando nos apegamos ao passado, o futuro promissor se obscurece sob o véu das lembranças, aprisionado entre os escombros do que já foi. É como se nossos sonhos, outrora radiantes e audaciosos, se perdessem na penumbra da nostalgia, enquanto nos enco...