11h29min
O saguão do Aeroporto Internacional de San Francisco estava lotado. O vaivém de pessoas dificultava sua busca, mas ela ia encontrá-lo. Depois do que ele fizera por ela, ela não podia deixar de atendê-lo, e agora estava ali à procura do amigo. Ao passar por uma vitrine espelhada, sua atenção foi chamada para algo que não reparara antes, devido à urgência do chamado de Hakim. Conforme a sugestão que ele fizera, ela vestira uma calça jeans, uma camiseta do Los Angeles Lakers e um moletom com capuz. Além disso, usava um boné para esconder os cabelos crespos. Agora, avaliando o que as roupas, dois números acima do seu, fizeram com seu corpo, viu que suas formas femininas sumiram sob as roupas largas que trajava. – Devem achar que sou um homem – pensou, ao notar que os seios médios e os quadris levemente avantajados se tornaram imperceptíveis naqueles trajes.
Tal suspeita se confirmou segundos depois quando, ao prosseguir em sua busca, ela esbarrou num homem que reclamou: – Qual é, cara? Não olha por onde anda? – A inusitada situação provocou-lhe um sorriso que ofendeu o homem e o fez esbravejar: – Você está rindo da minha cara? Quero ver você rir quando eu acertar sua boca com um soco! – ele ameaçou, já avançando para ela.
Ao ver aquele brutamonte vindo em sua direção, ela girou o corpo e correu, misturando-se à multidão. Todavia, era difícil correr em meio à toda aquela gente sem esbarrar nas pessoas. Num desses momentos, quase topou numa mulher grávida, e isso a fez parar subitamente. Foi quando percebeu que perdera seu senso de direção. Com o coração disparado de pavor, ela sabia que não podia ficar ali parada. Precisava fugir, mas também não podia tomar qualquer rumo, senão poderia ir ao encontro do homem que a perseguia. Pensando nisso, tentou localizá-lo. Caso conseguisse, só precisaria correr na direção oposta. Bastou, porém, uma mão firme pousar soube seu ombro para sua esperança de fuga sucumbir. Seu primeiro ímpeto foi o de gritar, mas a voz falhou; depois pensou em se debater, porém, antes de fazer isso, uma voz a deixou confusa: – Por que demorou tanto?
Embora sua voz teimasse em não sair, a audição estava perfeita, e ela logo notou que aquela não era a voz de seu perseguidor. Virando-se para quem lhe falava, respirou aliviada, e uma vontade de rir tomou o lugar do medo. – Hakim?! – exclamou ela.
– Vamos logo! – disse ele, puxando-a pelo braço.
– Mas que trajes são esses? – ela indagou, enquanto observava o terno azul marinho, a peruca de cabelos lisos, os óculos escuros, a bengala e até a caneca que o outro trazia na mão.
– Foi o melhor que consegui. Ah, veja isto: até ganhei uns trocados, passando por cego – ele brincou, mostrando-lhe a caneca. – Agora, vamos sair logo daqui, pois Evan está em San Francisco e deve estar furioso neste momento.
– O que foi que você fez? E por que me chamou aqui?
– Assim que estivermos seguros, explicarei tudo.
Escritório do FBI – 11h39min
Bryan estava sentado na sala de interrogatório com os dedos tamborilando sobre a mesa, impaciente. Ele já havia frequentado aquela sala inúmeras vezes, mas sempre na condição de interrogador, nunca de interrogado. Desta vez, porém, seria diferente. Quando a porta da sala enfim se abriu, ele nem levantou a cabeça para ver quem era e foi logo falando: – Senhor, o que aconteceu hoje... – mas foi interrompido por uma voz feminina. – Calma, querido, a conversa será comigo.
Ao levantar a cabeça, Bryan mal acreditou em quem entrara na sala, tamanha era sua decepção. A mulher usava um conjunto vermelho, cujo comprimento médio deixava parte de suas pernas bem torneadas à mostra. Seus cabelos lisos, negros como azeviche, estavam presos num chamativo rabo de cavalo, e os olhos incrivelmente verdes só perdiam em destaque para o decote que, apesar de não ser ousado, parecia maior devido aos seios fartos. Era Sharon Smith, a mulher que ele mais tentava evitar nos últimos dias. – Era só o que me faltava! – lamentou-se.
– Não está feliz em me ver? – perguntou a mulher.
Bryan controlou-se para não ser grosseiro, embora seu semblante denunciasse que ela era a última pessoa que ele gostaria de ver naquele momento. Ela, no entanto, parecia não perceber o incômodo que provocava, ou talvez fingisse não perceber. – Qual é, Sharon? Onde está o diretor? – ele questionou, ajeitando-se na cadeira.
– Ele pediu que eu falasse com você primeiro, pois quer entender o que está acontecendo antes de tomar uma atitude.
– Ele mandou você me avaliar?
– Você acha estranho ele pedir isso depois do que você aprontou hoje? – ela se aproximou de Bryan, colocando a pasta que tinha nas mãos sobre a mesa. – Pois saiba que aquilo foi suficiente para puni-lo, mas ele tem consideração por você e por esse momento pelo qual você está passando. Por isso, quer sim uma avaliação do seu quadro emocional.
– Sou grato pela consideração dele, mas a última coisa de que preciso agora é ser avaliado por você – disse, carregando um tom de desdém na voz. Ignorando o comentário dele, Sharon apoiou os quadris na mesa e o fitou nos olhos. Logo a seguir, quebrou o silêncio: – Como eu disse antes, o diretor quer uma avaliação de seu quadro emocional, pois, na ótica dele, você passou a ser um risco não apenas para si mesmo, mas para os que estão à sua volta.
– Besteira! – retrucou ele, ligeiramente irritado. – O que aconteceu foi extremamente pessoal. Minha mãe poderia ter morrido pelo que Paul Miller fez. Eu apenas dei uma lição naquele desgraçado.
– Sim. Mas, ao fazer isso, você perdeu toda razão e abriu precedentes para o julgarem um risco ambulante! – disse, usando de um tom mais confiante, quase autoritário.
– Um risco ambulante!? Vocês acham que eu ia matar aquele porco?
– Você colocou uma arma na boca dele! – ela justificou. – Logo, isso já deixou de ser uma mera suposição.
– De onde você tira tanta certeza? – disparou ele, desafiando-a. – Você nem mesmo estava lá, Sharon.
– Mas diversas testemunhas estavam! – ela replicou.
– E nenhuma delas pode garantir que eu o mataria.
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Sagrada Maldade - Caçada aos Multiplicadores
Mystery / ThrillerEm 1975, num pobre vilarejo da Etiópia, dois misteriosos homens recrutam um jovem para uma enigmática e ambiciosa experiência. Porém, algo sai errado, e o resultado desse experimento é o maior vírus da história da humanidade. Quase quarenta anos dep...