Apesar do susto, Jerry guiou-se pelo som da voz e rapidamente encontrou Sharon. Ela estava ajoelhada debaixo de sua própria mesa e parecia procurar por algo.
– O que você faz aí embaixo? – perguntou Jerry.
– Perdi meu brinco.
Jerry mal ouviu a resposta, pois estava concentrado na bunda de Sharon, que naquela posição lhe oferecia uma visão privilegiada.
– Como sabia que era eu, estando aí embaixo da mesa? – ele disfarçou, enquanto seguia olhando.
– Reconheci você pelos sapatos – ela esclareceu. – E continuo curiosa para saber por que estava mexendo na minha mesa.
– Ia deixar um recado para você. Achei que não estava na sala.
– Mas estou. Então pode falar, porém aviso logo que, se o assunto for Bryan, eu não quero discutir sobre isso – advertiu.
– Nada disso, Sharon. Apenas vim avisar que o diretor deseja falar com você – os olhos dele não desgrudavam dos quadris dela.
– Obrigada. Mas agora pode me fazer um favor?
– Posso sim. Qual?
– Pare de olhar para minha bunda! – ordenou ela.
– E quem disse que eu estou olhando para sua bunda? – defendeu-se ele.
Nesse momento, Sharon ergueu-se, saindo debaixo da mesa. De imediato, ele desviou o olhar. Apoiando ambas as mãos sobre a mesa, ela olhou firme nos olhos dele.
– Diga que não estava olhando para minha bunda – ela o desafiou.
– Eu não estava olhando para a sua bunda – ele afirmou, tentando ser convincente.
– Está mentindo! – disparou ela, ainda o encarando nos olhos.
– Quer saber, Sharon? Eu não tenho tempo para jogos da verdade – desconversou. – Tenho de encontrar Vincent agora – ele girou o corpo, saindo da sala logo a seguir.
Quando chegou ao elevador, Jerry murmurou: – O diretor tinha razão. Ela sabe mesmo quando alguém está mentindo!
17h23min
Quando Evan concordou em contar sua história, a razão de sua motivação em assassinar o próprio pai, os olhos de George brilharam de curiosidade. Porém, Evan caiu num silêncio que já durava alguns minutos. Era como se estivesse tentando recapitular cada detalhe do que iria contar. E aquela espera estava torturando George. Apesar disso, ele decidiu respeitar o momento de seu subordinado.
– Quer uma bebida, Evan? – perguntou ele, tentando deixá-lo mais à vontade.
– Aceito, senhor – disse ele, finalmente quebrando o próprio silêncio.
No entanto, Evan não esperou ser servido para começar a falar: – O senhor admirava o seu pai?
– Claro que sim – afirmou George. – Tínhamos nossas diferenças, mas para mim ele sempre foi um modelo a ser seguido.
– Era exatamente assim que eu me sentia em relação ao meu pai, senhor – disse Evan, mostrando que a pergunta anterior fora uma mera introdução para sua história.
George manteve-se em silêncio, enquanto servia uma dose de uísque no minibar acoplado à estante ao lado de sua mesa. Ele esperava que Evan continuasse. E foi exatamente o que este fez. – Éramos uma família feliz – prosseguiu Evan. – Tínhamos um padrão de vida bem razoável, graças ao bom emprego que meu pai tinha, e minha mãe deixou de trabalhar para cuidar de nós, a quem ela chamava de "os dois homens de sua vida". Eu via meu pai como um herói, e tudo que queria era ser como ele quando eu crescesse.
– Mas o que aconteceu para que agora você o queira morto? – George alcançou o copo a Evan, notando que os olhos deste se turvaram ao ouvir sua pergunta.
Antes de respondê-la, Evan bebeu um gole de uísque só então disse: – Num determinado final de semana, minha mãe e eu viajamos para visitar minha avó. Meu pai não foi junto porque, segundo ele, um importante contrato com um cliente dependia de um projeto que precisava ser entregue no sábado. Entretanto, na metade do caminho, minha mãe desistiu da viagem, resolvendo que iríamos os três no próximo final de semana.
Apesar da raiva que George percebia na retina de Evan, este contava de maneira calma sua história. Isso deixava o general ainda mais angustiado. Tentando manter-se calado para ouvir o restante, ele levou o copo à boca.
– Eu quis ligar para meu pai para avisar que estávamos voltando, mas minha mãe me impediu, alegando querer fazer uma surpresa – prosseguiu Evan. – E essa foi a pior, ou melhor, sei lá, coisa que ela podia ter feito.
– Por quê? – questionou George, mudando de lugar e sentando-se na poltrona em frente a Evan.
– Porque foi nesse dia que descobrimos a farsa que meu pai era – Evan apertou o copo dando a entender que havia chegado o momento da revelação. – Quando chegamos à nossa casa, já era noite. Minha mãe abriu a porta de mansinho e encontrou as luzes apagadas. A única exceção era o feixe de luz sob a porta do quarto. Silenciosamente, largamos as malas no sofá e nos dirigimos ao quarto, valendo-nos apenas daquela tênue luz para nos guiar sem estragar a surpresa de nossa volta. Mas assim que minha mãe abriu a porta, eu pude ver nos seus olhos o horror que ela sentiu.
– Mas o que ela viu, afinal? – George não aguentava mais de tanta curiosidade.
– A coisa mais grotesca e nojenta que ela poderia ter visto na vida. O meu pai deitado, completamente nu, ao lado de outro homem, igualmente nu. Os dois estavam suados e pareciam ter pegado no sono há pouco tempo.
George, que naquele momento bebia um novo gole, quase engasgou com o que estava ouvindo.
– Minha mãe ficou estática, completamente sem ação – prosseguiu Evan. – Seus olhos eram uma mistura de descrença e nojo. E foi só aí que eu olhei para a cama, vendo a mesma nojeira que ela estava presenciando.
– Quer dizer que você e sua mãe pegaram seu pai na cama com outro homem?
– Isso mesmo, senhor.
A confirmação de Evan quase causou náusea em George. Ele agora começava a entender a razão pela qual seu subordinado odiava o próprio pai. Mas algo lhe dizia que ainda tinha mais a ser contado.
– E o que aconteceu? – George instigou Evan a falar mais.
– Minha mãe parecia muda. Era como se estivesse com um nó na garganta, até que de repente a amarra se rompeu, e um urro de fúria e dor brotou de seus lábios. Ela avançou sobre a cama, acordando ambos de forma abrupta e saiu agredindo meu pai. O outro homem se levantou e saiu juntando rapidamente as roupas para logo deixar o quarto.
– E seu pai? O que ele fez?
– Até hoje eu não sei o que aquele verme sentiu. Não sei se foi culpa ou vergonha. Mas tudo que ele fez foi proteger o rosto dos golpes e dos arranhões de minha mãe. Eu nunca a vira agir daquela maneira, senhor. Ela parecia um animal ferido e raivoso, que se lançava sobre o inimigo por não ter mais nada a perder.
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Sagrada Maldade - Caçada aos Multiplicadores
Mistério / SuspenseEm 1975, num pobre vilarejo da Etiópia, dois misteriosos homens recrutam um jovem para uma enigmática e ambiciosa experiência. Porém, algo sai errado, e o resultado desse experimento é o maior vírus da história da humanidade. Quase quarenta anos dep...