Capítulo 08 - Duplo Engano - Parte 4

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Num movimento brusco, Evan puxou o cinto contra si, prendendo-o de imediato. E movido de impaciência, acelerou o carro em direção à saída do estacionamento.

Hotel L.A. – 23h15min

Hakim não estava muito seguro do que pretendia fazer. A única coisa que sabia era que precisava fazer algo. Charlize ainda tentou persuadi-lo a desistir, mas foi em vão.

– Volto assim que puder – disse ele, já com a mão na maçaneta da porta. – Evite sair ou fazer ligações.

Ela aproximou-se dele e pegou em sua mão. – Prometa que vai tomar cuidado – disse de modo carinhoso.

– Eu prometo – replicou ele, desvencilhando-se com jeito da mão dela.

Quando fechou a porta atrás de si, Hakim suspirou. No íntimo, ele gostava da preocupação que Charlize demonstrava por ele. Os dois tinham se aproximado muito desde que ele a salvara, mas o vínculo entre eles não era apenas fruto de gratidão. A dor que ambos nutriam por sua situação em comum foi fundamental para essa aproximação. Por isso, Hakim já decidira: assim que aquela loucura acabasse, ele iria fazer a vontade de Charlize e ir embora para o Brasil. E essa visita que estava prestes a fazer poderia ser decisiva para isso. – Isso acaba essa noite, general – pensou ele, indo em direção ao elevador.

No quarto, Charlize ligou a TV. Buscava se distrair para não pensar no que Hakim iria fazer, mas não encontrou nada de seu interesse e desligou o aparelho. Com dificuldade para conter sua agitação, decidiu descer até o saguão. Sabia que Hakim reprovaria sua atitude, mas se justificou, pensando que teria cautela.

Enquanto esperava o elevador no corredor pouco iluminado do terceiro andar, Charlize observava as paredes com a pintura descascando. O fato era que o Hotel L.A. estava longe de ter o glamour dos grandes hotéis da cidade. Na verdade, ele servia de alternativa para os menos abastados quando visitavam Los Angeles. O descuido do estabelecimento ficou ainda mais evidente quando a porta do elevador se abriu, e um pequeno rato saiu por ela. Apavorada, Charlize levou a mão à boca para conter um grito e resolveu descer pela escada, praguejando: – Porcaria de hotel!

Ao chegar à recepção, ela se dirigiu ao recepcionista, um homem por volta dos trinta anos, e perguntou: – Tem acesso à internet aqui?

Ele, que folheava uma revista Playboy, sem a mínima vergonha, logo respondeu: – Primeira sala à direita – disse, sem tirar os olhos da revista.

Charlize agradeceu e rumou para a sala, onde havia dois computadores. Para sua sorte, nenhum deles estava sendo usado naquele momento, o que foi intimamente comemorado por ela, que não queria companhia. Ao sentar-se em frente ao computador, ela tinha apenas um objetivo: distração. Por isso, digitou o endereço de um site de fofoca. Mas, enquanto o site abria, lembrou-se de algo e digitou outro endereço, falando para si mesma: – Preciso atualizar meu cadastro.

23h22min

Quando Bryan parou o carro em frente ao bar frequentado por ele e Jerry toda sexta-feira ao fim do dia, o irmão já o aguardava, escorado no capô de seu próprio carro. – O que você descobriu? – questionou Bryan, descendo do carro.

– Vamos conversar lá dentro – respondeu Jerry, caminhando em direção à porta.

Como estava muito curioso, Bryan o seguiu sem protestar. Quando ambos entraram, viram que o lugar estava pouco movimentado. Jerry gostou disso, pois não queria interrupções, o que o levou a procurar uma mesa ainda mais ao fundo do salão. Ao chegar lá, logo se sentou, esperou Bryan fazer a mesma coisa, e indagou: – O que você fazia lá, Bryan?

– Lá onde?

– No velho depósito.

– Velho depósito? – desconversou Bryan. – Do que você está falando?

– Não se faça de besta. Eu sei que você esteve lá! – rebateu Jerry.

Mas antes que Bryan reagisse, uma garçonete, uma mulher rechonchuda, na casa dos quarenta anos, aproximou-se da mesa, trazendo uns petiscos e sorrindo: – O que vai ser hoje, rapazes?

– O mesmo de sempre, Aretha – respondeu Jerry.

Sempre animada e prestativa, Aretha cativava os frequentadores do bar com sua simpatia. Ela sabia o nome de todas as pessoas que costumavam frequentar o lugar, mas os agentes do FBI eram seus preferidos, pois sempre a tratavam com carinho e respeito. Por isso, percebendo que Bryan a ignorou, ela falou: – Sinto muito por seu irmão, Bryan.

Bryan estranhou o fato de Aretha já saber o que acontecera com Kevin, pois a notícia ainda não havia sido divulgada ainda; porém, seu interesse na conversa com Jerry era maior. Por isso, apenas agradeceu a solidariedade da garçonete. Quando ela deu as costas a ambos para ir buscar as bebidas, Bryan voltou a olhar para Jerry e perguntou: – O que o faz pensar que eu estive nesse lugar?

– Isto aqui me faz ter certeza de que você estava lá quando Vincent e eu chegamos! – disse Jerry, enquanto colocava sobre a mesa o celular de Bryan, que ele encontrara debaixo da folha de jornal, junto à cerca.

Distraído com tudo que acontecera no local, Bryan nem percebera a perda do aparelho. Agora, com a tentativa fracassada de negar que esteve no depósito, ele tratou de sair da posição de recuo, revidando: – Você sabe o que eu estava fazendo lá. Então se você me chamou aqui só para isso, eu já vou embora.

Bryan ameaçou se levantar, mas foi impedido por Jerry que segurou seu pulso e disse: – Sente aí. Ainda não acabamos aqui!

Bryan se preparou para reagir, mas como avistou Aretha trazendo as bebidas, preferiu se controlar. A garçonete serviu duas cervejas e se retirou, não sem antes dizer: – Se precisarem de mais alguma coisa, podem me chamar.

– Obrigado, Aretha – disseram ambos.

Ao ver que ela se distanciou, Bryan encarou Jerry: – Diga logo o que você quer!

– Quero saber o que você encontrou lá? – perguntou Jerry.

Cansado e sem a mínima vontade de continuar jogando, Bryan puxou o celular do irmão do bolso e também o colocou sobre a mesa. – Só achei isto aqui – disse.

– O celular de Kevin?

– Sim. Mas ouça isto.


Sagrada Maldade - Caçada aos MultiplicadoresOnde histórias criam vida. Descubra agora