Capítulo 02 - Dor e Raiva - Parte 2

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Beverly Hills – 03h55min

Mesmo preocupado à espera de notícias, seus olhos verdes já começavam a pesar, mas ele não podia dormir sem saber se sua ordem foi cumprida. Recostado em sua cadeira no escritório, ele mantinha o olhar fixo no telefone, que esperava tocar a qualquer momento. – Estranho! Será que já foi feito? – pensou.

Ao olhar o relógio, preocupou-se ainda mais, pois, se algo não fora feito, aquele dia poderia ser muito desastroso ao amanhecer. Coçou os olhos e levantou-se rumo ao bar, que mantinha ao lado da mesa de seu computador. Uma bebida o manteria alerta. No fundo do bar, havia um espelho, que dava a impressão de duplicar as garrafas e copos do balcão. Ele nunca fora vítima daquela ilusão de ótica, mas a imagem que via agora não lhe agradava nem um pouco. Ela refletia um homem abatido, cujo rosto trazia rugas que há alguns meses não estavam ali. Os olhos cercados de olheiras e a calvície recente davam-lhe a aparência de um homem bem mais velho. E isso não era resultado apenas do tempo, mas de uma força mais poderosa. A tristeza. Um sentimento que se hospedara naquela casa, sem data para partir.

Depois de se servir de uma dose generosa de vodca, ele dirigiu-se à janela, de onde olhou a piscina. Lembranças vieram à sua mente. Eram memórias de um tempo em que a casa vivia cheia, e a parte mais frequentada, ao menos nos verões, era justamente a piscina. O lugar fervilhava de alegria e festas; porém, tudo acabara. A casa ia vazia, muito mais do que ele gostaria. Há quase um ano, não ocorrera um único evento social sequer. Tudo mudara desde que ela partiu. Até mesmo morar em Beverly Hills já não tinha o mesmo glamour.

Uma forte rajada de vento invadiu o escritório, levando ao chão uns papéis e um porta-retrato, que estavam sobre a mesa. O impacto quebrou a moldura, deixando a foto solta sob os cacos de vidro. Largando o copo, ele ia pegá-la, mas o telefone tocou, fazendo-o deixá-la momentaneamente de lado. Essa ligação, pelo menos agora, era mais importante. – Alô! – disse ele.

– O coelho está na toca, senhor Banks – disse a voz do outro lado da linha.

Uma sensação de alívio tomou conta dele. Se havia alguma pedra no caminho, ela acabara de ser removida. E foi num tom de satisfação que respondeu: – Perfeito, Evan. Pode desligar. Falaremos dos detalhes amanhã.

– Sim, senhor – e o homem chamado Evan encerrou a ligação.

Mais tranquilo, ele voltou à foto caída no chão e a pegou, sacudindo-a para se livrar dos cacos. Na foto, uma loira de cabelos lisos sorria, o que destacava seus lábios carnudos e bem desenhados sob um olhar verde que irradiava o brilho de um momento feliz. Ao olhar para ela, o homem se emocionou, e seus olhos marejaram ao sussurrar: – Minha querida, quanta saudade!

Com a mão livre, ele impediu uma lágrima de rolar por seu rosto, mas não havia nada que estancasse a dor que jorrava dentro dele. Fazia meses que evitava até olhar aquela foto. Recentemente, porém, após iniciar seus planos, olhá-la não era tão difícil assim, de modo que até conseguiu falar com a imagem: – Estou fazendo tudo isso por você, meu amor.

Após guardar a foto na gaveta de sua mesa, ele decidiu dormir. A ansiada notícia fora recebida. Seus planos não sofreriam mais ameaças e poderiam alçar voos ainda maiores. Quando chegou ao quarto, tirou o roupão e deitou-se. Nisso, sua mulher murmurou: – Ate que enfim, George.

– Durma, minha querida. Já está tarde.


Sagrada Maldade - Caçada aos MultiplicadoresOnde histórias criam vida. Descubra agora