14h55min - Assim que chegou ao cemitério, Hakim pediu que Charlize aguardasse no carro. Sua intenção era fazer uma última visita ao túmulo de seus pais e depois seguir o plano dela de deixarem o país pela fronteira do México. Para isso, porém, Hakim teria de passar um tempo no confortável porta-malas de um Mustang 73 que Charlize havia alugado.
Andando rápido entre os túmulos, menos pelo receio de ser reconhecido naquele lugar geralmente ermo e mais pela pressa que tinha em fugir, Hakim mal notou que a alguns metros dali estava ocorrendo um funeral. E ele não teria dado importância alguma ao fato, caso duas pessoas ali presentes não tivessem chamado sua atenção. Ao reconhecer Anthony e Nora Giuliani, ele sentiu um arrepio subir-lhe a coluna por se dar conta de quem estava dentro daquele caixão. Foi também acometido por um sentimento de culpa pela morte de Kevin Giuliani. A força desse sentimento o fez diminuir o passo e perder-se em divagações que o distraíram de perceber, a alguns metros ao leste de onde estava, um outro par de olhos que também acompanhava atentamente o funeral de Kevin Giuliani.
Era Bryan quem estava escondido atrás de uma árvore e decidira que seria melhor sua mãe não vê-lo naquele momento tão doloroso. – É melhor assim – pensou ele, enquanto segurava uma foto que Nora tirara dele e do irmão quando eles tinham treze anos, e lembrava quantas vezes as pessoas os confundiram por serem gêmeos.
Bryan notou que havia muitas pessoas no enterro do irmão. Ele reconheceu alguns, como os colegas de trabalho, os amigos e o pessoal do FBI que resolvera acompanhar Jerry; outros, porém, ele simplesmente não sabia quem era. A despeito da circunstância, mentalmente agradeceu a Deus por toda aquela gente estar presente. Isso não deixava de ser um conforto para os pais, ao saberem o quanto o filho era querido.
Quando o pastor Phillip Hudgens terminou de falar, Robert Preston foi o primeiro a se aproximar do casal.– Sr. e Sra. Giuliani, o FBI deve muito ao seu filho – disse Robert. – Lamento muito por sua perda.
– Obrigado, Sr. Preston – falou Anthony, apertando-lhe a mão.
Nora não disse nada, estava emocionada demais, e Robert percebeu que ela estava lutando para segurar as lágrimas. Luta essa que ela perdeu assim que começaram a descer o caixão. Foi nesse momento que Jerry realmente se deu conta do significado da morte de Kevin. Até ali ele estava meio anestesiado a tudo que ocorrera; porém, ao ver o caixão descendo à terra e compreender que nunca mais voltaria a ver o irmão, todo o esforço que fizera para controlar suas emoções ruiu. As lágrimas tornaram-se inevitáveis, e Jerry chorou ao ponto de soluçar e precisar ser amparado por Sharon, que o abraçou com força.
Tão logo o caixão foi baixado, Hakim decidiu que era hora de ir. Não lhe restava outra coisa a não ser aprender a conviver com a culpa que sentia. Pesaroso, continuou a caminhar em direção ao túmulo dos pais; porém, quando se aproximou do local onde eles foram enterrados, o abatimento foi substituído por revolta. O que viu o deixou chocado: alguém havia violado o túmulo de seu pai. E a primeira pessoa que veio a sua cabeça foi George Banks.
– Maldito! – exclamou ele.
Sem perceber o tom alto de sua voz, Hakim acabou se denunciando. Um homem que estava próximo ao túmulo virou-se para ver quem praguejara ali e imediatamente o reconheceu.
– Eu conheço você! – gritou o homem. – É o cara da TV! O Hakim Alomar!
Apavorado, Hakim virou de costas e começou a caminhar apressado, enquanto o homem continuava gritando. Para azar de Hakim, aqueles gritos acabaram chamando a atenção de Bryan, e este ficou chocado ao ver do que se tratava. Reconhecer o rosto de Hakim Alomar foi algo instantâneo, e Bryan sentiu seu sangue ferver. Sacando sua arma, ele começou a correr na direção de Hakim, que nem havia notado sua presença até ouvi-lo gritar:
– Pare aí mesmo, seu desgraçado!
Hakim parou onde estava. Uma ligeira sensação de impotência o deixou inerte uns míseros segundos enquanto pensava no que fazer. Mas só uma coisa veio a sua cabeça no momento: correr. E foi o que ele fez. Saiu correndo por entre as árvores tentando se lembrar onde Charlize estava. Bryan não pensou duas vezes e atirou. O tiro explodiu o galho de uma das árvores após passar rente à cabeça de Hakim. Dominado pela fúria, Bryan não estava interessado em pegá-lo. Ele queria mesmo era matá-lo. Aquele disparo chamou a atenção de Jerry, que não só reconheceu o autor do tiro, mas também quem ele estava perseguindo, e saiu em disparada atrás do irmão para impedi-lo de fazer uma loucura.
– Não faça isso, Bryan! – gritou Jerry. – Precisamos dele vivo!
Àquela altura, Bryan não ouvia a nada nem a ninguém. Sua mente estava focada em apenas uma coisa: abater Hakim. Por isso, ignorando os gritos de Jerry, ele disparou mais duas vezes. Para sorte de Hakim, no entanto, as árvores e seu próprio movimento impediram Bryan de ajustar a mira, e este errou ambos os disparos.
Próxima ao local, a mulher havia acabado de tirar o macacão de coveiro que usara para violar o túmulo de Jamal Alomar e pensava em como encontrar o filho daquele homem, quando os três estampidos seguidos indicaram que alguém acabara de usar uma arma de fogo dentro do cemitério. Ela odiava armas de fogo. Achava-as deselegantes e que seu uso indicava certo grau de covardia, pois não permitia olhar nos olhos de seu inimigo no calor de uma batalha. Mas, movida pela curiosidade, resolveu caminhar na direção de onde vinham os tiros.
Quando finalmente localizou o autor dos disparos, ela observou que este parou de correr e firmou a arma com ambas as mãos, fazendo mira nas costas de um homem negro que corria mais adiante. Estranhamente, aquela cena não lhe provocou nenhuma reação, ao menos até o homem com a arma gritar:– Hora de morrer, Hakim Alomar!
Seus instintos se aguçaram quando ouviu aquele sobrenome. Era muita sorte a dela localizar o filho de Jamal justamente no dia em que violara seu túmulo. Porém, sua sorte estava prestes a mudar. Com sua visão aguçada, ela percebeu o dedo do homem começar a pressionar o gatilho. Hakim seria morto antes que ela concluísse sua missão.
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Sagrada Maldade - Caçada aos Multiplicadores
Misterio / SuspensoEm 1975, num pobre vilarejo da Etiópia, dois misteriosos homens recrutam um jovem para uma enigmática e ambiciosa experiência. Porém, algo sai errado, e o resultado desse experimento é o maior vírus da história da humanidade. Quase quarenta anos dep...