Capítulo 10 - Um Cadáver Inusitado - Parte 7

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Jerry estava completamente aturdido. Nunca em sua vida imaginara que um dia veria seu chefe dar uma demonstração pública de fragilidade. Mas, para sua surpresa, o homem mais frio que ele conhecera estava ali, diante dele, corroendo-se em culpa.

– O senhor não tinha como saber o que aconteceria aqui – Jerry tentou confortá-lo. – Além disso, o lance da família ainda é uma conjectura e, mesmo que ela tenha sido usada, pode ter sido através de um blefe. Pelo que percebemos, não estamos lidando com um amador. O assassino pode ter pego o Dr. Brooks como refém e mentido para ele que estava com sua família. Assim o forçaria a ajudar.

– Só tem uma forma de confirmar isso – disse Robert, puxando o celular do bolso. – Vou ligar para o telefone da filha dele agora – concluiu, deixando a sala.

Após o chefe sair, Vincent aproximou-se de Ricks e perguntou: – Sr. Ricks, importa-se em nos dar uma amostra de seu DNA?

– Por quê? Eu não o matei. Eu não o matei!

– Tenha calma – interveio Jerry. – Nós acreditamos em sua inocência, mas precisamos de uma amostra do seu DNA para comprová-la.

– Tudo bem. Mas façam isso rápido, por favor. Tudo que quero ir é para minha casa e esquecer esse pesadelo – disse ele.

E assim, enquanto Vincent tratava de colher uma amostra de saliva de Ricks, Jerry foi até o outro lado da sala e postou-se diante do cadáver de Kevin, ao qual cobriu reverentemente. – Prometo que vamos pegar seu assassino – sussurrou ele, emocionado.

Segundos depois, Robert entrou afobado na sala, bradando: – Você tinha razão de novo, Thompson. Foi apenas um blefe!

Jerry sobressaltou-se e caminhou em direção ao chefe, a quem indagou: – A família dele está bem?

– Sim, a filha está no trabalho, e a neta está na escola.

– Avisou a ela sobre a morte do pai?

– Ainda não. Não vou dar uma notícia dessas por telefone.

– Mas ela precisa saber.

– Sei disso, Thompson. E é por isso que vou viajar ainda hoje para Boston.

– Mas como ficam as investigações, senhor?

– Continua tudo na mesma – respondeu ele. – Ajude Morris a terminar aqui, e depois enviem tudo que encontrarem para análise. Eu volto em um ou dois dias no máximo. Ah, e avise a Sharon que ela não precisa mais vir aqui conversar com o Sr. Ricks.

Jerry olhou de relance para o cadáver do Dr. Brooks, antes de voltar a falar: – Mas, quanto à cadeia de comando... – e de repente interrompeu o que dizia; pois, ao se virar, percebeu que Robert já havia deixado a sala.

– Onde está o chefe? – questionou, olhando para Vincent.

– Não faço a mínima ideia – respondeu o colega, sem olhar para Jerry, entretido como estava, recolhendo a amostra de saliva de Ricks.

Jerry caminhou rápido até a porta, mas nem no corredor viu sinal algum do chefe. Ele correu ainda até o estacionamento, mas o carro de Robert já havia sumido. Quando se virou para voltar ao necrotério, seu telefone tocou. – Jerry falando – disse, ao atender.

– Onde você está?

– Aqui no estacionamento, Vince. Queria ver se achava o diretor.

– Esqueça o diretor – disse Vincent. – Preciso de ajuda aqui.

Hotel L.A. – 15h57min 

Charlize estava no banheiro, sentada na borda da banheira. Dali, ela observava Hakim, que estava deitado na cama e tremia de frio, mesmo com dois cobertores sobre ele. Horas atrás, ao abrir a porta do quarto onde ambos estavam hospedados, Charlize teve de ser rápida para amparar Hakim, que caiu sobre ela. Ao pôr os olhos na mancha de sangue na roupa dele, o susto foi substituído por medo, e ela imaginou que ele fora gravemente ferido. Entretanto, ao verificar melhor o ferimento, pôde constatar que era algo superficial.

Sem perder tempo, ela tratou de cuidar dele. O maior problema era a febre ardente que o consumia e parecia aumentar ainda mais. Com a ajuda de uma faca, ela cortou um saco de gelo conseguido com o recepcionista do hotel, despejou-o na banheira e ligou a torneira para enchê-la. O plano era resfriar a água o máximo possível, depois colocar Hakim ali por alguns minutos e torcer para que a febre cedesse.

A seguir, enquanto a água enchia aos poucos a banheira, Charlize foi até a cama para averiguar a situação de Hakim. Com cuidado, ela levantou o braço esquerdo dele para retirar o termômetro que colocara e tomou um susto ao ver que a temperatura medida era de 39,9ºC. Preocupada, ela puxou o lençol e constatou que o curativo que fizera no braço ferido surtira efeito. Hakim já não sangrava mais. Mas agora vinha a parte mais difícil, que era levá-lo à banheira. Ela tentou puxá-lo, mas não conseguiu, ele era muito pesado.

– Acorde! – disse ela, dando-lhe um leve tapa no rosto. – Você precisa me ajudar a levá-lo até a banheira.

Ele apenas gemeu, e ela insistiu: – Vamos, Hakim. Você tem de me ajudar.

– Jessica... – sussurrou ele.

Ela lhe aplicou um tapa mais forte. – Errou de nome! – esbravejou.

Hakim abriu os olhos, tentando focalizar a dona daquela voz. – Charlize?

Ela confirmou, meneando a cabeça.

– Onde estou? – perguntou ele, confuso.

– Você está seguro. Estamos no quarto do hotel.

– Não me sinto nada bem, Charlize.

– Nem poderia, você está ardendo em febre.

Sagrada Maldade - Caçada aos MultiplicadoresOnde histórias criam vida. Descubra agora