Capítulo 10 - Um Cadaver Inusitado - Parte 6

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Ricks desviou o olhar de Jerry por um momento e acabou fitando mais uma vez o cadáver do Dr. Jason Brooks. A sensação de náusea pareceu voltar no mesmo instante em que ele pôs os olhos naquele monte de carne distorcida que horas atrás era o rosto do legista. De imediato, ele tratou de virar o rosto para evitar aquela visão grotesca.

– Sr. Ricks! – chamou Jerry, tentando ganhar a atenção do homem. – Preciso que se concentre em mim, Sr. Ricks.

– Tudo... tudo bem... – balbuciou Ricks, olhando para o agente, mas percebendo o olhar acusador de Robert.

– O senhor lembra onde estava quando o Dr. Jason Brooks chegou ontem à noite?

– Eu estava aqui – respondeu ele, tentando evitar o olhar de Robert.

– E lembra que horas eram?

– Lembro sim. Era pouco mais de meia noite e trinta. O Dr. Brooks me pegou dormindo, e assim que acordei, olhei para o relógio.

– E o que aconteceu depois?

– O Dr. Jason me pediu para ajudá-lo a colocar o corpo de Kevin Giuliani na mesa para começar a autópsia.

– Mas a autópsia não aconteceu, Sr. Ricks. Por quê?

– Eu não sei.

– Como não sabe? – vociferou Robert. – Você é o assistente dele. Tem de saber!

Ignorando o arroubo de Robert, Jerry prosseguiu: – Tente se lembrar, Sr. Ricks.

– Tudo que sei é que o Dr. Brooks estava muito estranho.

– Como assim?

– Ele nem mesmo trocou de roupas e pediu para realizar a autópsia sozinho – esclareceu. – Além disso, estava mais nervoso que o habitual. Agia como se o tempo estivesse correndo contra ele. Eu até tentei conversar com ele, mas fui praticamente colocado para fora.

– O que acha disso, senhor? – Jerry dirigiu-se a Robert.

– Não vejo nada demais nisso. A pressa talvez se devesse ao meu pedido de urgência – respondeu Robert.

– Acho que não, senhor. Afinal, ele teria a noite toda para fazer a autópsia, visto que só falaria com o senhor hoje pela manhã.

Robert franziu o cenho, fixando o olhar no subordinado, ao dizer: – Faz sentido. Mas o que o estaria apressando então?

– É aí onde está o X da questão, senhor. Acho que não seria o que o estava apressando, mas sim quem o estava apressando.

– Você acha que alguém o estava pressionando?

– Sim. O assassino.

– Mas como?

– Sr. Ricks. Existe algum modo de entrar aqui sem passar pelas câmeras? – perguntou Jerry, ignorando a pergunta do chefe.

– Existe sim. Um corredor de acesso utilizado pelo pessoal da manutenção tem uma saída aqui em frente à porta de entrada.

– Onde o senhor estava na noite anterior, Sr. Ricks?

Robert não estava entendendo onde Jerry queria chegar. A linha de interrogatório seguida por ele fugia aos padrões. Mas resolveu não interferir.

– Eu estava aqui mesmo.

– Então a noite de ontem deveria ser sua noite de folga?

– Deveria sim, mas um colega me pediu para trocar de turno comigo porque queria fazer uma surpresa para a esposa numa data especial lá deles.

Imediatamente, Jerry se virou para Robert e concluiu: – Não foi ele.

– O que está dizendo, Thompson? – indagou Robert. – Isso não prova nada.

– Prova que, se ele estava aqui, não poderia ter matado Kevin – afirmou Jerry.

– Mas não prova que ele não poderia ter matado o Dr. Brooks – retrucou Robert.

– Discordo – insistiu Jerry. – Está claro que o assassino veio atrás de algo que pudesse incriminá-lo, e eu aposto que era alguma amostra de pele nas unhas de Kevin, daí sua mão ter sido decepada. E, se não foi Ricks quem matou Kevin, que motivos ele teria para matar o Dr. Brooks e arrancar a mão de Kevin?

Robert pareceu confuso ao ouvir aquilo. Ele sabia que era lógico o que Jerry dizia, mas algo em seu íntimo estava atrapalhando seu discernimento.

– Ei, pessoal. Venham aqui! – interrompeu Vincent. – Vejam isso! – disse ele, apontando para uma gaveta.

– O que é? – questionou Jerry.

– A confirmação de sua teoria – disse Vincent, pegando um pequeno saco plástico etiquetado. – Veja!

Jerry pegou a embalagem e leu a etiqueta que dizia: "Amostra de pele retirada das unhas de Kevin Giuliani. Protejam minha família."

– Deixe-me ver isso! – disse Robert, tomando a embalagem. – Oh meu Deus! – exclamou ele.

– Há mais um detalhe aqui, senhor. Olhe essas pegadas – disse Vincent, apontando para o chão. – O sentido delas só indica alguém entrando na sala. Não há sinal de saída.

– Você tem razão, Morris! – concordou Robert, seguindo a trilha delas até a porta.

– Mais uma coisa, senhor – falou Jerry. – Se o doutor teve tempo de coletar a amostra e deixar esse bilhete, ele poderia ter acusado o Ricks, caso fosse ele, mas a ausência de pistas sobre o assassino é mais um indicativo de que era um desconhecido.

Já na porta, Robert balançou a cabeça, concordando. Vendo-o de saída, Vincent perguntou: – Aonde o senhor vai?

– Preciso contatar a filha do Dr. Brooks – respondeu Preston. – Essa etiqueta me fez pensar que o assassino pode ter usado a família do doutor para fazê-lo cooperar – ao dizer isso, Robert paralisou. Uma expressão de medo e angústia tomou conta de seu rosto, sendo claramente percebida por seus subordinados.

– O que houve, senhor? – questionou Jerry.

Robert não respondeu de imediato, até que de repente reagiu de um modo que Jerry jamais esperaria. – É tudo minha culpa, Thompson – disse ele, levando as mãos ao rosto.

– Do que o senhor está falando?

– Você não entende, não é? Mas a verdade é que eu chamei meu amigo para a morte – explicou. – Ele estava de férias e eu o mandei voltar. E agora ele está morto. O pior é que a família dele pode estar morta também – falou Robert, com a voz carregada de pesar.


Sagrada Maldade - Caçada aos MultiplicadoresOnde histórias criam vida. Descubra agora