Capítulo 06 - O Primeiro Suspeito - Parte 2

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Diante disso, Jerry decidiu não questionar mais a punição imposta a Bryan. Mas algo ainda o incomodava, e indagou: – E quanto a Paul, senhor?

– No caso de Miller, é pura logística – disse Robert. – Estamos com problemas de efetivo, e abrir mão agora de dois bons agentes seria prejudicial demais aos nossos trabalhos.

– Mas o senhor tinha de colocá-lo justamente neste caso?

– E por que não? Apesar dos inúmeros defeitos, Miller é muito bom no que faz – respondeu Robert com tranquilidade.

– Ainda assim não acho justo – ponderou Jerry. – O modo como ele agiu na cena do crime, com total desrespeito pela vítima, foi o que deu início a essa confusão.

– Entendo seu ponto de vista. Mas acredite: trabalhar neste caso será um belo castigo para ele. E Miller ainda será avaliado pelo que fez. Pode ter certeza disso.

– Mas, senhor, eu ...

Mantendo a calma, Robert nem deixou Jerry concluir e inquiriu: – E você já se perguntou o porquê de sua presença nesta investigação?

Sem entender a razão da pergunta, Jerry fixou o olhar em Robert, esperando que este explicasse. E foi o que ele fez: – Como filho adotivo dos Giuliani, portanto, irmão de Kevin, você também não devia estar aqui, pois possui vínculo emocional com a vítima,

Conforme o protocolo, o diretor estava certo, e Jerry sabia disso. Ainda assim pretendia argumentar; porém, antes que o fizesse, Robert prosseguiu: – A única razão de sua presença no caso é que, diferente de Bryan, você tem equilíbrio. Você reparou que nem mesmo se referiu a Kevin como sendo seu irmão, instantes atrás?

– O que o senhor quer dizer com isso? – Jerry encarou Robert. – Por acaso pensa que não estou sentindo a morte dele?

– Não é isso! Embora esteja sentindo, você sabe separar as coisas – esclareceu Robert. – E já que coloquei Miller no caso, por que não quebrar mais uma regra e colocar você também? Afinal, posso confiar no seu equilíbrio emocional, certo?

– Claro que pode – afirmou Jerry, convicto.

– Então creio que já podemos continuar as investigações, não é mesmo?

– Pode esclarecer uma última dúvida, senhor?

– Seja rápido.

– Por que tanto interesse neste caso? – Jerry estava intrigado. – Desculpe, mas o senhor, que é sempre tão distante de tudo e de todos, nem de perto parece ser o ice...

Jerry freou a língua. Sabia que havia cometido uma gafe e torceu para o diretor não ter prestado atenção ao que ele quase acabara de falar.

– Eu nem pareço o iceberg que vocês estão acostumados a ver? – indagou Robert.

Jerry não soube o que dizer. Mais uma vez, Robert o surpreendeu. O diretor não só sabia como os agentes o chamavam na ausência dele, mas pareceu não ligar para isso.

– Desde quando o senhor sabe? – perguntou Jerry, incomodado com a situação.

– Sei disso há muito tempo. Mas não me importo, pois tenho meus motivos para agir e ser como sou – disse ele, de forma seca. – Quanto ao meu envolvimento neste caso, eu e o FBI devemos muito ao seu irmão. Kevin nos prestou um grande serviço ao levar a público toda a verdade acerca daquele infeliz episódio. Portanto, Thompson, que tal parar de perder tempo aqui e ir atrás do assassino de Kevin Giuliani?

– Vou agora mesmo, senhor – disse Jerry,deixando a sala.    

Mid-Wilshire – 14h48min

Logo que Bryan entrou no prédio onde o irmão morava, o porteiro, um baixinho bonachão, com cerca de 40 anos, dirigiu-se a ele: – Ei, Kevin,vai assistir aos Lakers hoje?

Ser confundido com o irmão era algo rotineiro para Bryan. Muitos amigos e até alguns parentes tinham dificuldade em distinguir um do outro. No entanto, naquele momento, a confusão foi para Bryan algo doloroso. Tudo por que sua memória fora ativada, levando-o às noites em que ele, Kevin e Jerry se sentavam à frente da TV para acompanharem os jogos dos Lakers. Eram noites em que risadas, palavrões, cervejas, pizzas e diversão não faltavam.

Instantes depois, Bryan já estava no elevador, rumo ao terceiro andar, deixando o porteiro sem resposta. Imerso em pensamentos, ele mal notou a porta do elevador se abrir. Só quando ela parou com um pequeno ruído, foi que ele se viu retirado de suas reminiscências, e sentiu-se tão vazio quanto o corredor diante de si. Ao dar o primeiro passo para sair, porém, esbarrou num negro, que surgiu do nada e assustou-se ao por os olhos em Bryan.

– Ei amigo, cuidado! – disse Bryan, enquanto via o homem entrar apressado no elevador e apertar o botão que indicava o térreo. Durante os segundos em que a porta mais uma vez se fechava, os olhos do outro não desgrudavam de Bryan. Sem entender nada, este limitou-se a observar até que a porta se fechar por completo.

Cara estranho. Nem se desculpou – pensou Bryan.

Porém, como o que o levara até ali era mais importante, Bryan tratou logo de se dirigir ao apartamento do irmão. Já em frente ao número 304, ele respirou fundo, preparando-se para entrar naquele ambiente de tantas memórias. Depois, certificou-se de que o corredor estava realmente vazio e só então introduziu uma chave na fechadura. Entretanto, para sua surpresa, ao tentar girar a chave, a porta começou a se abrir diante dele.

Suspeitando que havia alguém ali, Bryan sacou sua arma e lentamente abriu o restante da porta. Após espiar toda a sala, ele foi verificar os outros cômodos. Primeiro, dirigiu-se ao quarto, depois ao banheiro e, por último, a cozinha, mas não encontrou ninguém. Quando retornou à sala, Bryan pôs-se de novo a observar o ambiente, não mais procurando uma pessoa, e sim evidências de que alguém, de fato, estivera ali. Após escrutinar o lugar, ele concluiu que tudo estava em ordem. Não havia, ao menos ali, nenhum objeto fora do lugar, nem móvel algum cuja gaveta sequer estivesse meio aberta. Nenhum vestígio de invasão. Porém, ainda faltava averiguar com o mesmo critério os outros ambientes do apartamento.


Sagrada Maldade - Caçada aos MultiplicadoresOnde histórias criam vida. Descubra agora