Capítulo 09 - Alta Tensão - Parte 6

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Enquanto isso, no escritório, George verificava o ferimento em seu antebraço. Para sua sorte, o tiro o atingira de raspão, pegando apenas a camada superficial da pele. A ferida mais grave fora no seu orgulho. George não conseguia evitar a sensação de humilhação. Ele, um ex-general do exército americano, com experiência de guerra, tivera o inimigo de costas, sob sua mira, mas não só não conseguiu abatê-lo como foi surpreendido por ele.

Como pude errar aquele tiro? – pensou, enquanto se servia de uma dose de uísque. Em seguida, com o copo na mão, George foi até a janela, onde se pôs a observar o portão de entrada da mansão, torcendo que seus olhos vissem quando um dos seguranças entrasse por ali, arrastando Hakim rumo à sentença que ele mesmo teria imenso prazer em executar. Mas foi só sentir o gosto amargo da bebida, queimando sua garganta, para que sua esperança se desfizesse. No fundo, ele sabia que seus homens voltariam de mãos abanando. Pessimista, George derramou o restante do uísque sobre seu ferimento.

– Merda! – praguejou, devido à ardência provocada pela bebida. Depois, voltou ao minibar, onde pegou uma garrafa a qual levou consigo para a poltrona onde passaria a noite, que pelo visto seria longa e tão amarga quanto a bebida que lhe descia goela abaixo.

Necrotério – 00h48min

Os olhos de Evan percorreram todo o ambiente, observando cada detalhe daquela sala. Entretanto, nada chamou mais sua atenção do que as gavetas onde se encontravam os corpos. Evan sabia que o corpo que ele procurava já não estava mais num daqueles compartimentos, apesar disso deteve-se diante das gavetas num momento de breve digressão. – Então é aqui que todos eles terminam? – pensou.

O cadáver de Kevin Giuliani já se encontrava posto em uma das mesas onde se realizavam as autópsias. E tão logo Evan desviou o olhar para lá, seus olhos se fixaram no homem que há quase um dia foi sua vítima. Decidiu aproximar-se mais; no entanto, ao dar o primeiro passo para ir até onde o corpo estava, tropeçou em algo, quase perdendo o equilíbrio.

– Olhe você aí – murmurou Evan, olhando com satisfação para o corpo imóvel do Dr. Jason Brooks. – Finalmente fiz você calar essa boca, seu velho arrogante!

Minutos atrás, temendo por sua família, o Dr. Brooks deu um jeito de colocar Evan dentro do necrotério. Para isso, utilizou-se de uma porta nos fundos do prédio, onde o sistema de monitoramento não cobria. E assim que ambos chegaram à sala principal do necrotério, Evan desferiu uma coronhada na nuca de Jason, que imediatamente caiu desmaiado ao chão. – Eu cuido de você depois, doutor. Agora tenho um trabalho a fazer – disse Evan, indo em direção ao corpo de Kevin.

Evan não imaginava, porém, que o ambiente do necrotério, que aquela geladeira de corpos o faria sentir-se tão estranhamente desconfortável. Sensação intensificada ao se aproximar do corpo pálido e sem vida de Kevin, quando um calafrio percorreu seu próprio corpo. Foi então que se lembrou do dia em que George lhe deu a ordem de matar o jornalista. O encontro ocorrera uma semana antes na mansão do general, quando Evan foi recepcionado pelo chefe com um estranho pedido, tão logo adentrou no escritório dele. – Preciso que elimine este repórter! – disse George, entregando-lhe um envelope.

– Um repórter? Ele está na lista? – inquiriu Evan, olhando atentamente para uma foto retirada do envelope.

– Não. Mas ainda assim preciso que você o elimine o mais rápido possível.

Evan, que estava de pé em frente à mesa do chefe, sentou-se devagar enquanto perguntava: – Por que quer esse homem morto, senhor? Ele descobriu algo sobre o que estamos fazendo?

– Não. Ou melhor, ainda não – respondeu George, intranquilo.

– Como assim? – Evan pareceu confuso. – Ele está investigando?

– Talvez – George levou a mão ao queixo. – Fui informado que ele se encontrou com o verme maldito dias atrás.

– O senhor está querendo dizer que esse jornalista se encontrou com Hakim?

– Exatamente! – exclamou George. – Percebe o risco?

– É um risco questionável, senhor.

George calou-se por alguns segundos, tentando decifrar o que Evan queria dizer com aquilo. Mas como não concluiu nada, dirigiu-se firmemente ao subordinado: – Explique.

– Nenhum repórter do mundo iria acreditar na história de Hakim – afirmou Evan.

– O que o faz pensar assim? – questionou George.

– Estamos falando de um homem negro com uma história que, sem provas, seria apenas mirabolante para quem quer que a ouvisse – explicou Evan. – Então que repórter acreditaria nele ao acusar um ex-general dos Estados Unidos, altamente condecorado por serviços prestados a pátria?

George gostava da forma fria como Evan conseguia analisar certas situações. Porém, naquele caso específico, ele precisava estar certo de que o risco, por mínimo que fosse, seria eliminado; portanto, redarguiu: – Eu até concordaria com você se não houvesse um fator complicador. Esse cara é bom. E ele já desvendou algumas histórias mirabolantes.

– Então precisa mesmo ser eliminado? – indagou Evan, mostrando-se contrariado.

George percebeu no olhar de Evan que ele não estava confortável com a missão da qual foi incumbido e perguntou-lhe: – Algum problema, Evan?

– Não estou muito à vontade em ter de matar esse jornalista.

– Posso saber a razão?  

Sem rodeios, Evan respondeu: – Ele não se encaixa nos meus propósitos, senhor. Quando topei participar dessa limpeza, uma das perguntas que o senhor me fez foi sobre a minha disposição em matar, se fosse necessário. O senhor se lembra disso?

– Claro que eu me lembro – respondeu George. – Você me disse que não teria problema algum em matar, desde que a vítima fosse uma praga ou uma aberração.

– Isso mesmo. E é aí que está o problema em relação a esse jornalista – falou Evan. – O senhor disse que ele não está na lista, portanto ele não é uma praga, certo?

– Deixe-me ver se eu entendi – George encarou Evan diretamente nos olhos. – Você está com receio de matar o jornalista, porque ele não se encaixa no perfil inicial de nossos alvos? Isso é uma demonstração de escrúpulo? – George não conteve um sorriso, como se não acreditasse no que acabara de ouvir.

– Sei que isso pode soar como hipocrisia, senhor. Mas é assim que eu me sinto – disse Evan, mantendo um ar de seriedade. – Além disso, o senhor tem outros homens que podem fazer o serviço.

George continuou encarando Evan nos olhos quando, de repente, levou as mãos à nuca e recostou-se na cadeira. – Pode deixar o escrúpulo de lado, Evan – o general sorriu maliciosamente. – O jornalista está no perfil.

– Como assim, senhor? Se ele não está na lista...

– Ele é gay, Evan! – disparou George. 

Sagrada Maldade - Caçada aos MultiplicadoresOnde histórias criam vida. Descubra agora