7- Realidade

1.8K 235 359
                                    

                              Dora

Um grito seco sai da minha garganta, as batidas descompassadas do meu coração, retumbam nos meus ouvidos, e o desespero do pesadelo que tive, me mantém paralisada.

 Conto um... dois... três... um… dois… três, para me acalmar e organizar os pensamentos. Meu cérebro ordena, e com esforço, abro os olhos lentamente. Eles acostumam-se à escuridão do ambiente, mexo os pés e as pernas, abro e fecho as mãos, e gradualmente assumo o controle total do meu corpo. 

 Minha garganta dói, ela está seca, tal como se eu tivesse andado por dias num deserto. Sento e coloco as pernas para fora da cama. Ouço o tic-tac do relógio em algum lugar, acendo o abajur e uma luz fraca ilumina o ambiente. Meu olhar recai sobre uma jarra com água e um copo que estão sobre o criado-mudo, bebo toda água e se tivesse mais eu beberia. 

 Uma carga encontra-se sobre meus ombros. Fatalmente uma lágrima escorre. Eu pensei; juro que pensei, que os malditos pesadelos haviam acabado. Há tempos que não os tenho. E justo agora que nos mudamos, começo com a mesma loucura de sempre. 

 Levanto da cama de pernas bambas, e com passos lentos e pesados chego ao banheiro. Ao acender a luz, seguro um grito de horror ao ver minha imagem refletida no espelho. Parece que fui atropelada por um caminhão, com a diferença de que não há machucados pelo meu corpo. Mas, meus cabelos acham-se embolados, os lábios ressequidos, a pele pegajosa e o aroma desagradável que exalo, lembram um atropelamento, ou, uma louca de pedra. 

 Suspiro desanimada, e com movimentos arrastados coloco a banheira para encher. Tiro a camisola empapada de suor. Sento-me no chão com as pernas dobradas, as enlaço, e não me importo com o frio que sinto, somente observo entorpecida o movimento da água que sobe de nível. 

 Desligo a torneira e entro na banheira sem me importar com a temperatura, me deito e fico submersa. Minha intenção não é me matar, é protestar pelos anos de sofrimento e pelo homem que sempre aparece nos meus sonhos e nunca vejo o rosto. E quando o fôlego me falta, volto à tona. Meu protesto não adiantou de nada, eu continuo a mesma Dora de sempre.

 Tomo banho, aproveito para esfregar meu corpo como se a esponja fosse capaz de remover a angústia que aperta meu coração, mas me esfregar não adianta nada também. Só há uma coisa que me fará sair dessa letargia, e, é pensando nisso que saio rapidamente da banheira, seco meu cabelo, coloco uma calça de moletom e uma blusa de mangas curtas, calço pantufas e sigo rumo à porta. Só então penso no que aconteceu comigo, contudo deixo as questões para depois, e concentro-me em descer os degraus que rangem mesmo que eu pise de leve neles. Por fim chego no segundo andar e paro no corredor, fico indecisa se bato ou não na porta do quarto de Nathan.

 Crio coragem e dou dois toques para anunciar minha presença. Como não há resposta giro a maçaneta e entro no cômodo que está à meia-luz, me aproximo e ajoelho ao lado da cama. O sótão está perfeitamente arrumado. Imagino que tenha sido Nathan quem o arrumou, por isso ele deve estar cansado, e apesar de suas feições estarem tranquilas, ainda assim, não é justo acordá-lo quando precisa descansar. 

 Acaricio seus cabelos de leve, anseio sentir a textura deles na minha mão, porém temo uma reprimenda. Não sei nomear o que sinto, talvez carência, mas o fato é que, toda vez que tenho pesadelos, desejo me refugiar nos braços de Nathan. Eles são eficazes e me mantém segura, porém nunca me entrego totalmente, pois minha mente condena minha atitude. 

 Contrario minha consciência, quando ela diz para me afastar, e o contemplo em toda sua beleza. Deslizo o dorso dos dedos pelo seu rosto, sinto os pelos da sua barba, imagino a sensação dela, no meu rosto e... Nathan se mexe, fala meu nome e muda de posição, me assusto e com medo dele acordar saio apressada do quarto. 

ENTRE A VIDA E A MORTE - LIVRO 1 (Concluído)Onde histórias criam vida. Descubra agora