Dora
Faltou pouco para eu ter um domingo perfeito. Adorei encontrar e conversar com Rick, esclarecer alguns pontos para Jules e Nathan, começar a andar com os próprios pés, e ter um almoço e jantar agradável na companhia da tia Sophia. O desagradável foi que quando todos foram dormir, eu fiquei vagando pela casa como um zumbi.
A madrugada chegou e passou lentamente. Tentei me concentrar na história de uma protagonista chamada Heva, mas não consegui, então, resolvi fazer o chá relaxante que a tia Sophia me recomendou para aliviar o estresse. Porém, eu que já não estava tranquila, pasmei com a visão de Nathan curvado sobre a ilha da cozinha, e assim estou até agora.
O que tenho diante de mim, é a imagem de um ser etéreo e não ouso me mexer, ou falar para não perturbá-lo. Quero conservar a cena insólita na minha mente, mesmo que ela carregue uma certa melancolia, pois Nathan declama o salmo noventa e um. Pergunto-me o que ocorreu, pois, ele só faz isso nas horas de aflição.
Nathan segue alheio a minha presença, deixo que termine sua oração, ele não percebe que entrei na cozinha, até que o chamo "tio Nathan". As palavras arranham minha garganta, não sei porquê as pronunciei, mas acredito que é uma maneira de me lembrar que não devo pensar nele como homem. E que homem!
Jules me contou que ele viajará a trabalho. Não recebi bem a notícia, mas, não toco no assunto, pois a palavra com que me chamou, o olhar, a voz direcionada a mim de uma maneira nada comum, direciona meus pensamentos para outro nível que não o casto. Nem tenho ideia do que faço, unicamente sinto, e em alguns momentos noto um Nathan que se desprende da armadura habitual. Eu me solto também, mas a liberdade dura pouco, e ele foge como sempre faz.
As coisas nunca acontecem como desejamos.
***
Troquei o pijama por uma roupa de corrida, e desde então espero Nathan no hall. Desgostosa com sua demora, resolvo chamá-lo, mas para minha surpresa, ele desce a escada despreocupadamente. Estremeço ao vê-lo, eu toda equipada com roupas de frio e ele um pouco mais coberto que antes, mas não ajuda muito, por a camisa ser tão grudada no corpo que se assemelha a uma segunda pele. Meu Deus! Porque esse homem não colabora comigo?!— Você não sente frio, Nathan? Em casa está quente, mas lá fora é diferente. — aviso.
— Não sou friorento, e, não estou com febre, Moranguinho. Obrigado pela preocupação.
Dou-lhe uma olhadela, e não digo nada, sei que fala assim porque meu shampoo tem o aroma, e eu simplesmente amo tudo que vem dessa fruta, e ele também gosta, da geleia principalmente.
Nathan sorri misteriosamente. Parece que seu humor mudou. Eu o sigo até os fundos da casa sem comentar sobre sua repentina mudança, ele se movimenta lentamente e entra numa trilha em meio às árvores do quintal. Sua falta de comunicação me leva a questionar sobre o que me incomoda.
— Nathan... posso te fazer uma pergunta? — responde com "você já fez". — Você sempre calculou suas respostas e decisões, fez uma tatuagem enorme e tenho a impressão de que ao chegar em Melekler, um novo homem surgiu. Ela vale todo seu esforço?
Após dizer e perguntar o que quis, sou assolada por uma incerteza quanto a sua resposta. E se ele mudou mesmo por uma garota?
— Uau! Não sabia estar sendo vigiado! — Passa a mão pelos cabelos que se revoltam mais do que já estão — Eu não mudei, continuo o mesmo, o fato de ser calculista não quer dizer que não tenha sentimentos — Andamos lado a lado, e sem me olhar ele pergunta — O que você quis dizer sobre valer o esforço?
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ENTRE A VIDA E A MORTE - LIVRO 1 (Concluído)
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