Capítulo 5

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— Padre, me perdoe. Eu pequei. — Essas foram as primeiras palavras proferidas no velho confessionário por Susan Carter. — Na verdade, Padre Joshua, eu gostaria de conversar com o senhor.

O padre hesitou  por uns instantes, observando a figura da mulher através das pequenas brechas do confessionário. Ter gostado daquele beijo era algo difícil de admitir, e ele jamais faria isso.

— Tudo bem. — Joshua cedeu, saindo do confessionário e assumindo uma postura impecável por trás da batina.

— Me desculpe pelo ocorrido daquela noite, não tive forças para vir até aqui desde então. Creio que meu relacionamento como devota e cristã não tenha que ser prejudicado por isso. Jamais irá se repetir. — Ela confessou, duvidando de sua última frase.

— Sem problemas, filha. Dez Ave Maria e quinze Pai Nosso. Como está o senhor prefeito? — Joshua pôs o seu melhor sorriso, ignorando a sensação estranha que ficar perto dessa mulher em especial lhe causava.

— Bem, eu e ele estamos distantes. Robert está sempre tão ocupado com os afazeres na prefeitura. Nem sequer me procura mais. Não temos um bom relacionamento de marido e mulher. Eu sei que ele está me traindo, mas ainda não descobri com quem. — Susan suspirou fundo e observou as velas e imagens presentes na igreja.

— Sinto muito por isso. Talvez seja mesmo os afazeres com a prefeitura. Seu marido te ama, jamais faria algo assim. Vocês são um exemplo para todos em Lovedale. — Padre Joshua continuou caminhando lado a lado com a sua devota mais fiel.

— Padre, nós mulheres da elite de Lovedale temos uma pequena reunião amanhã à tarde. Gostaria de nos agraciar como uma ilustre visita e uma reza? Nos envolvemos sempre em causas sociais, estaremos dispostas a ajudar a igreja e os menos favorecidos.

— Claro. Será uma tarde proveitosa, adoro boas companhias e estou feliz em vir para cá. Temos muita coisa pela frente, muita coisa para mudar nesta cidade. — Os dois encararam as ruas com crianças brincando, idosas fazendo tricô e o carrinho de sorvete com seu som melodioso de infância.

  Ah, doce Lovedale. O quão saborosa será o gosto amargo da verdade por trás de seu véu de hipocrisia?

[...]

Eros observava boquiaberto o corpo da estranha criatura que havia revelado coisas sobre sua estadia na inocente cidade.

— Papai, eu conheço essa mulher! Essa senhora falou hoje cedo que nós dois iríamos trazer o caos para essa cidade. Era apenas o começo de algo maior do que nós. — Ele apressou-se a dizer, enquanto Ares passava os dedos em sua barba rala.

— Certo. Certo. Não fique tão eufórico. Deixe que os mortais cuidem disso. Eros, não se meta com eles. Não se envolva nos problemas deles. Essa velha deve ser mais uma que não cuida da própria vida. Deixe esse assunto comigo.  — Com as ordens do deus da guerra, os funcionários retiraram o corpo e acionaram a polícia local.

— Tudo bem. — Eros se recompôs, parando somente agora para investigar o que seu pai estava fazendo.

— Papai, por que realmente está aqui? Em quais negócios irá se envolver desta vez? — Seus olhos tempestuosos encaravam seu pai que pareceu ceder aos poucos.

— Tenho planos para construção civil e advocacia. Irei repaginar essa cidade. Dar um upgrade nesse lugar tão caidinho. Está um tédio cuidar apenas de caos e guerras. Pelo menos, não agora. Tenho planos majestosos. — O deus ficou pensativo e no fundo, seu filho conhecia aquele olhar.

— Daqui a pouco a mamãe vai vir morar aqui também e colocar uma boutique. "Casa dos Prazeres da Afrodite, ligue 555- 699" — os dois sorriram e Ares bagunçou o cabelo bem penteado de seu filho. Isso era o mais perto que Eros chegaria de um carinho paterno.

— Não seria nada mal. Mas, acho que ela já está cuidando do próprio prazer pessoal. Aquela mulher nunca para de trabalhar, suas folgas, envolvem mais trabalho. — Ares sorriu sem mostrar os dentes e pôs a mão na nuca, exibindo momentaneamente um pouco de cansaço. — Nós merecemos algo melhor do que isso. Pena ninguém reconhece meu valor. Tenho uma relação difícil com o meu pai.

— Que coincidência... — Eros sussurrou, chutando uma pedrinha que estava no caminho.

— Bem, agora vá embora. Tenho que tratar de negócios. Vá se divertir com esses humanos fúteis, eles são iguais a você. — Ares assumiu a mesma postura de sempre, odiava ter seu coração amolecido por Eros. Dispensando o filho, ele voltou para seus afazeres.

Eros saiu de lá com várias perguntas não respondidas. Aquela não era apenas uma coincidência. Tinha algo por trás daquela morte e algo dizia que seu pai sabia bem do que se tratava. E contrariando uma ordem, ele não ficaria longe disso.

[...]


Na manhã seguinte, Susan Carter se preparava para mais um chá da tarde com as mulheres mais influentes de Lovedale. Inclusive, sua melhor amiga Bettany Michaels.

Colocando seus brincos de pérolas, seu marido, surgiu dando-lhe um beijo sem segundas intenções em seu pescoço.

— Está divina, meu amor. Como sempre. Uma primeira dama maravilhosa. — Robert Carter sorria sem mostrar os dentes, somente por educação.

— Como estão as coisas na prefeitura? Tudo indo bem? — Ela perguntou tentando esboçar interesse, a única coisa que realmente importava naquela cidade são os cofres cheios.

— Tudo está uma droga. Mas, o surgimento de um novo empresário abriu alguns caminhos para o dinheiro fácil. Já tive muitos prejuízos com os Michaels. Harold ainda me deve bastante dinheiro. E as coisas no seu clube de mulheres? — Perguntou fingindo interesse, fitando o próprio reflexo no espelho da penteadeira de sua mulher.

— Dívidas? Achei que eles estavam em boas condições. Bettany não me contou nada sobre as desavenças de Harold. — Susan voltou sua atenção para o marido, depois, observou que seu par de brincos de rubi havia sumido. Ou, talvez ela tivesse deixado em outro lugar. — Querido, você viu os meus brincos de rubi? Eu não os encontro.

— Harold tem tantos problemas com dinheiro que mesmo se vendesse todos os fios de seu cabelo, ainda assim, não daria para pagar suas dívidas. E ele é careca! — Os dois sorriram com o comentário. — Não sei, querida. Você tem tantos. Qualquer um ficará bonito. — O prefeito levantou-se e ajustou seu terno. — Te vejo mais tarde.

Após terminar de arrumar-se com um vestido elegante, Susan pediu para que seu motorista a deixasse na casa de Kim. Uma das mulheres organizadoras do comitê. O padre Joshua já se encontrava lá, falando sobre a igreja e algumas coisas aleatórias. Eles trocaram um rápido olhar que Josh finalizou com um leve aceno de cabeça.

Após cumprimentar todas as mulheres, Susan segurava em mãos uma torta de nozes e frutas vermelhas com bastante recheio.

— Por favor, coloque naquela mesa ali. — Kim indicou, fazendo Susan assentir e ir até a mesa. No caminho, ela esbarrou em Bettany que se apressou em pedir desculpas por ser desastrada.

— Querida, como você está? Que saudades! — sua amiga anunciou, dando dois beijos em cada uma de suas bochechas.

— Estou bem, essa torta parece ser do tipo que eu sairia da minha impecável dieta. — As duas sorriram e tudo estava bem, pelo menos, até o momento que Bettany afastou o cabelo de seu rosto e o colocou atrás da orelha.

— Quem te deu esse par de brincos? São lindos. — Susan questionou, sentindo uma fúria tomar conta de si.

— Meu marido comprou no nosso  aniversário de casamento ontem. É lindo, não é mesmo? Combina perfeitamente comigo. — Bettany sorriu confiante para sua amiga, mas antes de voltar sua atenção para as colegas, Susan segurou-a com delicadeza pelo ombro.

Betty, está faltando algo no seu look de vadia oportunista. — Susan vociferou, acertando a torta de nozes bem no rosto da mulher que um dia chamou de "melhor amiga".  

Eros Caindo em Tentação (Concluído)Onde histórias criam vida. Descubra agora