Capítulo 63

1.4K 240 56
                                    

Agosto de 2005


— Não tenha medo, querida. Você está segura. Nós iremos te ajudar. — Vovó Lise explicou, enquanto a pequena Anelise segurava com firmeza na mão da matriarca.

Ambas caminharam por um corredor estreito e frio, a pequena Anne não lembrava do caminho inicial, a única certeza que tinha era de que estava com medo.

Velas iluminavam o caminho que parecia um túnel sem fim, e vozes femininas pareciam vindo do fundo. Era um cântico antigo, e ela tinha certeza de que não era sua língua materna. Sentindo um arrepio lamber sua nuca, a garotinha indefesa apertou mais a mão da avó, como se pudesse sugar um pouco mais de coragem. Ela não entendia o que estava acontecendo, mas aquilo a assustava demais, mesmo que sua doce avó tentasse passar tranquilidade.
 

Ao chegar no final do corredor, todas as mulheres abriram espaço em um círculo, quando Vovó Lise pediu para que Anelise ficasse no centro e que não tivesse medo. A pequena se concentrou na voz de uma mulher que dava ordem para as outras que usavam colares que a garota não conseguia identificar.

— Você tem um grande propósito, criança. Não tema! Seu sacrifício salvará todas nós. Venha até mim. — Uma mulher de pele caramelo e olhos verdes convidou a criança que sem medo, caminhou na direção dela.

Todas as mulheres iniciaram o cântico novamente, mas desta vez fazendo uma dança coletiva e com gestos assustadores. Anelise ajoelhou-se no meio do círculo e usou a mão para proteger seus ouvidos das vozes que entoavam:

Η αγάπη δεν μπορεί να καταστρέψει αυτούς που δεν μπορούν να αγαπήσουν
( O amor não pode destruir aqueles que não podem amar)

Γι 'αυτό κλείστε τις καρδιές σας και αποφύγετε την είσοδο του έρωτα (Então, fechem os seus corações e impeçam o amor de entrar)

Θα σας καταστρέψει, θα προσπαθήσει να σας φέρει κάτω
(Ele tentará te destruir, tentará te derrubar)

σπασμένη καρδιά σου δεν θα διορθώσει ποτέ
(Mas seu coração ferido, jamais irá consertar)

Anelise desmaiou quando o cântico ficou mais alto, e todas as mulheres deram as mãos no momento exato que isso aconteceu. Agora, era como se ela estivesse assistindo tudo em terceira pessoa, uma telespectadora da sua própria vida, suas lembranças roupas.

— Isso não é possível. — A morena limpou as lágrimas que tocavam seu rosto, incapaz de enxergar.

Fiquei me perguntando quando você iria descobrir, demorou mais do que eu pensava. E sinceramente, finalmente posso mostrar quem sou de verdade..

Sophia, o que você quer de mim? Por que está fazendo isso comigo? — Anelise respondeu a voz que estava em sua cabeça, um corpo que habitava duas mentes, duas almas mas um só coração.

Me desculpe se isso tem de ser assim, mas seu propósito é lindo, você nos salvará.

Você matou aquelas mulheres! Por causa de uma droga de colar! — Anne sentiu louca por responder a sua própria mente.

Elas jamais iriam dar o que eu pedi, tive que pegar emprestado...

Vá embora! Me deixe em paz! Por favor! — Anne implorou, mas já era tarde demais. Sophia já havia roubado o lugar dela.

Sophia encarou sua hospedeira, tocando a pele macia, os cachos. Era uma humana novamente, poderia fazer o que quisesse.

— Me desculpe, Anelise. Eu sinto muito, mas preciso do seu corpo, preciso da sua ajuda para cumprir a minha profecia, a nossa profecia. É uma pena que você não poderá vê-la.

Sophia encarou o reflexo novamente no espelho e foi tomar um banho, bem demorado. Ela estava indo retomar a rotina de Anelise, para que ninguém desconfiasse.

[...]

Após vestir roupas sensuais e chamativas, a ''nova" Anelise estava indo além das roupas que a antiga Anne usaria. Batom chamativo, salto alto, brincos, colares e todos os acessórios que ressaltavam feminilidade. Tudo que era inusitado para Sophia. Ela conseguiu sair despercebida de casa, sem chamar a atenção de seus pais que estavam distraídos com seus assuntos rotineiros.

Sophia ficou impressionada ao perceber Lovedale tão diferente, habitada, limpa e organizada. Ela achava que a cidade estava em ruínas, ou talvez sequer existisse. Havia uma certa limitação em ver e sentir as coisas por Anelise que agora não passava de uma voz interior, lá nos confinamentos de sua mente.

Após fazer um pequeno passeio pela cidade, cumprimentar as pessoas aleatórias na rua, comer pipoca de milho e observar as crianças brincando na rua, ela se perguntou como seria ter crescido num lugar assim, livre dos anseios da fome. 

Sophia adentrou no escritório, respirando fundo, aspirando cada essência e cheiro de pessoas e dos móveis no escritório. Encontrou algumas pessoas das quais sequer lembrava o nome e seguiu seu caminho.

— Como é bom estar de volta. — sorriu triunfante, indo para a sua sala, ou melhor, a sala de Anelise.

Sophia rodopiou na cadeira, jogou os papéis para o alto, celebrando por estar de "volta". Uma leve batida na porta chamou a sua atenção e ela correu para ajustar os papéis e arrumar sua bagunça.

— Pode entrar. — Assumindo uma postura ereta, a substituta anunciou e a porta foi aberta.

Para a sua surpresa, Ares apareceu com um sorriso e uma xícara de café, adentrando na sala.

— Me desculpe, estou atrapalhando, Anelise? — o sorriso largo cresceu ainda mais, mas desapareceu com a mesma rapidez que se formou ao ver o olhar de sua secretária. — Está tudo bem?

— Ares... — Sophia levantou-se caminhando lentamente, capturando toda a atenção dele.

Parando de frente para Ares, os dois se entreolharam e o deus da guerra pôde ver muito mais do que os olhos castanhos de Anelise tinham.

Ficando exageradamente próximos, Ares parecia estar prendendo a própria respiração, pois a distância era tão pequena, que respirar parecia ser um ato de invasão de privacidade.

Numa atitude insensata, Sophia desferiu um tapa no rosto de Ares, sem pensar nas consequências graves que seu ato traria.

Sem revisão

Eros Caindo em Tentação (Concluído)Onde histórias criam vida. Descubra agora