Capítulo 46

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     Fora estranho, mas Anelise sentia em seu coração que poderia confiar em Ares, como se aquele homem que mal conhecera, fosse um amigo de sua família. Por isso, contou-lhe tudo, não com a riqueza de detalhes que gostaria, mas já era o bastante. Como o bom ouvinte que era, o deus da guerra ficou em silêncio, prestando atenção em tudo, descobrindo coisas novas sobre o seu próprio filho.

E no final, entendia que ambos compartilhavam do mesmo sentimento voraz por uma humana, por ironia do destino, ambas são da mesma família. A garota tão acostumada a ouvir as pessoas, jamais pensara que necessitava tanto falar sobre seus problemas. A definição de "deixa sua dor de lado para cuidar dos outros", era completamente aplicável à sua personalidade.

— Eu sei que parecemos pessoas complicadas — após quebrar o silêncio, Ares analisou a expressão de Anelise - E na verdade, somos. — Ele sorriu enquanto passava as mãos em seu cabelo. — Dê um tempo para ele. Eros demora a admitir que as coisas estão o incomodando. Isso é uma característica minha. De todo modo, mandar uma carta para você, só mostra que ele tem problema em dizer o que sente.

— Me desculpe por vir até o seu trabalho. Eu não tenho am... — Anelise não completou a palavra, sabendo que ao dizê-la em voz alta, sua realidade poderia ser mais assustadora — ... Mais ninguém para falar sobre isso.

— Tudo bem, mas eu gostaria de oferecer algo além dos meus conselhos inúteis. — Ares observou que Anelise usava a farda de seu trabalho, na sorveteria. — Acho que é um desperdício de talentos, alguém como você trabalhar lá. Quero dizer, não tenho nada contra pequenos empreendimentos, mas eu poderia pagar o triplo que você recebe ao mês. E sei que a pesca não está mais dando certo em sua família.

— Para quem me conheceu há pouco tempo, você parece saber o bastante sobre mim e a minha família. — Ela suspirou fundo, logo em seguida negando com a cabeça. — Não posso, Eros já deixou claro que não quer mais me ver, logo após isso eu venho trabalhar aqui? Seria como jogar o meu orgulho no lixo.

— Você irá trabalhar para mim, não para ele. E além do mais, a empresa é minha. Eros não vem aqui, ele não tem interesse nos meus negócios. É uma grande oportunidade, se eu fosse você, pensaria mais a respeito disso. — sentando-se novamente em sua poltrona, observou os traços de Sophia nítidos em Anelise. Seria algum tipo de sentença? Ver o rosto de seu grande amor, estampado no rosto da amada de seu filho?

— Irei pensar sobre isso, eu prometo. E novamente, obrigada por me ouvir, sr. Ares...? — Ela interrompeu o devaneio dele, que voltava aos poucos para a realidade.

— Apenas Ares, em minha família, não gostamos de usar sobrenomes. Isso tira toda a exuberância e grandeza de nosso nome. Quantos Ares você conhece?

Ponderando, Anelise demorou a responder, pensando sobre isso. E na verdade, ele tinha razão. Nunca tinha conhecido pessoas com nome de deuses presentes na mitologia grega. Após o silêncio perturbador, ela sentia que Ares ainda aguardava por sua resposta.

— Além dos deuses gregos, eu não conheço ninguém. — Um sorriso brincalhão e sedutor surgira nos lábios de Ares.

— Você acredita nessas coisas, Anelise Harper? — Sentindo o olhar analisador dele, ela ficou inquieta. Diferente. Não sabia explicar o que sentira com exatidão.

— Não — tentando decifrar a expressão no rosto do homem misterioso e intimidador, Anelise demorou-se um pouco mais em suas feições. — Eu deveria?

— Acreditar ou não em algo, só depende de sua escolha. Isso não quer dizer que deixará de existir para outra pessoa — levantando-se gradativamente, Ares mantinha seu olhar nela — Eu iria adorar prolongar a nossa conversa sobre crenças, mas eu preciso fazer umas coisas — abrindo a porta, Ares esperou que Anelise saísse, antes que ela pudesse refazer seu caminho até a saída, o deus anunciou: — Pense em minha proposta, não costumo dar mais de uma chance para alguém.

[...]

    Não muito longe dali, Susan Carter corria e ouvia música através dos fones em seu celular. Não iria aguentar ficar no mesmo metro quadrado que as perfeitas e imaculadas esposas de Lovedale. Respirar o mesmo ar que elas, parecia ser algo tóxico, e a mulher do prefeito já estava cansada disso. Na verdade, já estava cansada há muito tempo de ser apenas "a mulher do prefeito".

Após suspirar fundo e sentir as gotículas de suor fazer seus cabelos loiros grudarem em sua testa, ela recobrou o ar e enquanto bebia água, observava Joshua saindo de uma rua aparentemente deserta. Mas desta vez, ao invés da batina, usava uma camiseta de manga longa, calça jeans e tênis, como um mero cidadão de Lovedale. 

Ela escondeu-se por entre os arbustos, questionando o que o imaculado padre tanto escondia. E em breve, Susan descobrirá. Ao voltar para casa, notara que Sabrina não se encontrava. Na verdade, elas nunca tiveram uma relação afetiva entre mãe e filha, e depois do escândalo com Gregory Thompson, ela gostaria de falar com a filha, mas não sabia como. E no fundo, achava que Sabrina queria apenas distância por um tempo.

Pensara no que faria sobre Joshua, e no final das contas, sabia como desvendar os segredos do misterioso padre. Após tomar um banho e vestir sua melhor roupa, Susan usou as jóias que seu marido havia comprado recentemente, na tentativa de também comprar o seu amor.

Dispensando o motorista, ela se certificou de que completaria sua missão sozinha. Dirigiu até a sede do jornal de Lovedale, ao ser cumprimentada pelos funcionários, Susan pediu para que um jornalista em especial a procurasse, e o homem não hesitou.

Ficara impressionada com a sala luxuosa, sentindo o poder exalar em cada móvel caro. Susan passara a mão pelo couro firme da cadeira, levantando o olhar para ver Paul adentrar na sala às pressas.

— Sente-se — ordenou, mostrando quem estava no poder, mesmo que temporariamente. — Preciso que você descubra algo para mim.

— Como? — Paul questionou, ajustando seu óculos e sentindo-se ofendido pela arrogância da primeira-dama.

— Quero que descubra tudo sobre o padre Joshua. Tudo. Sem deixar nenhum detalhe passar. Lembre-se do que a nossa família fez para ajudar a sua. — Susan o encarou, enquanto o homem sentava em uma das cadeiras para digerir a informação. — Eu sei que jornalistas têm meios para descobrir as coisas.

— Eu não sou detetive, sou um mero jornalista — defendeu-se, dando de ombros e percebendo a expressão implacável no rosto dela — Você confia em mim para fazer isso?

— Você trairia a confiança da mulher mais poderosa da cidade — impetuosa, Susan o encarou, fazendo-o cada pelo na nuca dele ficar eriçado. — Devo lembrá-lo da verba a mais que a prefeitura está disponibilizando para manter este jornalzinho?

— Não, senhora. — confirmou de cabeça baixa, sentindo a ameaça explícita, realmente ir além das palavras — O que você deseja saber, vou descobrir. Entregarei tudo que eu encontrar sobre o padre Joshua. 

Eros Caindo em Tentação (Concluído)Onde histórias criam vida. Descubra agora