Terceira Pessoa
– O quê?
A garganta da mulher mexeu ao engolir e seus olhos buscaram os de Hurley que confusos, encararam a chateação nítida que cobriu o semblante do agente mais novo.
A cabeça de Mitch foi invadida por faíscas de incertezas e inseguranças com a repentina notícia. Suas sobrancelhas tremeram por um momento e Martin não suportou encará-lo, as mãos suando contra os bolsos repentinamente quentes do moletom. Rapp voltou-se para o chefe, quase aéreo ao dizer:
– Por isso... você a trouxe? – Concluiu baixinho. Hurley lançou um olhar para a ruiva corada, tornou a inspecionar o agente conservado em emoções corrosivas e os traços de seu rosto suavizaram com alguma compreensão.
Mitch cerrou os olhos por um instante, sentindo a raiva cravada nas veias agora borbulhando com um vigor adormecido. Seus dedos estralaram ao fechar-se em punho em um movimento despercebido.
– Por isso esteve rondando à sede nos últimos dias?
Hurley arqueou sutilmente o queixo com o tom de acusação descarado. O maxilar de Rapp se condensou em uma linha dura enquanto por dentro, o homem se esforçava para conter o acesso de ira que agora ameaçava seus pensamentos racionais. Apesar de algo em seu corpo sentir-se reprimido por Stan – uma autoridade –, o conflito nítido de descrença, preocupação e revolta desencadeado pela mulher agora formigava na nuca de Mitch de maneira incontrolável.
– Estive rondando à sede porque trabalho lá.
As palavras estudadas de Hurley foram suficientes para fazer Mitch tornar a engolir o estresse que pinicava na língua. O agente trombou nos olhos verdes e preocupados, observando que Lydia tinha um tom novo de rubor agora nas bochechas. O jeito que ela engolia em seco denunciava o nervosismo nítido que se apossava de seu corpo.
– Iria te fazer a mesma pergunta, na verdade. Você também anda bem envolvido pelo visto.
Rapp encarou Hurley, confuso, perdido no misto de emoções que ardiam no estômago. A imagem de Lydia na CIA, trabalhando ao seu lado, todos os dias com uma nova ameaça de morte – principalmente com o caso de Theo – não saia de sua cabeça, girando e girando em flashs de aflição.
Stan ainda inspecionava o rosto de seu agente, e alguma diversão brincou em sua boca quando ele despejou:
– Mas parece que tem rondado mais do que a CIA...
Lydia sentiu o coração se perder em um conflito de dúvida e receio. Não conseguiu calcular qual era o verdadeiro peso das palavras venenosas e sutis que Hurley soltou no ar, diferente de Mitch, que sentiu a insinuação esmurrar as emoções que tentava reprimir na consciência.
Ele encarou o fundo dos olhos do chefe. Stan era uma nuvem carregada de poderio e pontadas perspicazes de incitações, como Irene. Mitch respirou fundo, frustrado, exausto de se sentir consumido por emoções incontroláveis e tentando a todo custo ignorar a fixação que a cabeça havia adquirido ao imaginar Lydia na CIA. Era como se afogar em um mar fervente de sentimentos que não lhe pertenciam. Sentimentos que ele, pelo menos, insistia em acreditar que não lhe pertenciam.
Lydia não conseguia escolher quais palavras iria permitir que escapassem da boca já que todo o tipo de pensamento agora estava consolidado em afeto maciço, impregnado em sua língua congelada. Não sabia quando criaria coragem para contá-lo sobre o convite e naquele momento, encarando a decepção e o receio cravado em seus olhos, soube que esteve certa todo aquele tempo em rejeitar as oportunidades.
Não estava preparada para perceber que podia magoá-lo. Sentiu, no fundo de seu peito, algo partir-se contra sua vontade.
Hurley, baixo, ignorando os olhos ferventes de Mitch, incitou:
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Crow's Flight
Mystery / ThrillerApós o término do namoro, Lydia Martin segue uma rotina monótona e apesar de todas as tentativas, não consegue esquecer o ex. Suas maiores preocupações eram reatar com Henry e recuperar as notas da faculdade, até que sua vida é desestruturada com a...