Vizinhos

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Terceira Pessoa

Lydia saiu apressada do elevador, não suportando estar dentro do próprio corpo naquela manhã. O suor grudento e espesso sobre sua pele a deixava pegajosa e desconfortável consigo mesma, ansiando por um gelado e demorado banho.

O coração se agitava com os inúmeros sentimentos sufocantes ocasionados por Henry. Ainda que estar na academia para não pensar o ex-namorado pudesse ser eficiente, ela concordava que a rotina não era uma de suas favoritas.

Quando as portas de metal abriram, Lydia caminhou pelo corredor em direção ao apartamento. Diminuiu o ritmo dos passos a pouco metros de sua porta, tendo a atenção prendida ao escutar um estrondo seguido de um palavrão ríspido:

– Cacete!

Um homem alto, pálido, de ombros largos e músculos magros estava em pé, de costas para ela, encarando a caixa de papelão que havia despencado de suas mãos, espalhando diversos livros com a queda ao solo.

Ele se abaixou, ficando de cócoras, começando a recolher seus itens pessoais. Lydia o observou curiosa, e não se conteve ao perguntar:

– Você precisa de ajuda?

Ainda abaixado, o homem parou de se mexer para olhar a ruiva por cima do ombro. O semblante impassível, marcado por uma sobrancelha arqueada e quase desafiadora bateu no rosto corado e curioso.

Ele deslizou os olhos por ela em poucos segundos, captando as curvas marcadas pela roupa de ginástica, voltando aos olhos verdes com naturalidade e calma.

O cabelo curto exibia a onda bem desenhada de um topete na testa, e o maxilar era marcado por uma barba rala e bem cuidada. O homem lambeu a boca fina, respondendo:

– Sim, por favor.

Alguma timidez passou pelo rosto dela, mas Lydia ignorou o desconforto do próprio corpo para andar até ele. Se ajoelhou e ao inclinar-se para a frente, o ajudou a recolher os utensílios caídos.

A ruiva o auxiliou desinteressada, até suas mãos captarem um livro peculiar. Os olhos verdes correram ansiosos pelo título "Muay Thay Básico", e a curiosidade ferveu seus neurônios pelos poucos segundos que correram em seguida. O homem permaneceu recolhendo os objetos, só quando a voz de Lydia soou que seus olhos se chocaram novamente:

– Você luta?

As mãos masculinas voltaram a recolher os livros sem grande interesse.

– É mais teoria do que prática. – Explicou. – Eu acho interessante.

– Mas você não tem vontade de lutar?

O homem a encarou, surpreso com a curiosidade genuína no semblante atento de Lydia. Ele deu sutilmente de ombros, alcançando o último livro no chão enquanto o exemplar sobre Muay Thay permanecia nas mãos femininas.

– Talvez, um dia.

Ela assentiu devagar.

– Você lutaria? – O homem se levantou, e só então ela percebeu que já haviam guardado tudo.

As bochechas da ruiva queimaram ao lançar o livro de capa vermelha na caixa de papelão enquanto seus lábios torciam em uma linha. Lydia odiou o fato de sentir-se sem graça perante um homem bonito que demonstrava tranquilidade ao conversar com ela.

– Talvez. – Deu de ombros. – Não curto muito atividade física.

– Posso ver.

Os olhos castanhos insinuaram a roupa de ginástica no corpo dela com um breve olhar, e Lydia se contorceu por dentro com o sorriso confiante e provocativo que se curvou para um lado do rosto masculino.

Crow's FlightOnde histórias criam vida. Descubra agora