Crow's Flight

Silhueta

Terceira Pessoa

Mitch bebericou a garrafa de cerveja, os olhos ansiosos disparando entre as linhas do site aberto no notebook. Demorou-se em todos os detalhes possíveis sobre os ataques que a CIA havia sofrido – alguns derivados de facções criminosas – há aproximadamente vinte e cinco anos. Leu algumas coisas sobre "Caduta del grande", mas sua atenção se dissipou rápido demais.

Respirou fundo e, sentindo o corpo empedrar contra a cadeira, tentou deslizar o colo e relaxar.

Sua cabeça se fragmentou em inúmeros pedaços de possibilidades. Exausto de pensar, de cogitar, de precisar lidar com as próprias emoções, fechou os olhos e apoiou os cotovelos na mesa, trazendo as mãos aos olhos. Ansiou que pudesse livrar-se dos efeitos das últimas semanas.

Alcançou o celular no bolso, verificando as notificações, procurando por ao menos uma distração do trabalho exaustivo. Entretanto, sua atenção foi completamente sugada com batidas na porta. Mitch buscou pelo interfone na parede como quem procurava entender se existia alguma possibilidade de que ele estivesse tocando em meio ao silêncio.

Levantou-se ao arrastar a cadeira e fechar o computador, seguindo até a porta. Ao abri-la, seu corpo de repente despencou na gloriosa perdição de seus sentimentos e batimentos cardíacos todas as vezes em que se via perto de Lydia Martin. A garganta do homem mexeu nervosamente, sua mão apertando a borda da porta quando ele apoiou o antebraço e esforçou-se para relaxar, olhando para ela, tentando decifrar quais sentimentos dançavam em seu rosto.

Martin ainda se questionava o quanto ir até ali sem aviso poderia ser uma boa ideia e diante daquela questão outra vez, enquanto pensava no que dizer além de um mero cumprimento, as curvas delineadas no tronco nu de Mitch pareceram provocá-la ao se flexionarem, quase como se testassem sua sanidade. Ela observou o cabelo escuro e charmosamente bagunçado, a maneira que os olhos castanhos continuaram fixos nos seus com interesse pessoal e alguma parcela inconsciente de provocação. Ela lambeu a boca, os olhos caíram para a calça de moletom dele.

Pensou outra vez no que dizer, tentando nadar contra a correnteza de nervosismo e rendição que avançou por seu íntimo. Suas bochechas claras tornaram-se rosadas. Em meio ao seu silêncio confuso, Mitch aproveitou para admirá-la. Ele ainda achava adorável a maneira que Lydia podia ser tão tímida por natureza, mas em outros momentos tão maliciosamente sórdida.

– Você quer entrar?

Ela levantou os olhos perdidos de sentimentos, deparando-se com um sorriso doce e curto na boca do agente. Sentiu-se estúpida, odiando que ele ainda tivesse o poder de congelar seus minutos e fazê-la se perder de tudo ao redor.

– Eu quero conversar. – Disse ela, engolindo. Enfiou as mãos nos bolsos frontais da calça jeans, suas bochechas a traindo outra vez. – Seu porteiro me deixou subir.

– É, ele... – Mitch deu uma risada curta, seu semblante divertido e quase malicioso enfraquecendo as pernas da mulher. – Ele acha que nós namoramos.

Ele observou Lydia piscar, sem saber o que dizer, tentando lidar com tudo que aquela frase acendia dentro dela. O agente sorriu outra vez, despreocupado, todo o estresse de poucos minutos atrás evaporados por sua distração favorita que agora estava soltando uma baixa e nervosa risada enquanto enfiava uma mecha do cabelo atrás da orelha, parecendo envergonhada. Por fim, ele deu espaço na porta, a mão ainda levantada exibindo as chamas internas tatuadas em seu braço, o revólver escuro na costela parecendo mirar diretamente no coração da mulher.

Ela tentou captar algum resquício da decepção dele ocasionada pelos últimos dias, sentindo-se culpada por tê-lo magoado, por ter precisado agir daquela forma em vão. Ainda estava anestesiada por todo o peso que aqueles papéis causaram em sua alma agora ter sido soprado para longe como penas na reunião do dia interior.