Capítulo 54

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Enquanto o cheiro maravilhoso do recheio começa a tomar a cozinha,
me empenho a fazer a massa: ovos, farinha e água. Os ingredientes
são poucos e simples, mas depois de sovar e abrir com o cilindro eu
sabia que estaria perfeita, em casa quando fiz esse prato uma vez
demorei muito tempo por ter que abrir tudo com um rolo, agradeci
mentalmente pela facilidade que o cilindro me trouxe, eu realmente
gosto muito desse prato.

Desligo o fogo com o recheio e acrescento o ovo, pão ralado e
presunto, misturo tudo com uma colher grande e cubro com plástico
filme, essa mistura deve descansar e esfriar por uma hora.

Faço um molho tradicional de tomate, e após abrir e cortar as lâminas
de massa começo a recheá-las. Desvio o olhar para Bruno e vejo
que ele me encarava, enquanto cozinhava havia me distraído
totalmente da sua presença, mas senti o seu olhar me puxar feito um
imã.

— O que está fazendo? — pergunta — Está com um cheiro divino.

Tortellini di Valeggio  — falo, começando a rechear a massa e a
finalizo com uma espécie de nó.

Nodo d’Amore?  — pergunta e eu sorrio ao responder

— Sim, o famoso nó do amor — digo, sorrindo e Bruno se levanta
e caminha até onde estou.

— Parece difícil — comenta despretensiosamente.

— Na verdade não é, é só a prática mesmo. — Continuando o
trabalho — Você conhece a história desse prato? — pergunto,
sorrindo

— Não.

— Quer saber? — Pergunto e ele dá de ombros, sentando-se à minha frente na bancada, então resolvo contar.

— É uma lenda do século treze, dizem que soldados chegaram até as
águas do Rio Mincio e naquela época atores eram contratados para
entretê-los, um deles lhes contou que havia ninfas naquelas águas
que a noite saiam do rio e dançavam. — Ele leva a taça aos lábios e
concentra a sua atenção em mim. — Mas como elas eram enfeitiçadas, assumiam forma de bruxas feias quando saíam das águas. Um dos soldados ficou impressionado com a história e naquela mesma noite, enquanto dormia, foi acordado pelas bruxas que dançavam, intrigado ele foi até elas que fugiram, mas enquanto corria, uma bruxa deixou o seu manto cair e diante dele se
transformou em uma bela ninfa, eles se apaixonaram e durante aquela noite se amaram, mas como antes de amanhecer ela precisava voltar ao lago, entregou a ele como lembrança um lenço atado.

— Tome um pouco. — Bruno leva a sua taça aos meus lábios quando faço uma pausa na história, compartilhando comigo a sua bebida, então continuo.

— Durante a festa no dia seguinte, ele reconheceu sua amada, dançando diante dos homens, ela havia enfrentado os perigos para
estar perto do seu amor, mas os olhares dos dois despertou o ciúme
de uma aldeã que o desejava, ela contou a todos que havia entre eles
uma ninfa, e o soldado conseguiu ajudá-la a voltar para o rio sem ser
capturada, mas ele foi preso, durante a noite quando todos dormiam,
sua ninfa foi até ele, que decidiu segui-la. A mulher que o desejava,
resolveu ajudar ao perceber o quanto se amavam e pediu que o
libertassem. Eles fugiram para o rio, e no local onde desapareceram,
na margem foi encontrado um lenço de seda dourado amarrado pelos
amantes, que passou a simbolizar o seu amor eterno, e assim surgiu
o Nodo d’Amore, para sempre lembrar a história dos dois, deixando
claro que nenhum amore é impossível.

— Você gosta de histórias.

— Sobretudo as de amor — respondo com um sorriso nos lábios,
mas não perco o seu semblante fechado e percebo que ele não
compartilha os mesmos pensamentos que eu.

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