Desculpas

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Uma lágrima teimosa escorreu pela bochecha, acompanhada de outras. Ela fungou e esfregou os olhos, avançando a passos apressados em direção à porteira da propriedade dos Valente. Ignorou a voz que a chamava e continuou caminhando, cruzando a ponte que atravessava o córrego. A gata, gorda e manhosa, ao perceber que Victoria não diminuiria o ritmo, saiu de seu caminho, ressentida. A reação de Matheus a tinha afetado mais do que ela pretendia demonstrar a ele e, aos poucos, ela sentia as batidas de seu coração se acelerarem. Seu peito se apertava ao lembrar das palavras ríspidas. As teria ignorado ou respondido com alguma grosseria debochada se tivessem partido de qualquer outro, mas vindas dele, a tinham roubado as respostas e lhe perfurado como uma lâmina pontiaguda.

— Victoria! Espera. — Ela se virou para observar quando Miguel se aproximava.

— Está tudo bem, Miguel. Não se preocupe.

O garoto venceu a distância, correndo em sua direção e parando diante dela.

— Ele não quis ser grosseiro. Tenho certeza.

Ela deixou a cabeça pender, inclinada, curvando a boca em um sorrisinho forçado.

— Ele não foi grosseiro, Miguel. — falou, tristonha. — Ele foi apenas sincero. E ele tem razão. A vida não é um livro. Só que eu sou assim. Eu romantizo demais as coisas. E foi só por isso que deixei essa loucura chegar onde chegou.

— Não seja tão dura consigo mesma, Vi.

Victoria meneou a cabeça, negando o cavalheirismo do outro.

— Eu envolvi o Matheus nas minhas fantasias. O enredei e o fiz se aproximar. — Ela esfregava um dos braços com a mão. — Mas desde o começo eu sabia que não daria certo. Não tinha como dar.

O quero-quero gritou, alerta, mais adiante, quebrando o breve silêncio que havia se abatido.

— Mas não foi unilateral. — Miguel começou, com cuidado. — Você envolveu o Matheus nas suas fantasias e ele te envolveu nas dele. Não é como se não fosse difícil para você também.

— É, mas sou eu que estou dando um basta nisso.

— Só que se fosse o contrário, você aceitaria, não aceitaria?

— Aí é que está. Eu acho que ele preferiria ir até o fim, independente das consequências. Eu não acho que ele algum dia fosse terminar comigo. E é por isso que pode parecer que ele está mais entregue a isso do que eu.

— E ele está? — Miguel a encarou, sério.

Victoria fechou os olhos, sentindo aquela pergunta lhe incomodar. Quão entregue ela estava àquele sentimento o qual seu corpo e seu coração faziam questão de colocar em evidência constantemente da maneira mais intensa a qual já havia experimentado?

— Vem. — Miguel a puxou pelo ombro, obviamente percebendo que seus olhos novamente se enchiam de água.

Os dois caminharam em direção a um banquinho mais adiante. A pergunta que Miguel acabara de fazer passara a incomodá-la ainda mais. Por um breve momento, aquela dúvida assombrou seus pensamentos e, quando deu por si novamente, estava sentada com o amigo a acariciar seu ombro.

— Pronto, pronto. Você vai ficar bem.

Não era capaz de precisar quanto tempo se havia passado, mas se espantou quando viu, ao longe, a figura do primo a deixar o rancho caminhar em direção aos dois.

Victoria se alinhou e enxugou os olhos com as costas da mão uma vez mais. Miguel se levantou quando Matheus se aproximou e, ao passar por ele, sussurrou algo que Victoria não foi capaz de ouvir. Ele meneou a cabeça em resposta e, com as mãos nos bolsos e os ombros encolhidos, ele se aproximou, cauteloso, se sentando ao seu lado.

— Me desculpa, Matheus. — Ela fez um beicinho de choro, involuntariamente. — Eu não queria que ficasse bravo comigo. Eu só não queria que...

Ele ergueu a mão, como se quisesse acalmá-la.

— Não, Vi. — A interrompeu. — Eu é que tenho que pedir desculpas. Eu fui grosseiro com você.

— Desculpa por tocar no assunto da sua mãe. Desculpa por causar toda essa bagunça entre nós. Eu não deveria ter iniciado tudo isso.

— Não precisa se desculpar por isso. Eu entendo você, Vi. Sei que não teve intenções ruins. Eu só surtei por que não queria interromper o que estava acontecendo entre nós.

— Eu sei que eu sou indecisa, mas é tão difícil ser coerente e racional quando eu estou perto de você. Não quero que pense que...

— Eu te amo, Vi. — Victoria arregalou os olhos, surpresa. As maçãs de seu rosto se aqueceram intensamente e o coração palpitou furiosamente. — E eu sei que você me ama também. Então, eu tenho certeza que tomar a decisão que você tomou deve ter sido tão difícil para você quanto foi difícil para mim ter que aceitá-la. Você tem razão, é melhor a gente parar mesmo, por melhor que seja.

Ela o encarou por muito tempo, em silêncio, olhou então para a frente e baixou a cabeça. Logo, sentiu a mão de Matheus pousar em seu braço e apertá-lo com firmeza. Seu corpo respondeu ao toque, aquecendo-se instantaneamente, como era de costume e ela se deixou levar, tranquilamente, quando ele a puxou contra si. Pousou, então, a cabeça sobre o ombro do primo e sorriu para si mesma, mais tranquila do que estivera momentos atrás.

— O que vamos fazer agora? — perguntou, se referindo ao desejo que ambos sentiam um pelo outro e na maneira insustentável com a qual teriam de lidar com aquilo.

— Agora, voltamos a esperar pelo momento perfeito para pegar o celular da Sara e descobrir o tal mistério e se o que quer que ela esteja aprontando tem realmente a ver com o que aconteceu com a minha mãe.

O sorriso no rosto de Victoria se alargou e ela se aconchegou, colada ao corpo de Matheus.

— Então, quer dizer que você acredita na minha teoria?

— É claro que acredito. — Ele respondeu. — Digo, por enquanto, é só uma teoria. Mas seria muito sem graça se fosse apenas uma coincidência, não é?

— Achei que a vida não fosse um livro, nem um romance investigativo e finais felizes não existiam, nem blá, blá, blá... — Ela soou irônica de propósito.

— Bom... acho que, com você por perto, nada é o que eu imaginava ser.

O fruto proibido ( Erótico )Onde histórias criam vida. Descubra agora