Problemas

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   Rafa entrou aborrecida dentro do carro. Sofia sentou atrás olhando a cara da tia, que parou uns segundos para respirar.
Pelo retrovisor, ela via Gizelly subir na moto e ir embora com uma mochila nas costas.

- Palhaçada! - Exclamou, lembrando-se do atrevimento da professora. - Tá com fome? Vou pedir um almoço para você! - Disse ela, ligando o carro, passando a marcha e saindo com o veículo.

- Tia Gi me deu um suco e o sanduiche dela. Estava uma delícia. Não estou com fome!

Rafa a olhava pelo retrovisor, mesmo apressada, olhou e sentiu pena. Renato fazia o que queria com a menina, e ela achava que não tinha muito jeito com criança.

- Vou levar você para a academia. A noite a gente vai pra casa, tá? Tem muita lição?

- Mais ou menos... - Elas ficaram conversando.

Rafa tentava interagir vendo que a menina sempre estava sozinha e jogada de um lado para o outro. A mãe de Sofia estava morta, seus avós maternos morando em outro estado e não tinha outro parente próximo se não ela.

- Será que a Lorena está em casa? Podemos brincar! - Perguntou a criança, se referindo a vizinha de Rafa que tinha a mesma idade que ela.

- Acho que sim!

Quando chegaram a academia, Rafa deixou Sofia no computador, vendo vídeos e jogos de casinhas de boneca online. Fez a outra reunião com seus clientes. E respirou aliviada por uns instantes.

- Renato deu sinal de vida? - Perguntou para Ronaldo.

- Nenhum!

- Ano passado ele sumiu três meses! Três meses! Você sabe o que é isso? Mas meus pais estavam aqui. Vou enlouquecer!

Ronaldo parecia querer falar algo, olhou para Rafa e pediu para que sentasse.

- Não, não, não! Quando pede para sentar é por que os problemas já estão jogados na porta! Fala logo! Será que hoje foi pouco?

- O professor de natação chegou bêbado de novo! Quase se afoga e os alunos que salvaram ele!

Rafa girou na cadeira algumas vezes com as mãos na cabeça. Que ironia, o professor de natação ser salvo pelos próprios alunos. Não havia cabimento naquilo.

- Ele chegou bêbado uma vez, você deu uma chance, agora de novo! Foi um escândalo. - Afirmou Ronaldo.

- Meu Deus! Some com esse homem da minha frente! Demite, dá justa causa, se não eu mesmo desço e afogo ele. - Respondeu apreensiva.

- Tem mais! - Continuou o amigo.

- Ai minha nossa senhora, fala!

- O galpão lá da esquina que foi vendido, já está começando a reforma como a gente já sabia, e vai ser mesmo uma academia. Concorrência direta com a gente.

Rafa bufou. Estava cansada só de ouvir tudo aquilo. Olhou para Ronaldo e questionou.

- Você pode ver se a minha caixa de rivotril tá cheia? Desse jeito não chego ao final do ano! Por onde a gente começa?

O amigo deu uma risada, Calmantes não faziam parte das decisões, e dormir não era uma opção.

- Vi aqui uns currículos com urgência de instrutores de natação. Uns personais, fiz umas ligações e consegui seis para amanhã. O Paulinho disse que tem uma amiga que é ótima nadadora profissional, está fora da área mas tem experiência e está precisando trabalhar. Mandei que viesse amanhã para entrevista também e tive que cancelar as aulas de hoje na piscina, logo com aquela turma infernal de adolescentes, Já imagina como foi né?

Rafa coçou a cabeça, olhou para a menina entretida no computador, via Ronaldo na sua frente contando todos os problemas do mundo e se jogou na cadeira, girando mais algumas vezes.

- Posso me demitir? - Perguntou ela para o amigo.

- infelizmente não, amore! Nem isso você pode fazer!

Ela acabou voltando para a papelada da mesa, e restava apenas esperar.

{...}

Já era noite quando Gizelly subia a escada do prédio timidamente. Sempre parecia distraída e no mundo da lua. Só Deus sabia o que passava na cabeça dela, parecia pisar em nuvens macias enquanto pensava subindo os degraus.
Quando abriu a porta do apartamento, Hariany estava sentada no sofá vendo TV.
Havia dois meses que estavam de volta ao Brasil, e ela não ficou nem uma semana no emprego que havia conseguido.

- Boa noite, linda! - Disse Gizelly, lhe dando um beijo na testa, pondo a bolsa no canto do sofá. Hari levantou aborrecida.

- Demorou né? Você foi à casa dos seus pais? - Gizelly suspirou.

Aquela conversa de novo, não era aquilo que ela esperava. Foi até a geladeira, as garrafas de água estavam vazias.

- Acho que não custava encher as garrafas né?

- Dois meses Gizelly! Dois meses que voltamos, estamos aqui nesse cubículo, você podendo falar com seus pais montados na grana! Até quando a gente vai ficar aqui, você sendo professora, e sonhando em publicar esse livro?

Gizelly se escorou na mesa da cozinha e respondeu:

- já conversamos sobre isso! O dinheiro é dos meus pais, não meu. Já bancaram meus estudos, minha vida inteira. Tenho que andar com minhas pernas e as coisas vão melhorar! Tenho uma entrevista de emprego amanhã! Darei aula pela manhã, e se Deus quiser conseguir esse emprego, teremos outra renda!

Hariany parecia ainda mais transtornada, cruzou os braços emburrada.

- Sabe o que vi? Sua irmã postando no instagram, está de viagem para a Holanda com o namorado, seus pais já estão lá e a gente aqui nesse muquifo!

- É muito merecido ué? Não tiram férias há anos, e merecem. Se dedicaram muito na empresa, podem curtir agora!

Ela ficava indignada com a simplicidade de Gizelly.

- Eu não sei onde você enxerga que essa sua historinha de ser escritora vai dar certo! Não vejo futuro nenhum nisso!

As palavras magoavam. E cansada ela não quis discutir. tomou mais um gole de água, não respondeu mais nada e foi para o quarto.

{...}

No dia seguinte, Rafa deixou Sofia na escola logo cedo. Bem antes do normal. Pediu para Ronaldo abrir a academia, e chegou beirando às sete horas.

- Você pode ficar abrindo para mim enquanto a soso está comigo? Vou encontrar uma babá, já que a Kelly não vai dar conta da casa e dela.

- Posso sim!

Ronaldo já estava com os papéis das entrevistas nas mãos e aguardava os primeiros candidatos chegarem.

- Dois só poderão vir à tarde, mas falarei com os que chegarem agora de manhã.

Por volta das 13:00hs, Gizelly chegou a academia. Entrou curiosa, via o espaço enorme, máquinas modernas e muitas pessoas bonitas. foi até a recepção.

- Boa tarde! Vim para falar com o Sr. Ronaldo! Disse à recepcionista.

De longe, viu Paulinho acenar.

- Ei mana! Que bom que veio!

Ricarddo Paulo era amigo de Gizelly há muitos anos. É instrutor de artes marciais e Moraram no mesmo prédio durante toda a adolescência. Sempre se falavam, mesmo quando Gizelly estava fora do Brasil.
O Amigo a direcionou para a sala da recepcionista, que ficava na antessala de Rafa. Ela sentou aguardando junto com o outro candidato à vaga.
A aparência de Gizelly não exibia ser atlética pela forma como se vestia. cabelos penteados, sempre de óculos e camisa simples. Era ótima com palavras escritas, mas se considerava tímida pessoalmente, e mostrou-se um tanto nervosa, vendo a dimensão e o luxo de onde possivelmente trabalharia. Olhou para seu concorrente, alto, forte e vestido com roupas esportivas, imaginou que não teria a menor chance.
Ronaldo primeiro chamou o rapaz. Levaram quarenta minutos e o secretário parecia satisfeito.

- Gizelly Bicalho Abreu, pode entrar! - Ela se levantou e entrou na sala.
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