The Teacher

Acho que deu ruim

O trabalho administrativo na academia no turno da noite não era tão intenso. Mas o horário estava cheio. Às oito e meia, Rafa viu no instagram um story que Gizelly acabava de postar. Um boomerang de árvores balançando e céu sem nenhum sinal de chuva. Não tinha localização. Depois de mais dez minutos, Gizelly respondeu o áudio e os videozinhos que ela havia mandado desde cedo.

"Oi amor, que bom que você gostou do café! Tô na faculdade. Cheguei atrasada, fiz tanta coisa na editora hoje..."

No meio do áudio Rafa conseguia ouvir alguém chamando. Era voz de mulher, depois de homem, depois várias vozes se aproximando.

"Tinha até esquecido que mandei mensagem pra você. Duas encarnações pra responder."

Gizelly ouviu, mas não respondeu. Falou com os colegas algo sobre a aula, e rapidinho pontuou:

"Foi muito corrido hoje. Como foi seu dia?"
"Corrido demais."

O espaço entre uma mensagem e outra a deixava enfezada. Rafa bufou umas vezes. Ela sabia que Gizelly estava ocupada com os amigos e no meio de várias pessoas falando. Mesmo assim, odiava o fato dela não manter uma conversa de dois minutos sem ter que esperar para falar. Logo Gizelly disse:

"Vou entrar em aula agora. Talvez eu chegue um pouco depois do horário, a gente tá vendo um conteúdo aqui, tá bom?"

"Depois do horário que horas? Meia noite? Uma, duas? Onze horas é cedo pra você, daqui a pouco duas da manhã também."

Ela mandou a mensagem por texto, mas em seguida apagou. Mas Gizelly já havia visto:

"Eu vi o desaforo, não precisava ter apagado."

Rafa se revirou na cadeira, começou a digitar, mas se arrependeu. Apagou e digitou de novo algumas vezes, depois disse ainda em texto:

"Vai lá pra sua aula."

"Não começa, Rafaella."

Foi a resposta de Gizelly, visualizada por Rafa apenas pela barra de notificações.

Depois daquela conversa, Rafa voltou para casa mais cedo. Prometeu que quando a poeira abaixasse, iria estudar com Ronaldo uma maneira onde os dois pudessem ter um pouco mais de tempo. Em casa ainda conseguiu brincar um pouco com as crianças. A mãe de Gizelly estava por lá como costumava ir quase todas as noites. Kelly e as colaboradoras já não estavam mais em casa, apenas a babá que logo também foi embora. Entre uma brincadeira e outra Rafa não viu mais nenhuma mensagem de Gizelly. Nenhum story, nada. No quarto, com a ajuda da sogra, ela colocava os bebês na cama. As vezes ela contava histórias, mas as delas não eram tão fantasiosas como as de Gizelly.

- ...Vocês não fazem ideia do dia em que a mamãe viajou para bem longe, num avião bem grandão assim óooo...

Ela em geral falava de alguma aventura. Mas sempre enfatizava as palavras, fazia muitos gestos, arregalava os olhos.

- ...Quando formos juntos, vamos fazer muitas fotos. Vocês querem ir?

Ela mesma respondeu dando beijinhos e carinhos neles, enquanto ouvia os risinhos. Depois de aconchegá-los e cobri-los cuidadosamente. Até a sogra se despedir.

-   Bom, já vou indo. Estão certinhos, vão dormir a noite toda, do tanto de energia que gastaram.

-   Obrigada pelo apoio! - Rafa respondeu. Estava cansada, o que era visível.

Depois vagamente comentou sobre o que pretendia fazer a respeito de umas férias e sobre o que tinha conversado com Ronaldo.

- Façam mesmo isso, será maravilhoso...