As ruínas da guerra

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"Querido Connor

Eu sinto muito não ter te ligado desde o acidente. Muita coisa aconteceu nesses sete dias. Eu e Mark estamos bem, mas você já sabe disso, porque a Kay deve te manter informado. Mas uma coisa que eu pedi para ela não contar é a seguinte:

Na noite do acidente eu fiquei completamente apavorado. Eu surtei, porque na minha cabeça o Mark não ia se recuperar, porque era tudo culpa minha. Eu passei a noite no hospital com os pais dele, Kayla e os meus pais, esperando por notícias. Veja bem... Eu conheço Mark há tanto tempo quanto eu conheço Kayla, o que significa praticamente os meus dezoito anos. Talvez ele só não me conheça mais do que Kayla. Quando ele acordou, às cinco da manhã daquela madrugada eu me senti completamente aliviado, porque ele estava bem. O fato é que... Nós somos o que somos, não é? Eu passei boa parte dos meus dias assustado, pensando em como seria quando eu começasse a admitir para as pessoas a minha sexualidade. Quando meus pais foram tão bons comigo eu percebi que, na verdade, eu só estava com medo porque ninguém ali no meio era como eu, mas que não seria por isso que as pessoas iam passar a me odiar. Quando Mark se assumiu, primeiro para mim, eu entrei em choque, porque achei que seríamos os únicos ali que, você sabe, seriam daquele jeito. E eu estava apavorado, porque achei que seria obrigado a namorar o meu amigo de infância, só pelo fato de que ele era o único gay que eu conhecia, além de mim. Então ele começou a namorar o Jackson, quando ele entrou na escola, mas eu estava sozinho, novamente. Um gay sozinho. E você chegou e "levou" a Kayla de mim mais rápido do que eu poderia reagir, mas agora está tudo bem. Eu tive uma longa conversa com Kayla naquela noite, porque eu estava assustado novamente. Meu... Eu... Eu fiquei pensando em tudo o que aconteceu em Army Beach, na maneira que tudo aconteceu, em como a mão dele estava na minha perna na volta para casa e em como nós estávamos felizes e... Eu pensei nisso a madrugada inteira. Eu estou namorando com Mark desde então. Por isso eu não te escrevi nada. Eu fiquei esperando ele sair do hospital na noite seguinte, umas dezoito horas depois do acidente. E nós estamos juntos desde então. Por isso eu não liguei, nem nada. Também porque eu sabia que a Kayla ia te manter informado. Nós estamos andando de ônibus agora, tanto porque o carro do pai dele está no conserto, quanto porque... bem... É meio óbvio. Nós não estamos traumatizados nem nada do tipo, mas não há nada como o transporte público de Perth, não é mesmo?

Esperamos que você esteja bem...

Love,Troye and Mark"

Connor socou o balcão do café.

-Con? Está tudo bem? - Amila olhou para ele. Eles andavam muito juntos nos últimos sete dias. Os dois assistiram todos os filmes estrangeiros do cinema do bairro dela, Connor dormira na casa dela nos últimos dias, eles se beijaram por um tempo alguns dias antes, até Connor lembrar que tinha uma namorada. Amila não sabia de Kayla. Kayla não sabia de Amila. Troye não sabia sobre Amila. Ninguém sabia de nada nos últimos sete dias.

-Está. É só... Vamos fazer aquelas fotografias? - Ela assentiu. Os dois deixaram o café com os dois copos e pegaram um táxi até as ruínas do complexo olímpico. Connor tinha tantas fotos boas de tantos lugares que precisou de um cartão de memória novo. Na última semana, quando não estavam no cinema ele e Amila estavam andando pela cidade, fotografando cada indício da guerra de Sarajevo, ou de que o tempo havia passado ali. Connor também fotografou algumas sinagogas e alguns pontos turísticos. O complexo era o último lugar que ele esperava fotografar, e depois dedicar os cinco dias seguintes para escolher as fotos.

Ele tirou umas duzentas fotos de cada detalhe do lugar, então sentou no chão e pensou. Amila o deixou sozinho, por um tempo. Ela conseguia notar quando Connor tinha algo em mente. Como quando ele acordava de manhã depois de algum sonho que tivera, suando frio e assustado. Ela não estava apaixonada, nem nada do tipo, mas eles estavam passando cada minuto juntos nos últimos sete dias, então Amila sabia.

Ele não estava com ciúmes de Troye, mas as cartas eram uma coisa deles, sabe? Era o jeito deles de se comunicar, mas agora havia se transformado em uma coisa entre ele, Troye e Mark e isso o deixava chateado. Talvez Troye não tenha entendido a situação, os motivos, o contexto. 

Naquela noite ele repassou as centenas de fotos, porque não conseguia dormir. Selecionou umas quatrocentas, então o que Margareth falara para ele ficou na cabeça.

"O garoto da correspondência.... Não espere ser tarde demais" - foi a primeira vez que Connor tinha cogitado ser... Gay. Então ele lembrou que ele tinha beijado Amila, para início de conversa. E ele tinha uma namorada... Uma namorada que ele não respondia há mais de cinco dias, mas tinha...

(...)

Troye e Mark estavam no quarto, quando Kayla apareceu. Mark tinha o cabelo castanho, em um castanho claro e era miúdo como Troye, mas seus olhos eram castanhos.

-Eu posso falar com você? - Kayla olhou para Troye.

-Eu vou indo. Amanhã nos falamos. Eu preciso ir para casa... Lavar roupa.

Troye riu e beijou o namorado.

-Você quer que eu te leve? A Kayla pode ir e nós conversamos quando voltarmos.

-Está tudo bem. Nem está tão tarde e são só algumas ruas.

-Está bem. Boa noite. - Mark sorriu.

-Boa noite, Troye. - Kayla sentou na cama quando o garoto fechou a porta atrás dele.

-Está tudo bem?

-Eu... Não... Eu não sei... - Ela deitou na cama e Troye também. Os dois ficaram de frente um para o outro, com o edredom sobre eles.

-Kay? - Ela fechou os olhos. - Eu amo você.

-Eu amo você, Troye. - Ela abriu os olhos e olhou para ele.

-O que está acontecendo?



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