Capítulo 18 ― Confronto (Parte 1)

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Savannah andava sem pressa na direção da casa na qual havia crescido, o lugar que um dia já tinha sido o seu maior refúgio. Era uma casa consideravelmente grande, bem dividida e mantida em perfeita ordem por sua mãe paranoica, que era seu completo oposto em termos de personalidade. Talvez fosse por esse motivo que a própria Savannah se sentia completamente confortável em seu próprio mundo, ao contrário da mãe extrovertida e animada. Todo o perfeccionismo, toda a organização, todo o zelo que lhe acompanharam durante a sua vida nunca lhe agradaram por completo, apesar de ela sempre tê-los aceitado de forma obediente, motivo pelo qual tentara ignorar ao máximo o fato de que a organização parecia não fazer parte de sua natureza, tampouco se encaixar em sua personalidade... Ela sempre fora a favor da liberdade, de fazer o que quisesse fazer dentro de seu espaço, de jogar suas coisas onde bem entendesse, de ser o que tinha que ser.

E Savannah nunca teve essa liberdade, até o momento em que sua carta de aceitação na Universidade de Chicago foi entregue e ela saiu de casa para morar em um dormitório menor do que o banheiro da suíte de seus pais, no qual vinha sendo muito mais feliz do que jamais fora em seu refúgio. Apesar disso, não se importava tanto em ir para casa. Passar um ou dois dias na companhia de seus pais, fazendo o que lhes agradava e deixando que pensassem que podiam lhe controlar não a afetava mais como antes, quando sabia que teria o resto da semana de liberdade em seu dormitório apertado.

Com esse pensamento fixo em sua mente, ela entrou no condomínio de casas onde seus pais moravam, acenou distraidamente para o porteiro e caminhou até seu destino, seu antigo porto seguro, mas também o lugar onde passara dezoito anos sendo fiscalizada e controlada por seus pais, o que, na cabeça deles, era apenas proteção. Eles eram protetores. Queriam que ela estivesse segura, não queriam que o mundo lhe julgasse. O mundo ia machucá-la, não aceitaria quem ela era... Ela seria tratada como uma aberração por ser diferente.

Seus pais lhe amavam, Savannah tinha plena convicção daquilo. Eles só queriam, de fato, o melhor para a filha e ela sabia que ambos, principalmente sua mãe, morreriam se aquilo fosse o necessário para protegê-la. Mas, no meio de todo o discurso protetor, ela também fora obrigada a ouvir, de novo e de novo, que era diferente e que ninguém ia aceitá-la do jeito que era.

Para uma criança que havia crescido com tantos problemas como ela, ouvindo aquele tipo de frase durante quase todos os dias de sua vida, Savannah passara a acreditar nas coisas que não haviam sido ditas. Sempre tinha sido uma garota esperta e sabia o que significado oculto nas palavras recorrentes.

Jamais teria amigos verdadeiros.

Jamais seria amada.

Jamais teria o que seus pais tinham: o coração acelerado, as mãos suadas, os pequenos choques pelo corpo, o frio na barriga.

Jamais teria filhos.

Quando seus pais partissem, ela ficaria sozinha.

E morreria sozinha.

Acreditara nisso praticamente durante vinte anos, desde que se entendia por gente. Naquele momento, pela primeira vez na vida, ela tinha uma esperança. Uma esperança concreta de que talvez não precisasse viver assim pelo resto da vida.

Uma esperança que tinha nome, sobrenome e cabelos cacheados escuros.

Com um sorriso no rosto, ela pegou o chaveiro no bolso da calça jeans e abriu a porta da frente quando alcançou sua casa. Mal teve tempo de olhar ao redor do lugar antes de os braços de sua mãe envolverem seu corpo e sua visão ser bloqueada pelos cabelos loiros da mulher.

Quando Savannah finalmente foi libertada do abraço sufocante, olhou para a mãe e franziu a testa no segundo em que percebeu que o rosto dela estava inchado e os olhos, vermelhos e cheios de lágrimas.

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