- Scarlett... - a voz de Aidan cantarolou friamente, ecoando pela escada do castelo, onde a fortaleza e a construção antiga acima dela se interligavam. Toda a modernidade havia ficado para trás, e a construção fria e vazia parecia exercer uma pressão no ar, o tornando mais denso. - Scarlett...
Ela não estava distante enquanto sentia cada pedaço de seu corpo tremer de medo. Suas mãos estavam cobrindo sua boca, enquanto contra a parede ela desejava se camuflar e nunca mais aparecer.
- Apareça, apareça, de onde quer que você esteja... - Aidan continuava cantarolando, caminhando passos lentos e rasteiros. Apenas uma parede os separavam.
As lágrimas começaram a rolar pelo rosto de Scarlett, e o pânico já era grande o suficiente para deixá-la sem ar. Ela pensou em Petrus e no quão rápido havia corrido, o deixando para trás com a deformidade e a escuridão em que seu pai havia se tornado. Pensou sem Maya, e se ela havia conseguido chegar até Lucas a tempo de tirá-los da fortaleza.
Mesmo querendo acreditar que os outros estavam bem, Scarlett sabia que sem a ajuda dela, eles não teriam qualquer chance. Se ela ao menos tivesse corrido para ajudar o filho, ou qualquer um dos irmãos em vez de proteger o corpo de Isaac... Talvez pelo menos um deles poderia ter sobrevivido para pedir ajuda.
Naquele noite, as paredes haviam se ruído.
- Por que você correu tanto? - Aidan estava ali, há segundos de cruzar os olhos com os dela, virando no corredor onde a encontraria. Scarlett estendeu as mãos o esperando, reprimiu a vontade de gritar de medo.
Seu pai estava ali, em sua versão disformica. Os olhos completamente negros, onde as divisões humanas não existiam mais. Scarlett olhou em seus olhos tentando buscar força para conseguir atacá-lo, mas suas mãos tremiam tão violentamente em hesitação, que ela sabia que precisava de mais. Precisava de muito mais que dúvida, muito mais que pensar que sua família havia sido massacrada por ele, logo ali abaixo. Ela queria acreditar que seu pai ainda estava ali, que as atitudes de Isaac não o fizeram sumir dentro das trevas que o aprisionaram por tanto tempo.
- Por favor, pai... - ela implorou. - Lute contra isso!
- Menina estúpida! - Aidan a agarrou pelo pescoço, sem permitir que ela tivesse tempo de reagir. Scarlett estava presa à parede, sentindo o ar lhe esvair enquanto seu pescoço era esmagado.
Aidan socou a cabeça dela contra a parede com a força de uma só mão, que a mantia sufocada. Scarlett sentiu a dor latente do corte que se abrira, e a cicatrização de seu corpo lutava contra os golpes repetidos que Aidan lhe dava. Ela sentiu que desmaiou três vezes antes que ele a arremessasse contra chão, do outro lado do cômodo vazio. Tentou se levantar, mas seus braços falharam. A dor em sua cabeça a deixou desnorteada, até que um chute forte em seu estômago a fez perder o ar e sentir alguma de suas costelas se partir. Ela gritou de dor, ainda tentando olhá-lo, buscando por sua humanidade, esperando que seu pai voltasse a si a qualquer minuto.
Não iria revidar. Sentiu um segundo chute em sua barriga, e tossiu sangue sabendo que estava gravemente machucada por dentro. Esperou pela cicatrização a cada golpe que recebeu, ainda no chão, sem saber se tinha forças para levantar e lutar contra ele.
Ela ainda queria viver? Não seria mais fácil pedir para que ele a matasse ali? Ele tinha esse poder?
Scarlett sentiu o corpo latejar, curando as fraturas sofridas. Aidan se afastou ofegante, mas ela não se moveu, sua visão estava turva.
- Você vai me matar papai? - ela murmurou, se esforçando para respirar. Não houve resposta. Ela começou a se levantar do chão vagarosamente e ele não reagiu. A fraqueza de seu corpo foi a deixando, e ela começou a caminhar para longe de Aidan.
Ao chegar ao corredor, Scarlett correu. Conseguiu alcançar a antiga cozinha, mas antes que pudesse descer para o celeiro, Aidan apareceu.
- Se vai me matar, porque está me dando tempo? - ele nada respondeu. - ME RESPONDE! - ela berrou.
Aidan estendeu a mão esquerda, lentamente uma bruma azulada começou a deixá-la. Scarlett estendeu as mãos para ele, preparando para defender-se sem saber se deveria. Talvez se ela conseguisse o imobilizar, poderia acordar Isaac e conseguir alguma forma de resolver aquela situação. Ele tinha que trazer seu pai de volta, assim como o havia tirado dela.
Scarlett sentiu o corpo esquentar, e um misto de raiva e coragem a fizeram atacá-lo. Aidan colidiu violentamente contra a parede, empurrado por um impulso poderoso de Scarlett. Ela se aproximou, tentando agarrar seu rosto, tentando conseguir uma brecha para compeli-lo, mas Aidan se esquivou mesmo desnorteado pelo impacto. Scarlett viu uma mancha de sangue na parede, na altura da cabeça dele. O olhou, preocupada e apavorada, a feição dele havia se tornado pior, mais irreconhecível como se isso fosse possível.
Scarlett começou a andar ainda o encarando, movendo-se em direção ao celeiro, descendo degrau por degrau o fitando, esperando por um movimento que não vinha. Ela correu na escuridão, tentando achar alguma brecha por onde sair, mas todo o castelo permanecia lacrado, o que a fez perceber que sua família ainda estava viva em algum lugar da casa, ou os feitiços teriam sido corrompidos por sua morte.
Nesse instante ela ouviu os passos de Aidan ecoando, descendo a escada pacientemente indo até ela. Entrou em uma celas que havia ali, tentando se esconder, tentando adiar. Quando seus olhos se cruzaram com os dele, ela sabia que sofreria, sabia que não havia qualquer sinal de seu amado pai naquele corpo possuído por escuridão.
Ela se encolheu no canto da cela, esperando a dor que a atingiria.
Scarlet não estava enganada.
Ela sentiu a vitalidade bem próxima de deixá-la, quando uma dor excruciante a pressionou. Ela não era mais nada além de ossos esmagados e carne dilacerada, lutando para cicatrizar, para voltar a ser alguém.
E seu pai, não iria ajudá-la. Aidan não estava lá.
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A Linhagem Winlook 3
FantasyApós revelar o segredo de Isaac, Alexis pode ter cometido um erro fatal para ela e todos os que conhece. Os segredos, anos, paredes e proteções que os separavam do Clã Norueguês estão rompidos, e a única opção que os restam é se unir e lutar. Mas...