As vozes do grupo foram se dissipando. O vento pareceu soprar rapidamente, as folhagens se mexeram no chão se espalhando. Alexis sentiu algo se aproximar dela, abrindo caminho em sua direção, mas aquilo não a assustou, a atraiu. Tentou permanecer imóvel, ainda fixando os olhos na floresta, mas já não sentia qualquer sinal da presença dos outros ao seu redor. Estava sozinha.
Uma forte luz azul surgiu atrás das árvores que estavam há alguns metros dela, a chamando. Alexis tentou resistir, mas quando se deu por si, já estava se aproximando da clareira onde uma partícula de luz azul brilhava de forma ofuscante.
Alexis cobriu os olhos, protegendo-se da luz azul que pulsava a partir daquela partícula flutuante, uma pequena esfera, sem qualquer dúvida viva. Depois de alguns segundos se acostumando com a claridade, Alexis pôde olhá-la, e sabia que estava sendo olhada de volta, exclusivamente, até que atrás de si ouviu passos e ao virar-se, ali estava uma menina. Loira, de pele alva e altura mediana, olhos azuis arregalados e inchados. Alexis a fitou sem medo, mas os olhos da menina estavam olhando através dela, presos a luz.
A menina a atravessou, lhe causando um susto violento. Alexis virou-se a acompanhando, e a viu ajoelhada ao chão. Andou vagarosamente até que pudesse estar de frente a ela para observá-la com mais atenção. Percebeu que algo lhe acontecera, a menina estava tão esgotada que cada centímetro de seu corpo demonstrava isso. Alexis notou que havia terra e sangue nas vestes antigas da garota, assim como sujeira em seus cabelos loiros. Os olhos dela pulsavam, inchados, vermelhos, arrasados.
- Joane, aqui está você... - disse a luz azul pulsante no ar, com uma voz tão fria e arrastada que Alexis teve a sensação de deixar o próprio corpo ao ouví-la. A menina no chão encarou a luz, trêmula. - Eu disse que deveria confiar em mim, disse que poderia lhe poupar de todo o mal que lhe alcançaria, mas você esperou por ele Joane, não confiou no espírito azul.
- Eu não quero ser como elas - Joane murmurou com as lágrimas escorrendo por seu rosto avermelhado, parecendo desnorteada, imersa em memórias aterrorizantes. - Não tenho interesse em me tornar bruxa...
- Eu lhe disse que seria nada como elas! - a luz a interrompeu. - Eu lhe disse que seria uma criatura nobre, forte e poderosa, e não um ser vulgar e deficiente de ambição.
- De quê isso adianta agora? - seu olhar voltou-se para a luz com firmeza, como se encarasse exatamente seus olhos. Havia raiva em sua voz. - Você sabe o que elas fizeram?
- Você deixou isso acontecer Joane, eu lhe dei todos os aviso. Lhe esperei no bosque por todo esse tempo, lhe pedindo nada mais que sua fiel confiança. - a luz fez uma pausa. - Você está pronta agora? Você agora pode reconhecer que sou seu único amigo?
- Elas comeram minha família, e não satisfeitas, os enterraram vivos! Elas os comeram! - Joane berrou. - Eu não tenho mais nada! Nem a pele em que habito parece me pertencer. Que opção eu tenho a não ser aceitá-lo?
- Joane, eu quero que aceite essa vida por você! O que tenho a lhe dar foi moldado a sua imagem. Não lhe faltará prazeres, força ou poder. Você será a maior criatura já vista pelas terras, a mais forte que já existiu e a única de sua espécie. Eu posso lhe dar mais Joane, eu posso lhe dar vingança, posso acorrentar as vidas vulgares de todas elas onde você quiser.
- E o preço a se pagar por isso? - houve silêncio entre os dois. - Você está sempre pedindo confiança, querendo que eu me entregue a você, dizendo ser meu amigo, mas eu quero saber o preço.
- A minha fiel amizade é o que lhe ofereci em primeiro lugar Joane, e é só isso que quero para nós dois. Eu lhe dei todos os avisos e você resistiu... - a luz pareceu se expandir um pouco. - Não acha que já lhe dei provas suficientes da minha fidelidade a você? Hoje, você sabe que sou sua família, assim como eu soube desde a primeira vez em que lhe vi, que você seria a minha. Eu sou tudo que tem e você é tudo o que tenho.
- Eu não quero isso - sussurrou Joane, voltando a chorar e fechar os olhos.
- Você não é como elas Joane, elas são criaturas condenadas, você é pura! Você e eu juntos, seremos grandes e tudo você terá.
- Tudo me falta! - ela gritou. - Eu não tenho mais nada!
- Você terá tudo Joane, e principalmente você sempre terá a mim! Eu lhe prometo vingança por sua família, e por qualquer coisa que venha lhe ferir daqui por diante. Já é hora Joane! Venha, se aproxime! Me permita mudar a sua vida e lhe dar tudo o que o mundo tem para lhe oferecer.
Joane levantou-se e estendeu a mão em direção a esfera de luz, que se propagou e a consumiu por inteiro. E assim, eles se tornaram um, Alexis tinha certeza, mesmo que a forte luz não a permitisse ver.
A luz se tornou fraca até que desapareceu. Alexis abriu os olhos e estava em outro lugar da floresta. Próximo a ela havia um rio, e na margem ela podia ver Joane ajoelhada.
- O que você quer que eu faça? - perguntou Joane observando seu reflexo no rio negro, iluminado pela luz da grande lua que ocupava o céu naquela noite. Seus olhos estavam brilhantes, azuis luminosos, brilhando como o espírito brilhava sozinho, mas agora dentro dela.
- Você sente tudo o que lhe prometi Joane? Você sente a força que temos? - a voz soava ainda fria, vindo de seu interior de forma tão segregada de seu corpo que era claro que eles só o compartilhavam, ainda sendo dois seres distintos. Joane assentiu para sua própria imagem. - Como prova de nossa amizade Joane, você está próxima de sua vingança, poderá dar a elas o destino que acha que merecem.
Joane caminhou pela escura floresta, com passos firmes, guiada pelo espírito e por sua vontade de tirar daquelas criaturas, tudo o que lhe tiraram na noite em que mataram sua família.
Em uma caverna estreita e coberta por folhagens, Joane entrou e as encontrou, nuas e junto ao chão, se banhando com um líquido viscoso e mal cheiroso, rindo histericamente. Aquele foi seu último momento de liberdade, pois Joane as condenou à uma eterna escravidão, que as prenderiam àquela terra para sempre, com uma fome que jamais passaria. Sugiram as bruxas da noite.
Alexis se sentiu ser empurrada para a realidade, com força. O barulho dos outros estava presente agora ao seu redor, assim como o calor do fogo, ela não havia sequer se mexido. Olhou para Luc ao seu lado e percebeu que ele a encarava enquanto segurava sua mão com força.
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A Linhagem Winlook 3
FantasyApós revelar o segredo de Isaac, Alexis pode ter cometido um erro fatal para ela e todos os que conhece. Os segredos, anos, paredes e proteções que os separavam do Clã Norueguês estão rompidos, e a única opção que os restam é se unir e lutar. Mas...