A primavera trouxe a primeira execução em praça pública. O Governador ordenou a decapitação de uma escrava que trabalhava na casa de um puritano de alto poder, a acusando de bruxaria. Ele estava errado! Thomas e Joshua estavam lá, viram a lâmina descer com força no pescoço da moça, e parti-lo ao meio. Ainda podiam ouvir o som de sua cabeça ao cair no chão.
O medo os trouxe união. Thomas sentiu a confiança que tinha em Joshua voltar aos eixos, enxergava mudança e garantia que ela continuasse. Eles voltaram a se ver todos os dias. Caçavam juntos, traziam lenha para casa. Aos sábados estavam no conselho, aos domingos iam à missa. E em pouco tempo eram meninos novamente, meninos livres e corajosos. Se criavam, se amavam e se erguiam.
Tudo estava bem, até que Thomas começou a ter fortes dores de cabeça. Perdeu-se na floresta um dia em que brincava com Joshua e Danna. Encontrou-se perdido a noite, próximo a casa de Joshua e Danna, sem qualquer ideia de como havia parado lá. Tinha sonhos tão realistas que acordava passando mal. As vezes sonhava que Danna possuía hematomas pelo corpo, ou mordidas. Outras vezes sonhava que estava decidido a matar Joshua, a caminho da casa dele na madrugada.
Lianna pediu a Thomas que ficasse em sua casa por um tempo, pois os filhos de Jonas estavam assustados com as crises dele. Ela se afastou do conselho momentaneamente, ele também. Os dois ficaram isolados, e isso pareceu resultar em uma melhora.
Não havia respostas para os sonhos ou as dores. Edigar, o curandeiro do Conselho, disse acreditar que se tratava de uma crise de mutação de poder. Thomas estava se tornando mais poderoso e não possuía treino suficiente para estabilizar sua força. Descobriram algumas semanas depois, que Thomas era um mago, como seu pai havia sido. Jonas e Lianna começaram a treiná-lo para que ele se tornasse mais forte. Arthur começou a visitá-lo todos os dias nas madrugadas, e vez ou outra trazia Danna e Joshua consigo.
Ao voltar a Floresta Baixa, Thomas e Arthur mudaram-se da casa de Jonas. Moravam juntos em uma pequena cabana agora. Praticavam todos os dias, tudo o que podiam trazer de lição do conselho. Joshua e Danna agora vinham a sua casa com frequência. Os quatro praticavam juntos, ou preparavam um belo jantar regado a vinho. Pela primeira vez em muito tempo eles se sentiam normais, apenas quatro jovens, que agora eram sem qualquer dúvida, uma família.
No dia mais quente do verão, Danna e Thomas entraram no lago azul logo pela manhã. Joshua chegou no almoço com uma cesta de maçãs. Antes que o final da tarde caísse, eles caminharam pela orla da floresta de Alcônva e entraram para brincar, rindo e se divertindo por estarem juntos e sem qualquer pesar. Naquela tarde eles eram apenas melhores amigos, apenas crianças. Naquela tarde eles não pensaram em caça as bruxas, em mortes ou perseguições.
Naquela tarde Joshua desapareceu na floresta e nunca mais voltou.
***
- Eu não irei fazer, não importa o que diga! - Thomas continuou andando de um lado para o outro na pequena sala de Lianna.
- Apenas me escute, está bem? - ela pediu se aproximando, seu tom de voz estava mais baixo pois Mercy dormia não muito longe dali. Thomas a olhou e parou de se mover.
- Lill, não!
- Você precisa me escutar! - ela segurou o rosto dele entre suas mãos. - Ela irá fazer dezoito anos, é órfã, perdeu ele... Se sonharem que ela vive com você e o Arthur, sem qualquer vínculo... Você sabe que seu irmão irá se casar, irá se mudar. Não podem ficar na mesma casa sem ter um vínculo.
- Nós crescemos juntos Lianna! As pessoas não tem o direito de me dizer o que fazer sobre isso. Eu não vou abandoná-la, de forma alguma, mas isso que está me pedindo...- ele levou as mãos a cabeça. - Não posso!
- O Conselho me pediu isso! Os mais velhos votaram, os líderes....
- Não existem mais líderes Lianna, você está na frente agora! Basta você dizer que não e...
- Thomas, não seja uma criança! - ela disse seriamente. - Você é mentor dos mais novos, as pessoas depositam uma grande confiança e uma responsabilidade em você. Você é o primeiro contato de toda uma geração bruxa, e desempenha um papel importante. Não pode se colocar em perigo, colocá-la em perigo, colocar o conselho em perigo, por teimosia.
- Não é teimosia Lianna! - ele andou até ela e segurou seu rosto, o aproximando do seu. Suas testas se tocaram. - Vocês duas são tudo para mim! Eu não quero perder uma para proteger a outra!
- Você sabe que eu não posso Thomas... - Lianna tocou as mãos dele e fechou os olhos. Thomas beijou sua boca, e ela não hesitou. - Eu não posso!
- Eu te amo! - disse ele, mas não houve a resposta que queria.
- Então faça isso por nós duas!
- Eu não posso me casar com ela! Ela é minha irmã!
- Se a quer viva, se a ama, você irá protegê-la... Você sabe que é a única forma.
E Lianna estava certa, logo após o aniversário de vinte e dois anos de Thomas, quando Danna já havia feito dezoito, houve uma cerimônia na Floresta Baixa. Arthur estava lá, assim como Mercy e Lianna. Jonas com a esposa e a família. Grace, Thomasin, Leslie e Dina também.
A celebração da união de Thomas e Danna foi tão triste que não se estendeu nem por um minuto a mais que o necessário para a troca de votos. As pessoas da cidade os cumprimentaram pelo caminho de volta a casa, que agora era só deles. Arthur havia se mudado para a casa da família da esposa, eles haviam se casado dois meses antes. O vazio na casa pareceu se acentuar naquele dia. Sem as coisas de Arthur e sua presença, Thomas e Danna não tiveram coragem de se encarar naquele dia. Ele dormiu no chão da sala e ela chorou a noite toda.Thomas sabia que as lágrimas ainda eram por Joshua.
Noites frias e sombrias os fizeram companhia por um tempo, até que Danna tirou uma trouxa de coisas que pertenceram a Joshua de debaixo de sua cama e as levou para o quintal para serem queimadas.
- O que você está fazendo? - perguntou Thomas da janela, observando Danna desamarrar a trouxa e olhar pela última vez para o que estava ali.
- Eu preciso queimar isso! Faz dois anos, não posso continuar esperando por ele... - ela estendeu a mão e conjurou fogo diretamente nas coisas de Joshua. Danna o olhou para Thomas. - Eu sei que odeia isso Thomas! Vejo claramente sempre que olha para a Lianna, ou quando chega em casa do trabalho, mas se estamos nisso...
- Danna, - Thomas saiu do interior da casa e a encontrou no quintal. - eu fiz isso por nós dois! Se essa era a forma de te manter em segurança... - ele suspirou. -Eu só quero que tenha uma vida justa! Só quero que esteja segura...
- Mas isso não é justo com você!
- Eu amo a Lianna, - ele admitiu, olhando Danna nos olhos. - mas você é tudo o que eu tenho. Lianna nunca será! E o que eu sinto por você e pelo Arthur - Thomas tocou os ombros dela. - é muito maior do que qualquer outra coisa. - os olhos de Danna acumulavam lágrimas naquele momento. - Eu quero ser seu ombro, seu escudo e seu melhor amigo, como sempre fui. Não quero que pense que está em dívida comigo, ou que nossas vidas estão condenadas de alguma forma. Não quero que continue chorando todas as noites e me evitando todas as vezes que volto para casa. Nunca houve um momento em minha vida que eu não a amasse Danna, e isso me torna capaz de qualquer coisa por você.
- Obrigada! - ela o abraçou. Thomas a envolveu com força, sentindo um nós em sua garganta por finalmente poder tocá-la com carinho e sentir sua luz novamente. Sentir que Danna, depois de tanto tempo, compartilhava uma emoção verdadeira com ele, era quase equivalente a estar curado de uma doença que a muito tempo o mutilava. - Obrigada por nunca ter me abandonado Thomas!
- Você é minha família! Eu te amo.
- Eu também te amo! - ela respondeu ainda agarrada a ele, com o corpo estremecendo e soluços em meio ao choro. Thomas sentiu a angústia que o deixava sair em lágrimas por seus olhos.
Thomas e Danna completaram quatro anos de casados antes que o massacre acontecesse ao conselho.
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A Linhagem Winlook 3
FantasíaApós revelar o segredo de Isaac, Alexis pode ter cometido um erro fatal para ela e todos os que conhece. Os segredos, anos, paredes e proteções que os separavam do Clã Norueguês estão rompidos, e a única opção que os restam é se unir e lutar. Mas...