Filhos do Império - Chapeuzinho Vermelho (Livro Um)

Capítulo Trinta e Nova - Reunião de Família

Charlotte retirou a capa mais pesada e permaneceu somente com a sua vermelha aconchegante e familiar. Logo se dirigiu e sentou na poltrona isolada, afastada do fogo da lareira e que lhe dava uma ampla visão da sala e de quem estava presente, precisava manter foco nos detalhes para não se perder em seu ódio e deixar seus poderes descontrolados, essa era a última coisa que precisava.

-Acho melhor todos sentarem. –Avisou e Christopher sentou primeiro, em um banco acolchoado que Kyle possuía em sua sala. Suzana se demorou mais, contudo sentou no outro extremo.

-Quem diria que após tantos anos passaríamos por isso, não é mesmo? –Char falou, os olhos verdes se voltando para a mãe. –Afinal os mortos não podem voltar para uma reunião de família, não é mamãe?

-Char, querida... –A forma que Suzana lhe chamou a fez sentir agulhas alfinetando sua pele.

-Acho melhor pularmos a parte de doçura, de manipulações e falsidade. –Ela pediu e o fogo crepitou mais alto na lareira, notou Christopher. –Vamos ao que realmente importa, aos fatos, revelações e tudo o que me foi escondido e tomado por tantos anos.

-Eu gostaria de poder conversar com você a sós. –Charlotte notou a autoridade que Suzana empregou na frase.

A brasa de raiva que ela tanto lutara para controlar reacendeu em seu peito, a fazendo sentir o fogo da lareira ampliar e a temperatura da sala aumentar. Charlotte respirou fundo e o fogo amenizou novamente, não podia se perder, sabia que seria uma tarefa difícil, no entanto precisava se controlar ao máximo, se agarrando aos bons sentimentos que tinha em relação a mulher a sua frente e pessoa que mais amou nos últimos anos de sua vida.

-Meu pai tem direito de ouvir tudo o que você tem a me dizer sobre esses 5 anos em que ele esteve morto. –Ela falou com a voz cheia de raiva assim como a expressão, mas calma o suficiente para notar as mudanças de clima a seu redor e controlar tudo. –E creio que ele também, se não sabe, tem direito de ouvir o que você me escondeu por toda a vida.

-Charlotte, eu sei que fiz muita coisa que te desagradou, mas foi para o seu...

-Não faz isso. –Ela disse e a raiva transbordou por seus olhos. –Não ouse me dizer isso. –Respirou fundo, baixando a cabeça e passando as mãos no rosto, tentando se acalmar. –Você... Você não pode e nem deve dizer isso. –Havia uma risada irritada em seu tom de voz e Christopher viu as labaredas dançarem, sentindo a corrente de ar rodar pela sala, notando que Suzana havia percebido o mesmo, pois os olhos negros se arregalaram enquanto encarava a filha.

-Eu achei que fosse ser o melhor pra você, eu te amo e pensei...

-Que mentir sobre meu pai fosse me deixar melhor? Que a morte dele fosse ser facilmente esquecida após alguns dias de choro? –Ela se exaltou e o vento derrubou uma jarra de água que estava sobre a mesa. –Não deixou! –Ela tentou expressar ironia, mas seus ombros tremiam devido à raiva. –Somente me fez ficar triste! Chorar e ter medo da própria sombra a cada maldita Lua Cheia!

-Eu sei e sinto... –Charlotte ergueu a cabeça encarando a mãe e a fazendo se calar.

-VOCÊ NÃO SENTE MUITO, NÃO MESMO! –Se exaltou e o ar pareceu adensar. –Eu tinha medo de dormir. –Ela falou mais baixo, tentando se conter e baixou a cabeça novamente. –Eu achava que se dormisse iria morrer como eles. –Ela praticamente sussurrou. –Eu via Katherine nos meus pesadelos e sonhava com meu pai sendo devorado por completo, já que nunca houve corpo. –Estremeceu violentamente. –Eu mal conseguia respirar ao ouvir um uivo, mesmo que distante.

-Mas isso...

-Você me fez acreditar em tanta mentira que me tornou fraca. –Char falou, a dor e raiva estavam em sua voz. –Eu sem querer acabava os chamando. Você sabia disso? –Ela encarou Suzana. –Sabia que eu chamava os Lobos? Sabia que logo no início, mesmo antes de Kyle, eu os chamava sem querer? E que foi assim que ele me encontrou e me viu? –Suspirou. –Que foi por conta disso que ele me conheceu e eu virei um Objeto de Fixação pra ele? –A mulher nem fez menção de falar e Charlotte a encarou. –A pior parte é que você sabia. –Riu sem humor. –Mas o que eu me pergunto é, como você sabia? Como sabia onde fica o Vale Vermelho? Como sabia que poderia manipular um Lobo após a transformação? Como sabe sobre tudo isso?