22. Manada de Cães (Parte II)

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A angústia ardia dentro de si. Tocar o próprio rosto tornou-se autoflagelo. Ficar sentada ouvindo o professor era muito pior, mas talvez nem tanto quanto flagrar algum colega lhe encarando com os olhos bem abertos. Com a visão periférica, Anna captou o professor Felix guardar o giz para anunciar:

— A aula terminou, podem ir para casa.

Finalmente.

Com o material já guardado na bolsa, Anna levantou-se e disparou para fora da sala. Não queria ser parada por ninguém, queria apenas sair dali o quanto antes. Desceu as escadas e caminhou em ritmo acelerado pelos corredores, até uma mão segurar seu ombro direito, puxando-a para trás. Apavorada pela abordagem repentina, desferiu uma cotovelada no rosto do indivíduo que ousou abordá-la.

Mas foi Ronan quem urrou em dor ao cair no chão, desnorteado.

— Caralho Anna! Pra que isso? — esbravejou com um quê de choro em sua voz.

— De-desculpa Ronan. Perdão, perdão, perdão. Foi sem querer, foi no impulso, eu juro! — De todos, ele era o último que pretendia atingir com tanta violência.

Diversos estudantes de outras turmas circundaram os dois, ignorando-os, seguindo com suas vidas e problemas. Anna estendeu sua mão e ajudou o colega a se levantar.

Recuperado da queda, Ronan disse:

— Tudo bem, mas amanhã serei eu a acompanhar pelo professor morto-vivo até a coordenação.

Anna deu uma breve risada.

— Você veio me perguntar o que aconteceu não é? Eu já disse, eu fui roubada. — já adiantou enquanto os dois caminhavam lado a lado até a saída.

— Na verdade, eu queria falar sobre as suas "novas amigas" — disse num tom apologético.

— O que têm elas?

Ele parou de caminhar. Anna o encarou preocupado.

— Elas... riram da sua situação... enquanto você estava fora da sala, lá na coordenação.

Anna olhou para seus pés, para as simples botas marrons já desbotadas.

— Obrigado por me contar... Ronan — sua voz saiu um tanto trêmula.

— Foi seu pai... não foi?

O melancólico olhar de Anna se contraiu em raiva.

— Quê? De onde você tirou isso?

O calor que sentiu no rosto só indicava que havia enrubescido.

— Desde que eu vi você e o seu pai na reunião dos calouros... eu senti um clima estranho entre vocês.

— E assim, do nada, você acha que ele abusa de mim? — Ela se aproximou e apontou o dedo em sua direção, fazendo-o cambalear contra uma das árvores ali perto. — Escute bem Ronan. Não se meta na minha vida. Eu gosto de você porque sempre fica na sua e não faz mal a ninguém, mas não venha se meter onde não foi chamado. E nunca mais ouse falar alguma coisa sobre ele na minha frente.

Quando Anna terminou de repreendê-lo, alguns estudantes pararam para observá-los.

— Vai com calma patroa, vai espantar teu namorado assim — disse um veterano alto, atlético com um cabelo loiro jogado para trás.

As bochechas de Anna ficaram tão avermelhadas quanto às do amigo. Envergonhada, encarou o veterano zombeteiro, mas não estava a fim de repreendê-lo. Virou-se então para Ronan, para dizer:

— Espero que tenha entendido. — E deu as costas sem se despedir.

RonanOnde histórias criam vida. Descubra agora